O retorno de Eduardo Siqueira Campos (Podemos) à Prefeitura de Palmas, após 20 dias afastado por decisão do STF, não é apenas o recomeço de uma gestão interrompida, é a retomada de um projeto político interrompido e o início de uma disputa velada pelo comando do poder na capital. Quem sai menor desse processo, por ora, é o vice-prefeito Carlos Velozo (Agir), que durante a interinidade no cargo fez movimentos próprios, bancou trocas e alçou ao centro do governo figuras de fora do núcleo histórico dos Siqueira.

Velozo assumiu o comando da prefeitura no fim de junho, no mesmo dia que Eduardo acabou preso pela Polícia Federal na nova fase da Operação Sisamnes, que investiga suposto esquema de venda de decisões no STJ. No dia 1º de julho, contrariando o discurso de continuidade, exonerou duas figuras-chave da gestão: o chefe de gabinete Carlos Antônio da Costa Júnior e o procurador-geral Renato de Oliveira. A decisão provocou desgaste interno e sinalizou que o vice-prefeito não pretendia apenas “esquentar a cadeira”.

Carlos justificou que, com a caneta no CPF dele, responderia pelas decisões, certas ou erradas. Disse ainda que o chefe de gabinete não vinha fornecendo informações solicitadas. Mas o fato é que Velozo aproveitou o vácuo deixado pela ausência de Eduardo para reorganizar a estrutura de governo. Promoveu mudanças, fortaleceu aliados e abriu as portas para grupos políticos até então periféricos no Paço Municipal.

Entre os que ganharam protagonismo, está o grupo Monte Sião, ligado ao agronegócio e à igreja Assembleia de Deus – Nação Madureira. Uma das sócias do grupo, Dalide Corrêa, já era apontada como nome a ser testado para o Senado. O pastor Amarildo, tio de Carlos e líder da Nação Madureira no Tocantins, também passou a ter influência direta nas decisões. Ele é pai do deputado federal Filipe Martins (PL) e articulador político de peso entre os evangélicos. Secretarias passaram a ser preenchidas por nomes ligados à igreja, o que fortaleceu o grupo, que já tinha o comando da Educação, comandada por Débora Guedes, também vereadora eleita e aliada direta de Amarildo.

Velozo governava. Mas governava por conta própria. Não consultava Eduardo. Não conversava com a secretária de Assistência Social, Polyanna Siqueira, esposa do prefeito. Ao Jornal Opção Tocantins, em entrevista, chegou a dizer que sua mente era quem dava a palavra final e que estaria, inclusive, contrariado o próprio grupo político durante sua passagem interina.

Com Eduardo de volta, o cenário muda de novo

Assim que reassumiu o cargo, Eduardo fez questão de reconduzir os seus. Mas a frase dita em tom institucional, “Não guardarei mágoas”, não escondeu a movimentação política. O prefeito retomou as rédeas e deve ir além. A expectativa é que, nos próximos dias, retire mais peças ligadas ao grupo de Amarildo e reforce o núcleo duro da gestão. O caso mais simbólico deve ser o de Débora Guedes. Ela deve deixar a Educação e retornar à Câmara, onde tem mandato garantido.

Para Carlos Velozo, o espaço conquistado durante a interinidade começa a evaporar. E o acordo feito em março do ano passado, quando Amarildo articulou sua indicação como vice na chapa de Eduardo, começa a se esfarelar. A aliança entre os dois já não se sustenta em confiança nem em projeto comum.

O grupo evangélico ainda tem carta no jogo

Mas antes de escrever o obituário político de Velozo e Amarildo, é bom lembrar: o grupo ainda tem peso. Tem base social, tem mandato federal com Filipe Martins e, sobretudo, tem a máquina de mobilização das igrejas. Na eleição de 2024, mesmo com o PL tendo candidatura própria, Janad Valcari, Amarildo e Filipe romperam com a coligação e foram de Eduardo até o fim. Essa lealdade pode virar moeda política agora. Pode até não impedir a perda de cargos, mas certamente será levada em conta no cálculo de Eduardo para tocar o mandato.

A ruptura é evidente, mas o divórcio pode ser negociado. Eduardo Siqueira voltou para reassumir o comando, mas sabe que, para manter Palmas e olhar para o futuro, vai precisar costurar com mais do que lealdade pessoal. Vai precisar de base, votos e pragmatismo.