Brics pede regras para uso de dados em inteligência artificial e discute transição energética global

06 julho 2025 às 14h41

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Durante a 17ª Reunião de Cúpula do Brics, realizada nos dias 6 e 7 de julho de 2025 no Rio de Janeiro, os países integrantes do bloco Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul divulgaram uma declaração conjunta defendendo a proteção de direitos autorais e da propriedade intelectual no uso de conteúdos para treinamento de modelos de inteligência artificial (IA).
O texto destaca a importância de estabelecer mecanismos que garantam equilíbrio entre a proteção da propriedade intelectual e a remuneração adequada pela utilização de dados em aplicações de IA:
“É necessária uma abordagem equilibrada para proteger a propriedade intelectual e salvaguardar o interesse público… A proteção adequada dos direitos autorais contra o uso não autorizado da IA deve estar em vigor para evitar a coleta excessiva de dados, permitindo mecanismos de remuneração justa.”
A posição dos países do Brics contrasta com a adotada por grandes empresas de tecnologia, sobretudo dos Estados Unidos e do G7, que veem a cobrança por direitos autorais como um possível obstáculo à inovação tecnológica.
O impasse atual remete a discussões da década de 1990 sobre propriedade intelectual, quando países em desenvolvimento buscavam a flexibilização de patentes de medicamentos. Atualmente, o cenário apresenta uma inversão parcial: as nações emergentes são responsáveis pela geração de grande volume de dados essenciais para sistemas de IA, enquanto os países desenvolvidos demonstram resistência à remuneração por esse uso.
“Agora, que a quantidade de dados produzidos pelos países emergentes é muito maior… eles alegam que o pagamento impediria a inovação. São dois pesos e duas medidas”, afirmou uma fonte à Reuters.
A governança global da inteligência artificial também foi abordada no documento oficial, com ênfase na inclusão de países do Sul Global nas decisões relacionadas à tecnologia:
“Reconhecemos que a inteligência artificial representa uma oportunidade histórica para impulsionar o desenvolvimento… A governança global da IA deve mitigar riscos e atender às necessidades de todos os países, incluindo os do Sul Global.”
Entre os países-membros, a China tem apresentado avanços significativos no campo da inteligência artificial. Um dos destaques recentes é o modelo DeepSeek, que ultrapassou o ChatGPT em número de acessos. A meta do país é alcançar a liderança mundial no setor até 2030.
Fortalecimento da cooperação
Especialistas ouvidos durante o evento defenderam o fortalecimento da cooperação entre os países do bloco. O professor Xiao Youdan, da Academia Chinesa de Ciências, apontou a necessidade de parcerias e investimentos conjuntos no desenvolvimento de tecnologias de IA.
A desigualdade no acesso à tecnologia entre os países do grupo também foi mencionada. A pesquisadora sul-africana Thelela Ngcetane-Vika comentou sobre os impactos da infraestrutura limitada em algumas regiões:
“Você pode falar sobre IA, mas no contexto de falta de infraestrutura, você tem questões de exclusão digital… A ausência de igualdade de condições é um problema.”
Transição energética
Tema de destaque em seminário paralelo à cúpula, a transição energética foi debatida com base na participação do Brics no cenário global de carbono e combustíveis. Segundo dados apresentados pela professora Maria Elena Rodriguez, da PUC-Rio, o bloco responde por:
- 74% do consumo global de carbono
- 70% da produção global de carbono
- 37% da produção e consumo de gás natural
- 42% da produção de petróleo
Apesar das diferenças nas matrizes energéticas — como a forte dependência de combustíveis fósseis na China e na Arábia Saudita, em contraste com a presença de fontes renováveis no Brasil —, os participantes enfatizaram a relevância da cooperação técnica e da transferência de tecnologia para viabilizar uma transição energética justa.
Tang Xiaoyang, da Universidade de Tsinghua, afirmou que a China vê o crescimento conjunto com outras economias como um objetivo estratégico:
“O crescimento isolado não é sustentável. O governo chinês incentiva o investimento e o comércio como formas de cooperação econômica real.”
O Brics conta atualmente com 11 membros permanentes: Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Irã, Arábia Saudita, Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos e Indonésia. Também participam como países parceiros nações como Cuba, Vietnã, Cazaquistão, Nigéria e Malásia.