Estudo propõe fusão de até 70% dos municípios brasileiros para elevar arrecadação local

02 agosto 2025 às 14h30

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Uma proposta que prevê a fusão de municípios brasileiros foi apresentada no estudo “Arranjos federativos e federalismo fiscal: uma proposta de fusão municipal no Brasil”, publicado nesta quinta-feira, 31, nos Cadernos Gestão Pública e Cidadania. O levantamento indica que a junção de até 70% das cidades do país resultaria em melhores condições fiscais para a esfera municipal e maior autonomia operacional.
De autoria dos pesquisadores Amarando Francisco Dantas Junior e Josedilton Alves Diniz, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), o estudo apresenta a criação dos chamados “amálgamas municipais” — novas entidades administrativas originadas a partir da união de municípios limítrofes. A proposta é uma resposta aos impactos gerados pelo modelo atual de descentralização do sistema federativo. De acordo com os dados, 95,4% dos municípios brasileiros seriam alcançados por essa mudança. “Seria uma saída que no fim de tudo geraria muito desenvolvimento em especial para as áreas mais interioranas, onde encontram-se municípios com 5.000 habitantes ou menos”, afirma Amarando Junior.
A análise parte da leitura de que a Constituição Federal de 1988 favoreceu o surgimento de micro e pequenos municípios, que enfrentam dificuldades para financiar serviços públicos com recursos próprios e, por isso, dependem de repasses intergovernamentais. A gestão descentralizada dos serviços, aliada à concentração de receitas na União, seria um dos fatores limitantes para a sustentabilidade fiscal dessas localidades.
Como exemplo, Amarando Junior cita a gestão na área da saúde em cidades de pequeno porte, frequentemente restrita ao deslocamento de pacientes. “Dadas as limitações operacionais de micro e pequenos municípios, é comum que se providencie apenas o transporte dos moradores para que eles recebam tratamento de saúde em municípios um pouco maiores daquela região.”
Para a construção da proposta, os autores consideram critérios como o número de habitantes — até 119.213 por município —, contiguidade geográfica e localização no mesmo estado. A base da análise é o conceito de Esforço Fiscal de Arrecadação (EFA), indicador que mede a proporção de receita obtida com recursos próprios em relação à receita total. A modelagem matemática propõe fundir municípios vizinhos com capacidades fiscais complementares, de forma a otimizar esse indicador.
Foram examinados dados populacionais e contábeis de 5.567 municípios brasileiros, no período de 2013 a 2021. Brasília (DF), Fernando de Noronha (PE) e Ilhabela (SP) ficaram de fora da amostra por características político-administrativas ou geográficas. Com as informações coletadas, os pesquisadores desenvolveram um modelo de combinação entre municípios visando maximizar o EFA e projetaram os efeitos da medida ao comparar os cenários antes e depois da criação dos amálgamas.
O estudo estima que a redução de 70% no número de municípios elevaria em 36% a capacidade de autossuficiência operacional — isto é, a aptidão de manter despesas correntes com receitas próprias — e reduziria em 25,7% os desequilíbrios fiscais entre os entes, contribuindo para maior equilíbrio regional. No entanto, os autores reconhecem entraves legais: atualmente, a Constituição brasileira não permite a fusão sistemática de municípios nem a criação de novas entidades a partir desse tipo de reorganização. Para Amarando Junior, “temos uma estrutura política muito consolidada e robusta que se alimenta financeiramente dos pequenos municípios”.
Mesmo com essas limitações, os pesquisadores indicam que os resultados podem servir de base para a reformulação de políticas públicas voltadas à revisão do modelo federativo, principalmente na área fiscal. Caso implementada, a proposta alteraria a composição dos municípios brasileiros, o que impactaria diretamente os sistemas públicos locais — responsáveis por empregos e geração de renda em micro e pequenas cidades. A análise foi realizada antes da aprovação da reforma tributária, que, segundo Amarando Junior, pode aumentar a dependência dos municípios em relação a transferências, “em especial do governo federal”.