“Dá para levar a sério um país onde existe prisão domiciliar? O condenado é carcereiro dele mesmo”, diz Eduardo Bolsonaro

06 agosto 2025 às 08h18

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Já sabemos que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) teve a prisão domiciliar decretada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), após descumprir medidas cautelares, mas, o que chama atenção é o silêncio seletivo do filho 03 do ex-presidente, Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que durante anos vociferou contra esse mesmo benefício quando aplicado a outros acusados.
O contraste entre o passado e o presente de Eduardo Bolsonaro salta aos olhos. Em dezembro de 2017, ele afirmou no X (antigo Twitter) que “ladrão de galinha ir para a cadeia e ladrão amigo do rei para prisão domiciliar (leia-se mansão) é sinônimo de impunidade”.

Na ocasião, ele criticava juízes que, segundo ele, se valiam de brechas legais para beneficiar determinados réus. Nos meses seguintes, Eduardo reforçou sua aversão ao instituto. Em março de 2018, disse que “o condenado é carcereiro dele mesmo”, ironizando a possibilidade de monitoramento eficaz de presos em casa.

Em fevereiro de 2019, já com o pai na Presidência, voltou ao tema ao comentar sobre a criminalidade juvenil: “Bandido é um ser pensante, igual a mim e você. Antes de praticar o crime ele pensa nas chances de ser preso – que no Brasil são baixíssimas”. A crítica à prisão domiciliar, segundo ele, estava diretamente ligada ao aumento da sensação de conforto e impunidade para criminosos.

Um mês depois, em março de 2019, Eduardo fez uma postagem que hoje soa quase profética: “O crime cresce quando o bandido se sente confortável”, afirmou, ao atacar mais uma vez o uso da tornozeleira eletrônica e da prisão domiciliar. Curiosamente, o mesmo equipamento agora circunda o tornozelo de seu pai, que cumpre a medida determinada pelo STF.

Porém, o discurso mudou radicalmente quando a realidade bateu à porta da família Bolsonaro. Ao comentar a prisão domiciliar do pai, Eduardo preferiu não atacar o instituto que tantas vezes chamou de “sinônimo de impunidade”. Em vez disso, limitou-se a declarar que Bolsonaro teria sido preso “sem crime, sem provas, sem julgamento”, alegando perseguição política e abuso de poder.
Mas essa contradição ganha contornos ainda óbvios quando se observa o histórico recente do ex-presidente. Jair Bolsonaro descumpriu medidas cautelares impostas em julho, que proibiam o uso de redes sociais, inclusive por meio de terceiros.
Moraes citou uma série de episódios: a ligação em vídeo com manifestantes na Avenida Paulista; a publicação de mensagens no Instagram do senador Flávio Bolsonaro e do vereador Carlos Bolsonaro; e até a participação em chamadas divulgadas pelo deputado Nikolas Ferreira. Para o ministro, houve “reiteração de condutas ilícitas de maneira mais grave e acintosa”, o que justificou a substituição das medidas anteriores pela prisão domiciliar.
Enquanto isso, Eduardo Bolsonaro elevou o tom contra Moraes, chamando-o de “psicopata descontrolado” e afirmando que o Brasil “não vive mais uma democracia”.
A situação mostra como figuras públicas que constroem carreiras sobre retórica punitivista raramente aplicam os mesmos princípios quando confrontadas com a realidade pessoal. A mudança de tom de Eduardo Bolsonaro não é apenas uma questão de opinião, mas um retrato da instrumentalização política da justiça penal. Quando o “bandido” era o outro, a prisão domiciliar era uma afronta à sociedade; quando o “bandido” passou a ser o pai, ela se tornou uma injustiça revestida de perseguição política.