Desabamento da ponte JK levou galões de agrotóxicos a “viajarem” por 300 km no Rio Tocantins

28 abril 2025 às 10h16

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Galões contendo agrotóxicos que caíram no R
io Tocantins em dezembro de 2024, após o desabamento da ponte Juscelino Kubitschek de Oliveira, entre Estreito (MA) e Aguiarnópolis (TO), foram encontrados no estado do Pará, a mais de 300 quilômetros do local do acidente. A informação consta em relatório do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) datado de fevereiro deste ano.
O acidente ocorreu em 22 de dezembro e resultou na morte de 14 pessoas, além de deixar três desaparecidas. Na ocasião, três caminhões caíram no rio, carregados com milhares de litros de agrotóxicos e ácido sulfúrico. Um dos veículos transportava mais de 25 mil litros de pesticidas à base de 2,4-D, picloram e acetamiprido, acondicionados em galões de 20 litros.
De acordo com o Ibama, alguns desses galões foram encontrados em municípios do Pará, como Nova Ipixuna e Itupiranga, cerca de 19 dias após o acidente. O trabalho de resgate, iniciado logo após o desmoronamento, enfrentou dificuldades devido à alta vazão do rio, à turbidez da água e à profundidade superior a 40 metros em alguns trechos, segundo a Marinha do Brasil.
Até 9 de janeiro, apenas 29 dos aproximadamente 1.300 galões haviam sido recuperados pelas equipes do Ibama, da Marinha e do Corpo de Bombeiros do Tocantins. As operações foram suspensas em janeiro devido à intensificação das chuvas, que exigiu a abertura das comportas da Usina Hidrelétrica Estreito, localizada a poucos quilômetros do local do desabamento. Com isso, o nível do rio subiu, impossibilitando a continuidade dos trabalhos de mergulho.
Segundo nota enviada pelo Ibama à Repórter Brasil, a integridade dos galões submersos não pôde ser verificada, e a retomada das operações está prevista para o período seco. A estimativa é que sejam necessários cerca de 145 dias para a remoção dos galões restantes, mas ainda não há data definida para o reinício dos mergulhos.
O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), responsável pela ponte, declarou que não foi possível instalar barreiras físicas de contenção devido às características do rio, como correnteza forte e profundidade que pode chegar a 48 metros. O órgão afirmou ainda que assumiu o monitoramento da qualidade da água, seguindo o princípio do poluidor-pagador.
Até o momento, apenas dois resultados de análises de água foram divulgados. Em um deles, realizado dois dias após o acidente, foi detectada a presença de 2,4-D em uma amostra de água coletada em Porto Franco (MA), a cerca de 30 km abaixo do local do desmoronamento. A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) informou que a concentração encontrada era inferior ao limite máximo permitido para água potável, mas ressaltou que a substância não foi detectada em nova análise feita posteriormente.
Desde fevereiro, o Dnit é o responsável por coletar três amostras de água por mês: uma acima, uma abaixo e outra no ponto do acidente. Segundo o órgão, até o momento, as amostras não indicaram alterações relevantes na qualidade da água. O Ibama também afirmou que, de acordo com as normas vigentes, não foram detectadas mudanças nos parâmetros de potabilidade.
O Rio Tocantins, que nasce em Goiás e percorre mais de 2.400 quilômetros até desaguar na Baía de Marajó (PA), é fonte essencial para o abastecimento de água, irrigação agrícola e atividades pesqueiras em dezenas de municípios. Lideranças comunitárias da região, como Conceição Amorim, do Centro de Promoção da Cidadania e Defesa dos Direitos Humanos Padre Josimo, relataram preocupação com a falta de informações atualizadas sobre a situação do rio e cobraram mais transparência dos órgãos responsáveis.
Desde o desmoronamento, pelo menos cinco ações judiciais foram ajuizadas, pedindo explicações e exigindo medidas de reconstrução da ponte, além da implementação de ações para monitorar e proteger o rio.
Segundo especialistas, embora as bombonas de agrotóxicos sejam projetadas para resistência, a exposição prolongada à água, choques contra rochas e sedimentos podem provocar fissuras, resultando em vazamentos de pequenas quantidades de produto químico, o que poderia causar impactos ambientais ainda não dimensionados.
O 2,4-D, uma das substâncias envolvidas, é classificado como possivelmente cancerígeno pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer, ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS). O picloram e o acetamiprido também são apontados como prejudiciais ao meio ambiente aquático.
O Dnit informou que os resultados das coletas realizadas desde fevereiro indicam níveis de contaminantes abaixo do limite de quantificação dos equipamentos de análise, ou seja, as concentrações encontradas não são consideradas preocupantes no momento.