O peso da história no voto de Cármen Lúcia

12 setembro 2025 às 09h53

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O julgamento da trama golpista pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal não é apenas um processo judicial. Trata-se de um divisor de águas na consolidação democrática do Brasil.
A cada voto, a Corte escreve não apenas páginas de um acórdão, mas também capítulos da história nacional. Nesse cenário, o voto da ministra Cármen Lúcia merece ser sublinhado. Sua intervenção foi mais do que técnica. Foi ética, histórica e sensível à dimensão institucional que o processo carrega.
Ao afirmar que “pulsa o Brasil que me dói” e ao qualificar o julgamento como um encontro entre passado, presente e futuro, a ministra não apenas julgou réus, mas traduziu o que está em jogo: a defesa da Constituição de 1988, conquistada a duras penas após décadas de autoritarismo.
Cármen Lúcia demonstrou que a Justiça não pode se curvar a conveniências políticas nem a pressões externas. Seu voto foi firme, coerente e comprometido com os valores democráticos. Ela lembrou que o Brasil já perdeu tempo demais em ciclos de rupturas institucionais e que a Justiça deve ter a coragem de interromper essas tentativas de retrocesso.
Na contramão desse compromisso, chamou atenção o voto do ministro Luiz Fux, que optou por absolver quase todos os réus, inclusive Jair Bolsonaro, sob a justificativa de falta de provas. Mais grave que uma divergência jurídica é a impressão de falta de rigor ético em seu posicionamento.
Ao minimizar os indícios robustos de um complô para subverter a democracia, Fux se distancia não apenas da maioria de seus pares, mas também da confiança que a sociedade deposita no Supremo.
A Justiça não pode ser condescendente com golpistas, e esse é um limite que não admite relativizações. O voto de Cármen Lúcia será lembrado como exemplo de coragem cívica. O de Luiz Fux, como registro de hesitação injustificável.
O Brasil precisa de ministros que compreendam que julgar casos dessa magnitude não é apenas aplicar a letra da lei, mas proteger a própria existência da lei e da ordem democrática.
Se a democracia brasileira está de pé, é porque ainda há magistrados que, como Cármen Lúcia, sabem que a história cobra posicionamento. E, no fim das contas, a história costuma ser implacável com quem escolhe a omissão.