Divaldo Rezende apresenta prioridades do Tocantins para preservação ambiental: “O foco deve estar na solução”
09 novembro 2025 às 08h00

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Especialista em Mudanças Climáticas, Carbono, Energias Renováveis e Sustentabilidade, Divaldo Rezende assumiu pela segunda vez a Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Semarh) em 1º de outubro deste ano, após Laurez Moreira assumir o governo do Estado interinamente. Ele já havia ocupado o cargo entre 2011 e 2013, quando o órgão ainda se chamava Secretaria do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semades).
Com trajetória consolidada no campo ambiental — que inclui formação em Agronomia pela Universidade Federal de Lavras (MG), mestrado em Política Ambiental pelo Imperial College de Londres e doutorado em Biologia pela Universidade de Aveiro (Portugal) —, Divaldo defende a continuidade de políticas de Estado no Tocantins. Em entrevista ao Jornal Opção Tocantins, ele falou sobre o processo de transição após o afastamento do ex-governador Wanderlei Barbosa, as prioridades da nova gestão, o andamento do REDD + Jurisdicional e a adesão ao programa federal Floresta+, que prevê pagamento por serviços ambientais a pequenos produtores.
O senhor retorna à Semarh após um momento de transição no governo, com o afastamento do ex-governador Wanderlei Barbosa. Como foi esse processo de retomada, de reaver ou continuar os serviços da Secretaria?
Bem, na verdade, o meio ambiente já vinha com uma estratégia política bastante adequada, e temos dado sequência a essa estratégia. Já há muitos anos o Tocantins tem políticas de Estado, não políticas de governo. Isso é importante, porque tudo aquilo que faz sentido para o Estado tem continuidade.
E quais são as prioridades imediatas da Semarh após essa troca de governo?
O governador elencou cinco estratégias muito importantes.
A primeira é zerar o licenciamento ambiental — foi montada uma força de trabalho para isso.
A segunda é dar sequência à análise do CAR, porque nós temos mais de 90 mil cadastros em andamento.
A terceira é revisar o REDD + Jurisdicional e abrir diálogo com todos os setores. Não é uma mudança brusca, mas uma mudança em termos de abordagem, de diálogo, envolvendo outras organizações nesse processo.
A quarta ação prioritária é o pagamento por serviços ambientais, um programa do Governo Federal que o governador buscou para que a gente possa implementar no Tocantins. É um investimento significativo, que deve beneficiar mais de mil pequenos proprietários, com propriedades de até 320 hectares.
E a quinta prioridade é aumentar os recursos do Fundo Estadual de Recursos Hídricos. Hoje, o fundo é alimentado por medidas compensatórias e royalties das usinas, e nós vamos buscar outras fontes de financiamento para ampliar esses recursos.
Dessas cinco prioridades, quais já foram implementadas?
Das cinco, a única que ainda está em andamento é a questão do fundo. Todas as outras já foram transformadas em ações concretas. A parte do fundo é mais complexa, porque envolve articulações políticas e estratégicas.
Como o senhor pretende ampliar o Fundo de Recursos Hídricos? Isso vai envolver articulações políticas?
Sim, nós estamos traçando uma estratégia em várias frentes. Vamos buscar parceiros nacionais e internacionais e, dentro do Estado, ver o que pode ser feito também. É um processo mais demorado, porque exige articulação política e planejamento estratégico.
O Tocantins vem implementando uma agenda ambiental bem avançada. O senhor acredita que esse ritmo está sendo mantido?
Está, sim. A Secretaria tem um quadro técnico muito bom, o que facilita a continuidade das ações. Cada gestor imprime sua característica técnica e estratégica, mas a maioria dos programas é a mesma.
O Fundo Estadual de Recursos Hídricos continua, a educação ambiental continua, todas as políticas públicas estruturantes continuam. Temos também um programa com destaque grande hoje, que é o REDD + Jurisdicional. Tudo isso segue em andamento e vem sendo reforçado.
O senhor mencionou o REDD+. Houve críticas de comunidades tradicionais e do agronegócio em relação ao programa. Que ajustes estão sendo feitos?
Na verdade, não são alterações, são ajustes. Passamos a incluir dentro dos benefícios do componente de governo os municípios que não participavam diretamente.
Esses ajustes são no sentido do diálogo, de explicar como funciona. É um projeto complexo — tratamos com povos indígenas, quilombolas, pequenos agricultores — e realizamos mais de 60 reuniões para que essas comunidades entendessem o que é o REDD+, o que significa, quais benefícios terão e como tudo funciona.
E como o senhor responde às críticas que vinham sendo feitas antes da sua chegada, tanto por parte das comunidades quanto do agro?
Essas críticas eram anteriores à nossa gestão. O que o governo fez foi dialogar. Ouvir, avaliar, explicar melhor o procedimento. A Secretaria do Meio Ambiente não pode apenas editar resoluções e cobrar. É preciso ouvir e ter foco na solução, não no problema. Essa é a política que implementamos. Mantivemos praticamente toda a equipe técnica da Secretaria, alteramos muito pouco.
Em que estágio está o REDD + Jurisdicional hoje?
Recebemos nesta semana a equipe de auditoria internacional, que está avaliando o projeto, conversando com as organizações e com o governo. Estamos no processo de validação. Neste domingo, 9, estaremos na COP 30, onde o Tocantins vai apresentar o REDD + Jurisdicional, junto com o Fundo de Recursos Hídricos, o Comitê de Bacias, as estratégias de desenvolvimento sustentável e o pagamento por serviços ambientais.
O governador Laurez Moreira participará da abertura e de reuniões com o Fórum da Amazônia, além de encontros com bancos e agências de financiamento. Depois, a equipe da Semarh dará continuidade às negociações e à busca de recursos.
O senhor mencionou o Fundo de Florestas anunciado pelo Governo Federal. Como ele deve funcionar?
Ainda não temos muitos detalhes, mas é um fundo muito importante. Segundo a ministra Marina Silva, o Brasil já aportou $1 bilhão de dólares, cerca de R$5 bilhões de reais, e outros países devem contribuir. Esse fundo foi proposto na COP 28, em Dubai, e agora, dois anos depois, está sendo institucionalizado. É uma grande oportunidade futura de recursos para o Tocantins, voltados à conservação e ao pagamento por serviços ambientais.
E o programa Floresta+ que será lançado no Tocantins?
O Floresta+ é um programa federal de pagamento por serviços ambientais. O Tocantins aderiu por iniciativa do governador Laurez Moreira. Ele deve beneficiar cerca de mil pequenos proprietários, com propriedades de até 320 hectares, que vão receber de R$ 200 a R$ 800 por hectare ao ano, durante três anos (2025 a 2027). Isso pode representar até R$ 18 mil por produtor.
É um valor significativo para quem preserva o que a lei já protege, e ainda recebe um benefício adicional. O programa faz parte do REDD+ Federal, e o Tocantins está entre os nove estados da Amazônia incluídos nessa iniciativa.
O primeiro será Araguaína. É um caso interessante, porque embora seja um polo do agronegócio, também tem o maior número de agricultores familiares com propriedades de até 320 hectares. Essa dicotomia mostra bem como o desenvolvimento sustentável pode ser integrado — o agro e as comunidades tradicionais podem caminhar juntos.
O senhor acredita que essa integração entre agro, comunidades tradicionais e povos indígenas é possível?
Sem dúvida. Nós não estamos em lados opostos. O que queremos é buscar juntos um desenvolvimento sustentável para o Estado, que contemple o agro, as comunidades e os povos indígenas.
Secretário, um dos grandes problemas que o Tocantins enfrenta hoje é a questão dos resíduos sólidos. Temos muitos lixões e poucos aterros. Houve recentemente uma reunião de uma câmara técnica sobre o tema. Quais foram os principais desafios identificados?
Bem lembrado. Resíduos sólidos são um problema sério no estado. No dia 17 de novembro teremos uma audiência pública para a apresentação dos estudos relacionados à regionalização dos resíduos e à busca de alternativas para lidar com essa questão. Estamos seguindo a estratégia de encontrar soluções, e não apenas discutir o problema.
Recebi um conselheiro do Tribunal de Contas junto com o prefeito de Almas para tratar do assunto nesta semana. Já conversei também com o prefeito de Couto Magalhães, que possui um aterro de alta qualidade, um dos primeiros do norte do Tocantins. Temos um projeto aprovado pela Caixa Econômica Federal, dentro do PAC, no valor de R$ 30 milhões, voltado à reciclagem em 20 municípios.
Estamos buscando alternativas para minimizar e resolver de forma definitiva esse problema. O lixo traz uma série de consequências e pressiona investimentos em outros setores. A ausência de um aterro sanitário adequado gera graves problemas de saúde pública, como a contaminação do lençol freático, o que aumenta significativamente a demanda nos hospitais.
O governo tem essa preocupação e uma visão voltada às pessoas. O governador Laurez Moreira determinou que o Estado seja o implementador desses programas na região sudoeste, beneficiando 20 municípios, e quer acompanhar de perto para garantir que tudo seja bem feito.
A responsabilidade pela gestão dos resíduos é dos prefeitos, certo?
Sim, é dos prefeitos. Mas o Estado não se omite e busca ajudar no que for possível. Encontramos dificuldades no âmbito da governança e dos recursos, mas estamos trabalhando para fazer com que as ações avancem.
O senhor já mencionou o apoio financeiro do governo estadual. Existe também diálogo com o setor privado?
Sim. Estive recentemente em Lajeado, onde há uma unidade de reciclagem que envia para São Paulo 16 toneladas de material reciclado. Eles já recebem resíduos de Tocantins, Miracema e outras cidades. Vale a pena conhecer, é um exemplo interessante, o único da região Norte que atua dessa forma.
E o que podemos esperar da Secretaria para este fim de mandato?
Muita dedicação no enfrentamento das demandas estratégicas do Estado. Também manteremos o diálogo aberto com todos os setores — secretários de Meio Ambiente, prefeitos, quilombolas, pequenos agricultores. Tenho recebido todos aqui, sempre abertos à troca de ideias e à construção de estratégias conjuntas.
Esperamos ter boas notícias em breve, mas vou deixar para divulgar mais adiante.
Há algo que o senhor gostaria de acrescentar?
Gostaria de destacar a participação do Tocantins na COP, na comitiva liderada pelo governador. É importante que o Estado seja protagonista nesse processo, e não apenas coadjuvante. Temos a responsabilidade de reforçar o que já vem sendo feito e mostrar que o Tocantins está aberto à inovação.
Mas é um processo que precisa ser conduzido de forma estratégica e participativa, ouvindo a comunidade e o setor produtivo. Alguns atos têm consequências que precisam ser bem avaliadas. Isso foi algo que faltou em momentos anteriores do programa REDD+, e que agora estamos corrigindo por meio do diálogo com todos os interlocutores.
Esse discurso de que “o dinheiro vai cair na conta” é equivocado. Foi criado um entendimento de que os recursos já estavam disponíveis, o que não é verdade. Para que haja qualquer repasse, precisamos concluir o processo de validação pelos padrões internacionais. Só depois disso há a possibilidade de antecipação, referente à negociação dos créditos.
Ainda não vendemos nenhum crédito, porque eles ainda não foram gerados. Temos créditos históricos que estão sendo avaliados pelo governo, e há o interesse de monetizá-los para que os recursos integrem o Fundo Clima. Se conseguirmos avançar nesse sentido, o Tocantins será o único estado do mundo a alcançar esse patamar.
Então, que dinheiro foi esse que caiu na conta?
Foi o recurso de pré-investimento. O acordo foi firmado entre a Mercúria e a Topar, que criaram a empresa Tocantins Carbono (TOCAR). Essa empresa é responsável por todos os investimentos necessários à fase de validação do programa.
Os custos do projeto não são pagos pela Secretaria, mas pela TOCAR, que é uma joint venture entre o governo e a empresa privada, com recursos da Mercúria — vencedora da chamada pública, que contou com a participação de três organizações internacionais.
O senhor pode citar exemplos de ações realizadas com esse dinheiro de pré-investimento?
Claro. Com esses recursos, foi implementado o sistema Sigma e financiadas as reuniões com as comunidades. Também foram feitas obras de infraestrutura, como pontes, estradas e locais de apoio para as atividades de campo.
Foram cerca de 150 dias de comunicação direta com as comunidades — aproximadamente cinco meses de trabalho contínuo. É um esforço muito grande. Nesse diálogo, surgem dúvidas e ansiedades, o que é natural. Quando assumimos, há um mês, havia uma série de questionamentos e ações protocoladas na Defensoria Pública da União, na Defensoria do Estado e até no Ministério Público Federal — que não acatou as demandas.
Precisamos fazer todo esse alinhamento, que só é possível com diálogo. A Secretaria e o governo estão abertos a esse processo de escuta e de construção conjunta.
Agora em novembro, o que está previsto?
Temos algumas agendas confirmadas e a expectativa de dar continuidade a esse trabalho, fortalecendo o diálogo com as comunidades, as prefeituras e os parceiros envolvidos.
Nosso objetivo é encerrar 2025 com todo o processo validado, para que o Tocantins inicie 2026 preparado para a nova fase do programa.
