Entre o dito e o não-dito: o Tocantins nas tramas do discurso

Por: Thiago Barbosa Soares

Publicada pela Pontes Editores, casa editorial reconhecida por sua longa e profícua tradição na difusão de obras de referência em Análise do Discurso, a coletânea Entre o dito e o não-dito: o Tocantins nas tramas do discurso, de autoria do professor e pesquisador Thiago Barbosa Soares (UFT/CNPq), configura-se como um marco teórico e político no campo dos estudos discursivos brasileiros. Organizada sob o signo da Análise do Discurso de orientação materialista, a obra propõe uma incursão densa e rigorosa pelos meandros do dizer e do silenciar, articulando teoria e análise em uma escrita de notável sofisticação conceitual.

Desde o prefácio, delineia-se o projeto intelectual que sustenta o volume: compreender o Tocantins não apenas como território geopolítico recente, mas como campo simbólico de produção discursiva, no qual se entrecruzam ideologia, poder e linguagem. O Estado, mais do que tema, é erigido como operador teórico, como lente a partir da qual se pode reler o Brasil em suas contradições mais profundas. O Tocantins emerge, assim, como espaço epistemologicamente privilegiado de observação das tramas discursivas que estruturam o país, permitindo pensar o nacional desde a margem, não como periferia, mas como ponto de vista insurgente que desnuda os mecanismos simbólicos de legitimação da desigualdade.

Os artigos que compõem o livro realizam um gesto comum: o de escavar os modos de funcionamento do discurso midiático, revelando as condições de produção dos sentidos que naturalizam hierarquias sociais, políticas e identitárias. Longe de conceber a mídia como mero canal informativo, a coletânea a trata como aparelho ideológico, dispositivo de poder que regula o visível e o invisível, o dito e o interdito. O rigor metodológico que sustenta cada análise, sustentado por categorias como condições de produção, formações discursivas e interdiscurso, alia-se a um forte compromisso ético-político, fazendo do discurso não apenas objeto, mas arena de luta simbólica.

Entre os muitos exemplos mobilizados, o discurso da inclusão, a estetização da fama, o “cheiro institucional” de órgãos públicos, a militarização escolar, a obra evidencia que cada enunciado é atravessado por ideologia e que, por trás do aparente consenso, operam estratégias de poder e silenciamento. Nesse sentido, o livro realiza mais que uma reunião de estudos: oferece uma contranarrativa ao imaginário hegemônico, restituindo à linguagem sua dimensão política e histórica.

Ao dar visibilidade ao Tocantins e aos discursos que o conformam interna e externamente como Estado do Norte brasileiro, a obra reafirma a potência epistemológica do local como espaço de produção de conhecimento crítico. O gesto de dizer Tocantins, aqui, é também o de dizer Brasil, não o Brasil conciliador dos discursos oficiais, mas aquele tecido por tensões, exclusões e resistências.

Portanto, Entre o dito e o não-Dito é uma contribuição decisiva à Análise do Discurso contemporânea no país. Com densidade teórica, precisão metodológica e força interpretativa, a coletânea convoca o leitor a uma escuta vigilante do não-dito, a um pensamento que não se contenta com o evidente e a uma crítica que, ao historicizar os

sentidos, reinscreve o político no coração da linguagem. Trata-se de uma obra que consolida o Tocantins como locus de enunciação e reflexão, projetando-o, com legitimidade, no mapa maior da produção discursiva brasileira.