Um ano após operação em Goiás, militares do Tocantins são alvo de inquérito por suposta fraude fiscal do césio-137

14 outubro 2025 às 11h11

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O Ministério Público do Tocantins (MPTO) instaurou o Inquérito Civil na última sexta-feira, 10, para apurar um suposto esquema de fraudes em isenções tributárias concedidas a militares da reserva, entre eles ex-comandantes da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros, com base em laudos médicos falsos que alegavam contaminação por césio-137, o elemento radioativo envolvido no acidente ocorrido em Goiânia, em 1987.
A investigação do MPTO começou em 19 de novembro de 2024, após reportagens do Jornal Opção Tocantins, publicadas em outubro e novembro do mesmo ano, que revelaram que oficiais de alta patente do Estado teriam obtido isenção total do imposto de renda e outros benefícios previdenciários, alegando doenças graves supostamente resultantes da exposição ao material radioativo. Segundo o inquérito a que a reportagem teve acesso, os militares nunca tiveram contato com o césio-137, nem participaram de missões de socorro na capital goiana.
O caso veio à tona após a Operação “Fraude Radioativa”, deflagrada pela Polícia Civil de Goiás em setembro de 2024, que apontou 134 pessoas envolvidas, incluindo militares de Goiás e do Tocantins, e estimou prejuízos ao erário de mais de R$ 20 milhões em restituições de imposto de renda e processos suspensos.
Conforme o inquérito da Polícia Civil de Goiás, entre os suspeitos no Tocantins estão cinco ex-coroneis, incluindo Admivair Silva Borges (ex-comandante-geral do Corpo de Bombeiros), Marielton Francisco dos Santos e José Tavares de Oliveira (ex-comandantes-gerais da PM), José Anísio Pereira Braga (ex-corregedor-geral da PM) e Edivan Ribeiro de Souza (ex-comandante da 1ª Companhia Independente da PM e ex-corregedor-geral do Detran).
O levantamento do Jornal Opção Tocantins indicou que, considerando a aposentadoria de cada coronel da reserva, que atualmente é de R$ 41.408,34, os valores recebidos indevidamente podem ter ultrapassado R$ 5 milhões em outubro de 2024, incluindo restituições retroativas desde 2010, com cada militar recebendo aproximadamente R$ 6.382,09 por mês em benefícios que não teriam direito.
Medidas
A portaria de instauração do MPTO, assinada em 10 de outubro de 2025 pelo promotor Rodrigo Grisi Nunes, titular da 22ª Promotoria de Justiça de Palmas, cita “fatos noticiados” como origem da investigação. O inquérito busca identificar o dano causado ao erário estadual e responsabilizar os beneficiários e eventuais servidores que tenham atuado na liberação das isenções.
Foram solicitadas informações à Procuradoria-Geral do Estado (PGE), ao Instituto de Gestão Previdenciária do Tocantins (Igeprev), à Polícia Militar e ao Corpo de Bombeiros, incluindo: valor total do prejuízo; lista dos militares beneficiados; valores incorporados indevidamente; existência de sindicâncias ou ações de ressarcimento; dados sobre repasses ou compensações à União. Os órgãos têm até dez dias para dar retorno ao MPTO.
A apuração do MP teve início em 19 de novembro de 2024, com registro de uma “notícia de fato” pelo promotor Vinícius de Oliveira e Silva, e foi reautuado em abril de 2025 antes de ser convertido em inquérito civil. A apuração também investiga improbidade administrativa, falsidade ideológica e enriquecimento ilícito, além de possíveis danos materiais aos cofres públicos, podendo resultar na devolução dos valores e inelegibilidade dos envolvidos.
O acidente
O acidente com o césio-137, em setembro de 1987, causou quatro mortes confirmadas e contaminação de centenas de pessoas. As isenções de imposto de renda são destinadas exclusivamente às vítimas diretas, tornando o suposto esquema de fraudes especialmente grave do ponto de vista moral e jurídico.
Direito de resposta
No ano passado, o Igeprev-TO afirmou que a restituição do imposto de renda é feita pela Receita Federal, não causando prejuízo ao instituto. O órgão explicou que a isenção de IR é concedida mediante avaliação da Junta Médica Oficial do Estado ou por decisão judicial, como ocorreu com os militares investigados, e que não cabe ao Igeprev investigar eventual fraude nessas decisões. O Jornal Opção chegou a procurar a Receita para comentar o caso, mas não teve retorno.
Em outubro do ano passado, o MPTO, o Corpo de Bombeiros e a Polícia Militar ainda não haviam iniciado investigações concretas sobre o caso. A defesa dos militares citados não foi localizada.