Voto de Fux pode abrir caminho para recurso que muda cronograma do julgamento de Bolsonaro

01 setembro 2025 às 15h52

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As sinalizações recentes do ministro Luiz Fux reforçam a expectativa das defesas de que ele possa abrir divergência no julgamento de Jair Bolsonaro por tentativa de golpe na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). Um voto nesse sentido poderia viabilizar os embargos infringentes, recurso que leva o processo ao Plenário, adia os efeitos da sentença e reabre a discussão sobre o mérito.
Mesmo reconhecendo o risco elevado de condenação, advogados acreditam que Fux pode divergir na dosimetria das penas ou na absorção de crimes, estratégia que já adotou em julgamentos de réus do 8 de janeiro. Juristas apontam que o STF terá de definir o tema dos embargos infringentes diante da ausência de precedentes claros e lacunas no regimento interno. Existe também a possibilidade de exigência de dois votos divergentes, como já decidido em outros casos.
Além de Bolsonaro, serão julgados os generais Walter Braga Netto, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, o almirante Almir Garnier, o ex-ministro Anderson Torres, o deputado federal Alexandre Ramagem e o tenente-coronel Mauro Cid. Todos respondem por crimes como organização criminosa, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
O debate sobre os embargos infringentes ganha relevância porque permite reabrir julgamentos não unânimes, transferindo o caso da Turma, composta por cinco ministros, para o Plenário de onze integrantes.
Para o professor do Insper Luiz Gomes Esteves, a discussão central será quantos votos divergentes são necessários para admitir o recurso. O regimento do STF menciona quatro votos contrários no Plenário, mas não detalha regras para julgamentos nas Turmas. Em 2018, no caso Paulo Maluf, o Supremo considerou que seriam necessários ao menos dois votos divergentes para abertura de embargos.
“Não é uma decisão que cabe ao relator sozinho, Alexandre de Moraes, mas ao Plenário. Ele deve antecipar essa possibilidade diante da complexidade do tema”, afirma Esteves.
Especialistas divergem sobre o ponto: Marcelo Crespo, criminalista e coordenador da ESPM-SP, defende que um único voto divergente seria suficiente, devido à falta de clareza no regimento para Turmas. Outra controvérsia é se embargos só se justificam em casos de absolvição parcial ou total, ou se qualquer divergência, como na dosimetria da pena, já permitiria o recurso.
Ana Laura Barbosa, pesquisadora da USP e professora da ESPM-SP, defende a segunda interpretação. Para ela, ajustes na pena ou absorção de crimes seriam suficientes para embasar embargos, estratégia que as defesas provavelmente explorarão.
Em decisões recentes, Moraes já rejeitou monocraticamente pedidos de embargos infringentes, como no caso de Débora Rodrigues, alegando necessidade de dois votos de absolvição. A defesa recorreu, mas ainda aguarda deliberação do ministro.
As sinalizações de Fux em julgamentos dos réus do 8 de janeiro reforçam a expectativa de divergência. Entre os pontos em que ele pode se posicionar estão: aplicação do princípio da consunção, dosimetria das penas, delação de Mauro Cid e diferenciação entre atos preparatórios e executórios.
Advogados como Eumar Novacki, da defesa de Anderson Torres, consideram que divergências na dosimetria ou absorção de crimes já seriam suficientes para abrir caminho aos embargos. Para Gustavo Badaró, criminalista e integrante da defesa de Bolsonaro, o recurso deve ser inevitavelmente utilizado, dada a complexidade do caso.