Tarifa de 40% dos EUA atinge 100% das exportações do Tocantins para o país

11 agosto 2025 às 17h43

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As tarifas de 40% impostas pelo governo dos Estados Unidos sobre produtos importados do Brasil passaram a valer desde a última quarta-feira, 6, e afetam, de acordo com estimativas da Folha baseadas em dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic) referentes a 2024, ao menos metade das vendas brasileiras para o mercado americano em 22 estados. Em oito deles, o impacto ultrapassa 95%.
O decreto da Casa Branca eleva o valor total da sobretaxa ao país em 50%, mesmo com uma lista de 694 isenções. Tocantins, Alagoas, Acre, Amapá, Ceará, Rondônia, Paraíba e Paraná passam a ter de 95% a 100% de suas exportações para os EUA atingidas pela nova tarifa. Percentuais inferiores a 50% são registrados apenas em Mato Grosso do Sul (49,6%), Pará (44%), Rio de Janeiro (32%), Sergipe (24%) e Maranhão (9%).

Fonte: DeltaFolha com dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex)
Em valores absolutos, o Sudeste concentra o maior peso das tarifas sobre o total exportado, por ser a região que mais vende ao mercado americano. Porém, fatores como a dependência dos EUA em determinados segmentos, características das cadeias produtivas e a lista de produtos isentos indicam que outras regiões, como Nordeste e Sul, tendem a sentir efeitos mais acentuados.
Levantamento do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) aponta que Sudeste e Centro-Oeste devem absorver melhor o impacto, em parte por terem sido contemplados com mais isenções. Em 2024, São Paulo exportou US$ 13 bilhões para os EUA, dos quais cerca de 56% (US$ 7,5 bilhões) agora estão sujeitos à tarifa. Produtos de alto valor agregado, como aviões, petróleo e suco de laranja, entre os mais comercializados pelo estado, ficaram de fora da cobrança integral, reduzindo a exposição geral. Os EUA são o principal destino das exportações paulistas (19%), seguidos por China (12%) e Argentina (9%).
Entre os estados do Sudeste, Minas Gerais possui a maior fatia de comércio afetada, com 63%. Em 2024, vendeu US$ 4,6 bilhões aos americanos, sendo que US$ 2,9 bilhões passam a ter incidência de 50%. O café representa US$ 1,5 bilhão desse valor, e o Brasil é o principal fornecedor do produto para os EUA.
Impactos
No Norte e no Nordeste, vários estados não foram beneficiados com isenções e têm praticamente toda a pauta exportadora ao mercado americano impactada. Tocantins, por exemplo, exportou US$ 74 milhões aos EUA no último ano, todos em categorias tarifadas, como carne bovina, peptona, sebo animal, ossos, gelatina e derivados. Apesar de o estado não ter alta dependência do mercado americano no total exportado, setores específicos e microrregiões podem sentir os efeitos. A China foi o principal destino das vendas externas tocantinenses em 2024 (47% do total), enquanto os EUA ficaram na sexta posição.
No Ceará, a dependência é maior: 98,6% dos produtos vendidos aos americanos serão tarifados, e quase metade (45%) de todas as exportações estaduais tem como destino os EUA. Entre os itens atingidos estão ferro e aço, frutas, peixes, calçados e mel.
Segundo o economista Flávio Barreto, que elaborou o estudo da FGV Ibre junto com Thiago de Araújo Freitas, mesmo quando a participação americana é pequena no volume total exportado, as pautas do Norte e Nordeste costumam se concentrar em produtos de baixo valor agregado e alta intensidade de trabalho, sem isenção na lista, ao contrário do Sudeste.
“No Nordeste, grande parte dos produtos – frutas, pescados, calçados, vestuário – será taxada. No geral, são itens de baixo valor agregado, com mão de obra pouco qualificada, grande parte é perecível. Imagine, por exemplo, os produtores de mel no Piauí, onde grande parte da produção é feita por cooperativas e pequenos produtores”, disse.
Estados como Bahia, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte, que possuem polos agroindustriais voltados à exportação, estão entre os mais expostos.
No Sul, 88% das exportações regionais passam a ter tarifa integral. O Paraná é o mais afetado na região, com 96% das vendas aos EUA, cerca de US$ 1,5 bilhão, estão sujeitos à nova taxa. Os setores mais impactados são madeira e móveis, calçados e têxteis, todos com forte participação sulista no total exportado pelo Brasil.
Para Marcos Lélis, professor de economia da Unisinos e coordenador do grupo de pesquisa em competitividade e economia internacional, o impacto no PIB pode ser pequeno em termos absolutos, mas relevante em setores e microrregiões dependentes do mercado americano. No Rio Grande do Sul, onde 85% do que é vendido aos EUA será tarifado, o efeito pode representar entre 0,9% e 1,1% do PIB estadual em 12 meses.
“Quando olhamos a nível global, parece baixo, mas o impacto setorial e regional é altíssimo. Fumo, armas e calçados representam quase 35% do que foi sobretaxado, e tanto armas e munições como o setor de calçados estão na mesma região, em São Leopoldo, e quase tudo é exportado aos Estados Unidos”, afirmou.
Um exemplo citado é a fábrica da Taurus, em São Leopoldo, que envia quase toda a produção de armas para os EUA, mercado que responde por 80% do faturamento da empresa.
“Se não houver uma solução, uma negociação, a curva vai ficando mais longa e afetando a cadeia de pequenos fornecedores do entorno dos setores afetados. A melhor forma de o governo ajudar, na minha opinião, não é setorial, mas concentrada, olhando empresa por empresa”, acrescentou, observando que há produtos isentos dentro de um mesmo setor exportador.
No Centro-Oeste, o alcance das tarifas é menor e atinge setores menos dependentes dos EUA. Em Mato Grosso do Sul, por exemplo, cerca de 50% das exportações, sendo US$ 332 milhões, serão afetadas, com destaque para carnes e couro (87% do total tarifado). A China, no entanto, responde por 32,7% das vendas externas do estado.
A análise utilizou a classificação do Sistema Harmonizado de seis dígitos, código internacional criado pela Organização Mundial das Alfândegas para identificar produtos no comércio exterior. O cálculo é uma estimativa, já que dentro de uma mesma categoria podem coexistir itens tarifados e isentos. O Mdic informou que não há tabela que compatibilize integralmente as classificações comerciais dos EUA (HTSUS) e do Brasil (NCM).