Por: Jéssica Torres

A COP30 trouxe o mundo para dentro da Amazônia e colocou o Brasil no centro do debate climático mundial. Mas faltou dizer que, junto com o prestígio, veio um espelho incômodo: o país que promete liderar a transição verde ainda oscila entre avanços reais e contradições.

A escolha de Belém como sede tem grande valor simbólico e colocou o Brasil no foco de discussões sobre financiamento climático e preservação. Mas, ao mesmo tempo, expôs dilemas internos.

As polêmicas também marcaram o evento: do protesto midiático de Luísa Mell, mais performático do que propositivo, às queixas sobre infraestrutura, preços elevados e dúvidas sobre a participação efetiva da sociedade civil.

A confusão na entrada da conferência, com povos indígenas barrados, mesmo que depois corrigido, revelou outra incoerência: falar de preservação enquanto se impede a voz de quem historicamente protege a floresta. Sem eles, qualquer política ambiental nasce incompleta.

A construção de uma nova via, em Belém, com cerca de 13 km, a “Avenida Liberdade”, expôs mais um paradoxo: erguer uma obra que desmata para sediar um evento que prega exatamente o contrário.

Essa contradição entre o discurso ambicioso e a implementação real reforça que a COP30 não é apenas um espelho para o Brasil, mas para toda a arquitetura climática global: nem sempre o compromisso verbal se traduz em transformações tangíveis.

Um ponto relevante veio da delegação goiana: representantes municipais e estaduais levaram o Cerrado para a COP. As vereadoras Kátia Maria (PT) e Aava Santiago (PSDB), por exemplo, reforçaram a necessidade de que o Cerrado receba também atenção e financiamento proporcional à sua importância. O gesto representa menos uma pauta partidária e mais uma demanda histórica. 

Neste ano, ao conduzir a comunicação de um evento de ESG, percebi como ainda há um desconhecimento significativo sobre o próprio conceito. Isso não é um mero ruído semântico: revela o quanto a sustentabilidade e a pauta verde precisam se aproximar mais da vida prática. 

E o que sobra agora que os holofotes foram desligados? 

Apesar dos tropeços, não dá para ignorar que também houve avanços. Entre eles, a criação do Plano Nacional de Arborização Urbana e o investimento de R$ 55 milhões do Fundo Amazônia, via BNDES, destinado à OTCA (Organização do Tratado de Cooperação Amazônica). Além disso, foi lançado o Tropical Forests Forever Fund, que busca criar um novo modelo internacional de pagamento para preservação de florestas tropicais. 

São movimentos que apontam um caminho possível, desde que coerência e continuidade deixem de ser exceção e virem regra.

Ao fim, o saldo é de avanços e incoerências que precisam ser vistos. O Brasil é gigante em biodiversidade e discurso, mas ainda há desafios práticos. E, acima de tudo, ainda luta para equilibrar urgências sociais, ambientais e econômicas em um território vasto e desigual.

Faltou dizer, por fim, que a justiça climática começa quando as luzes se apagam. O verdadeiro teste vem a partir de hoje, no que podemos chamar de pós-COP. Resta saber: o Brasil quer ser palco ou protagonista?