Desde o início de julho, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) retomou as atividades para localizar e retirar mais de mil galões de agrotóxicos que continuam submersos no rio Tocantins desde dezembro de 2024. Técnicos utilizam sonares e equipamentos não tripulados na operação, que segue com cronograma de ações até setembro, conforme documentos obtidos pela Repórter Brasil via Lei de Acesso à Informação (LAI).

O material chegou ao fundo do rio após o desabamento da ponte Juscelino Kubitschek de Oliveira, na BR-226, entre Estreito (MA) e Aguiarnópolis (TO), há 219 dias. O acidente envolveu três caminhões que transportavam defensivos agrícolas e ácido sulfúrico. Desde então, apenas 29 bombonas foram removidas.

Foto: Divulgação

As cargas continham substâncias como 2,4-D, picloram e acetamiprido, agrotóxicos classificados como perigosos para a saúde humana e para o meio ambiente. A maior parte desse material segue submersa, com risco de vazamento.

As primeiras ações de retirada foram iniciadas logo após o acidente, mas foram suspensas no começo de janeiro, devido à elevação do nível do rio provocada por chuvas e pela abertura das comportas da Usina Hidrelétrica Estreito, situada a três quilômetros do local. O Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) interrompeu os trabalhos citando riscos à segurança dos mergulhadores.

Recolhimento

Desde então, o processo tem ocorrido de forma gradual. Em maio, o Dnit informou que o retorno das atividades dependia de fatores como clima, força da correnteza e operação da barragem. A retomada foi confirmada apenas no início de julho, mais de seis meses após a paralisação.

O Ibama comunicou que elabora um relatório sobre a situação após visita técnica ao local. Já o Dnit explicou que as inspeções reiniciaram em 1º de julho, com o uso de sonares e equipamentos remotos para localização dos veículos e galões. A próxima etapa prevista é a realização de mergulhos técnicos.

Após essa fase, será feito o mapeamento completo do local, seguido de um plano individualizado para a retirada de cada carga, levando em conta profundidade, presença de escombros e os riscos associados.

Boletins hidrometeorológicos apontam que as atuais condições do rio Tocantins são adequadas para a execução dos mergulhos e da retirada dos galões. Dados do Serviço Geológico do Brasil (SGB) e da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) indicam estabilidade no regime hídrico do rio, com pouca pluviosidade, correnteza reduzida e baixa turbidez da água, sendo o oposto do cenário que havia motivado a suspensão das atividades.

Imagens registradas pela Marinha do Brasil mostram parte dos 1.300 galões de agrotóxicos no fundo do rio após o acidente em dezembro. Apenas 29 deles haviam sido retirados antes da suspensão dos mergulhos em janeiro.

A Usina Hidrelétrica Estreito, que opera a barragem da região, declarou que adota o modelo “a fio d’água” e segue as normas estabelecidas pela Resolução ANA nº 070/2021. Segundo o consórcio responsável, qualquer alteração no regime de vazão depende de autorização dos órgãos reguladores.

Conforme relatório de monitoramento da água da LAI, até 10 de abril, análises não identificaram presença de agrotóxicos acima dos limites permitidos.

Os galões submersos são considerados um fator de risco ambiental

Ainda assim, a presença prolongada dos galões submersos é considerada um fator de risco ambiental, devido à possibilidade de vazamento e impactos ao ecossistema aquático, bem como às populações que utilizam o rio para abastecimento e pesca.

O rio Tocantins percorre os estados de Goiás, Tocantins, Maranhão e Pará, sendo uma importante fonte de água da região. É usado por comunidades para consumo, irrigação, pesca e lazer. Moradores próximos ao local do acidente relatam ausência de comunicação por parte dos órgãos responsáveis pela operação.

“Não houve, em nenhum momento, nenhum tipo de conversa ou de aproximação dos órgãos responsáveis pela retirada dos materiais que estão no fundo do rio com as comunidades Apinayé”, relatou Ricardo Murakami, representante de uma associação da Terra Indígena Apinayé, em Tocantinópolis (TO).

Especialistas alertam para os efeitos do consumo contínuo de pequenas doses de agrotóxicos, ainda que dentro dos limites considerados seguros.

Após o acidente, a ANA afirmou que a alta vazão do rio contribuiria para diluir os pesticidas, reduzindo os riscos à população. Para Fábio Kummrow, professor de toxicologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), essa conclusão não pode ser confirmada sem a divulgação de dados.

“É muito fácil assumir que está chovendo, que a vazão está alta e que não há risco. É um discurso válido, mas sem dados numéricos, é um discurso vazio”, declarou. “Se está tudo normal, por que não divulgam os dados?”, disse Kummrow. Parte dos galões foi arrastado pela correnteza até municípios do Pará, a mais de 300 km do local do acidente. Alguns recipientes foram recolhidos por prefeituras e devolvidos à empresa responsável pela carga.