Conferência do Clima da ONU (COP30) no Brasil está à beira de um vexame global

15 setembro 2025 às 09h12

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Com apenas dois meses separando o mundo da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), o cenário em Belém do Pará é de apreensão internacional. A promessa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de projetar o Brasil como líder ambiental global esbarra em uma realidade em que existem obras de infraestrutura atrasadas, um colapso iminente na capacidade hoteleira com preços extorsivos, e um esvaziamento de delegações estrangeiras.
Das 196 delegações esperadas, meras 68 confirmaram presença até meados deste mês, moldando o retrato de desconfiança logística e falha de planejamento que ameaça transformar a conferência mais importante do mundo em 2025 em um monumental fiasco diplomático.
Paralelamente, a máquina governamental brasileira corre contra o tempo, tentando desesperadamente concluir um legado de 17 obras de mobilidade e saneamento, muitas das quais com previsão de entrega no limite do prazo, entre este mês de setembro e outubro. Ademais, projetos de longo prazo, como a ampliação da Rua da Marinha, sequer estarão prontos para o evento, com conclusão prevista apenas para 2026.
Embora autoridades classifiquem tais obras como “não essenciais”, elas representam a infraestrutura permanente prometida à população local, levantando dúvidas sobre o verdadeiro legado da COP para os cidadãos de Belém.
Consequentemente, o despreparo logístico já produziu seus primeiros efeitos diplomáticos diretos. O presidente da Áustria, Alexander Van der Bellen, cancelou publicamente sua participação, citando os “custos particularmente altos” que excediam sua dotação orçamentária. Este não é um episódio isolado e representa a ponta de um iceberg de insatisfação que permeia as chancelarias europeias e de nações em desenvolvimento.
O próprio secretário-executivo da Convenção do Clima da ONU (UNFCCC), Simon Stiell, emitiu uma notificação oficial no dia 9 de setembro, solicitando que todas as agências da ONU e organizações parceiras “revisem o tamanho de suas delegações e reduzam o número sempre que possível”.
Diante desse cenário, a principal e mais polêmica queixa diz respeito à crise de hospedagem. A rede hoteleira de Belém consegue acomodar confortavelmente menos da metade do público esperado de 50 mil pessoas. Soluções improvisadas, como a utilização de motéis, aluguel por aplicativos e contêineres adaptados, ainda deixam um déficit de aproximadamente 14 mil leitos.
Como resultado direto, os preços das diárias explodiram, com valores chegando a ser dez vezes superiores à média habitual. Na plataforma oficial do evento, as tarifas mais acessíveis giram em torno de US$ 350 (cerca de R$ 2.000), um valor proibitivo para a maioria das delegações.
Além disso, a tensão financeira escalou para um impasse diplomático. A ONU, cujo subsídio padrão para diárias é de US$ 140 (cerca de R$ 756), pressionou o governo brasileiro a cobrir a diferença de custo para as delegações de países mais pobres. No entanto, o Brasil recusou formalmente a proposta, argumentando que a responsabilidade pelo subsídio é da própria organização internacional. Esta decisão, embora talvez tecnicamente correta, amplifica o risco de exclusão de vozes do sul global dos debates, esvaziando o princípio multilateral que é a própria razão de ser da conferência.
Igualmente preocupante é o conteúdo de telegramas diplomáticos obtidos via Lei de Acesso à Informação, que revelam apreensão por parte de embaixadas de nações-chave como Alemanha, Reino Unido, Dinamarca, Noruega e até a China. Os documentos enviados em março mostravam um temor de um colapso operacional que poderia invalidar não apenas a participação de delegações oficiais, mas também a de organizações da sociedade civil, fundamentais para o tecido dos debates climáticos.
O embaixador André Corrêa do Lago, presidente da COP30, reconheceu abertamente a pressão. “Há uma sensação de revolta, sobretudo por parte dos países em desenvolvimento, que estão dizendo que não poderão vir à COP por causa dos preços extorsivos”, admitiu ele. André ainda salientou que o desafio logístico de Belém é incomparável ao de sedes recentes como Dubai e Baku, cidades com infraestrutura robusta e modernizada. A escolha de Belém, às portas da Amazônia, foi um cálculo de alto impacto midiático, mas que demandava uma preparação igualmente grandiosa e eficiente – algo que, claramente, não se materializou.
Em síntese, o Brasil se encontra em uma encruzilhada crítica. A COP30 deveria ser o palco máximo para a reafirmação de sua liderança ambiental e a demonstração de que o desenvolvimento e a preservação podem coexistir. Contudo, o caminho até novembro está pavimentado com alertas vermelhos.