Todos os deputados do Tocantins votam para suspender diretrizes que garantem aborto legal a vítimas de estupro
06 novembro 2025 às 13h02

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Nesta quarta-feira, 5, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de decreto legislativo (PDL 3/25) que suspende uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), que regulamenta o direito de menores ao aborto legalizado. Ao todo, foram 317 votos a favor, 111 contra e uma abstenção. Na sessão, constavam todos os deputados do Tocantins e todos votaram a favor do projeto.
Confira os nomes dos deputados do Estado que votaram “sim”:
- Alexandre Guimarães (MDB – Movimento Democrático Brasileiro)
- Antonio Andrade (Republicanos)
- Carlos Henrique Gaguim (União Brasil)
- Eli Borges (PL – Partido Liberal)
- Filipe Martins (PL – Partido Liberal)
- Ricardo Ayres (Republicanos)
- Tiago Dimas (Podemos)
- Vicentinho Júnior (PP – Partido Progressistas)
Em 23 de dezembro de 2024 foi aprovada a resolução nº 258 do Conanda que assegura a interrupção legal da gestação da criança e adolescente nos casos violência sexual, risco de vida para a pessoa gestante e gestação de fetos anencéfalos e incompatíveis com a vida, da forma mais célere possível e sem a imposição de barreiras sem previsão legal. Além também do direito à autonomia, privacidade e confidencialidade no atendimento, de acordo com seu estágio de desenvolvimento, inclusive em relação a seus pais ou responsáveis legais.
A suspensão da resolução dificulta às vítimas, o acesso ao atendimento e aborto legal, um retrocesso aos seus direitos de proteção.
A PDL 3/25 contém autoria da deputada Chris Tonietto (PL-RJ) e outros 42 deputados, que alegaram que o aborto não constitui direito e a norma extrapola a atribuição do conselho ao dispensar apresentação de boletim de ocorrência policial, autorização dos pais ou responsáveis, e configurar como conduta discriminatória a objeção ao procedimento.
A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) contra-argumenta sobre a necessidade de haver um representante legal por entender que em “uma grande maioria dos casos, o estuprador é o pai biológico ou adotivo ou outro familiar”.
O deputado José Airton Félix Cirilo (PT-CE), secretário da Primeira Infância, Infância, Adolescência e Juventude da Câmara, criticou a politização do tema através de questões morais e conservadoras. “Temos uma realidade muito cruel no Brasil. No meu estado, uma criança por dia, pelo menos, é estuprada. A resolução busca proteger as crianças vítimas de abusos”, declara.
E contra a alegação sobre o boletim de ocorrência, a deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS) esclarece que as leis da escuta protegida (Lei 13.431/17) e a do minuto seguinte (Lei 12.845/13) já dispensavam o boletim de ocorrência para realização de aborto em caso de estupro.
“É um absurdo obrigar vítimas de violência sexual a carregar essa violência se quiserem acessar o aborto legal, sem boletim de ocorrência, sem revitimização, com garantia da escuta protegida, com garantia do fluxo. Aí eles inviabilizam o fluxo, obrigando que a menina de 10, 11, 12 anos, vai ampliando os tempos da gestação para obrigá-la a ser mãe”, critica.
Após a aprovação na Câmara, o Ministério das Mulheres emitiu uma nota repudiando a PDL. “A necessidade dessas diretrizes é uma resposta a um cenário alarmante. Entre 2013 e 2023, o Brasil registrou mais de 232 mil nascimentos de mães com até 14 anos, idade inferior à do consentimento, ou seja, são gestações infantis decorrente de estupro de vulnerável. Embora a lei garanta o aborto legal em casos de estupro, milhares de meninas são forçadas à maternidade anualmente. Em 2023, apenas 154 meninas em todo o país conseguiram acessar esse direito.”.
O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), por meio da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (SNDCA) também se manifestou em nota:
A referida resolução tem como objetivo garantir a proteção integral e a celeridade no atendimento de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, em conformidade com o que preveem o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) […]. A suspensão de seus efeitos constitui grave retrocesso na política de proteção à infância e adolescência no Brasil, cria barreiras ao acesso a direitos fundamentais e fragiliza o atendimento especializado previsto em leis. Tal medida contraria o princípio da prioridade absoluta, além de comprometer a atuação intersetorial necessária ao enfrentamento das violências que atingem crianças e adolescentes.
A norma do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente afirma que todo adolescente tem direito de acesso à informações sobre seu próprio corpo que permitam a identificação e denúncia de situações de violência sexual, e a ausencia de pais ou responsáveis não impede o pleno exercicio deste direito.
A norma do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente afirma o direito do acesso à informação, autonomia de escolha, independência de registro de um boletim de ocorrência, e todo acompanhamento necessário para a realização da interrupção da gestação. Com a aprovação da PDL, a vitima de abuso sexual necessitará passar pelo processo policial, autorização dos pais ou responsáveis e possibilita ao médico a recusa de cumprir o procedimento. Um retrocesso ao pleno direito de proteção à criança e adolescente, que dificultará o acesso do menor ao aborto seguro.
*Mireia Carvalho cumpre estágio obrigatório por meio do convênio firmado entre o Jornal Opção e a Universidade Federal do Tocantins (UFT), sob supervisão de Elâine Jardim.
