Universidade da Maturidade se consolida como referência nacional em envelhecimento ativo
26 outubro 2025 às 10h00

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Criada em 2006 pela professora doutora Neila Osório, a Universidade da Maturidade (UMA), projeto de extensão da Universidade Federal do Tocantins (UFT), chegou aos 20 anos com mais de 7.500 idosos formados. Atualmente, o programa atende 1.500 pessoas em polos espalhados pelo Tocantins e em outros estados, como Mato Grosso do Sul e Bahia, além de uma unidade internacional em Portugal.
Reconhecida desde 2011 pela Fundação Banco do Brasil como uma tecnologia social, a UMA desenvolveu um método pioneiro que promove o envelhecimento ativo, a inclusão social e a qualidade de vida. Mais do que um espaço de aprendizado, o projeto se tornou uma experiência de transformação pessoal e coletiva, mostrando que nunca é tarde para estudar, conviver e sonhar.
A proposta é oferecer educação acessível a qualquer pessoa com vontade de aprender, independentemente da idade ou formação escolar. O impacto vai muito além do ambiente acadêmico: a UMA combate o isolamento e o preconceito, incentiva a participação comunitária e fortalece a cidadania por meio de debates sobre direitos, saúde, cultura e políticas públicas.
Com um modelo replicável, a iniciativa pode ser adotada por outras instituições. No Tocantins, os polos funcionam em parceria com prefeituras municipais. Fora do estado, são mantidos em cooperação com universidades e, no caso de Portugal, com a Associação Nacional de Gerontologia Social.

Entre os diversos reconhecimentos nacionais e internacionais, estão o Prêmio Darcy Ribeiro de Educação, a Comenda de Mérito da Universidade Rey Juan Carlos (Espanha) e da Associação Nacional de Gerontologia Social (Anges), de Portugal. A UMA também recebeu o título de Embaixadora da Paz Internacional (Cercle Universel des Ambassadeurs de la Paix – França), o Prêmio de Extensão Universitária da UFT, além de homenagens da OAB/MS e da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da UFT. A atuação do projeto já rendeu ainda títulos de cidadania tocantinense e de outros municípios onde está presente.
Hoje, a UMA mantém polos em Palmas, Tocantinópolis, Porto Nacional, Araguaína, Dianópolis, Paraíso do Tocantins, Monte do Carmo, Tocantínia (com polos Indígena, Rural e Urbano), Palmeirópolis, São Sebastião, Barreiras (BA), Campo Grande (MS), Dourados (MS) e Soure (Coimbra, Portugal).
O projeto é mantido com recursos de emendas parlamentares destinadas à UFT e administradas pela Fundação de Apoio Científico e Tecnológico do Tocantins (Fapto).
A UMA é um movimento que promove educação intergeracional. Idosos tornam-se protagonistas e multiplicadores de conhecimento, compartilhando saberes com outras gerações, fortalecendo laços comunitários e reduzindo o isolamento social.
Ao integrar educação, saúde e cultura, a Universidade da Maturidade prova que o envelhecimento pode ser vivido com propósito, dignidade e alegria, uma trajetória que transformou o Tocantins em referência nacional e internacional em tecnologias sociais voltadas para a longevidade.
Aprender e viver aos 73 anos

Aos 73 anos, Cecília Maria de Oliveira Silva carrega a vitalidade de quem sempre teve a sala de aula como segunda casa. Professora de geografia e pedagogia, ela trabalhou anos na educação básica, passou pela coordenação pedagógica e, depois de se aposentar, voltou a ser aluna agora na UMA.“É muito gratificante retornar, sabe? Os colegas de sala são quase todos da mesma idade, e os professores são mais novos. Eles têm o conhecimento de hoje pra nos passar, e a gente tem o de antes. É uma troca muito boa”, conta.
Ela diz que as aulas a fazem se sentir atualizada e ativa. “Na minha época nem existia celular. Hoje a gente aprende a mexer, a identificar o que é fake, o que é verdade, até como denunciar se clonarem nosso número. Também aprendemos sobre inteligência artificial, é ótimo saber o que pode nos ajudar e o que pode nos prejudicar.”
Cecília chegou à UMA depois de um momento difícil. “Eu fiquei viúva depois de 46 anos de casamento. Foi de repente. Fiquei muito abalada. Minha filha me dizia que eu precisava sair de casa, fazer alguma atividade. Foi quando ela me trouxe aqui pra UMA. E foi a melhor coisa que eu fiz.”
Natural do interior de São Paulo, ela veio morar em Palmas nos anos 2000, depois de uma longa trajetória como professora. Trabalhou em escolas municipais, na Secretaria de Educação e até participou de projetos de formação de professores no Jalapão. “Ficamos 18 dias acampados com os professores, bem na época que o Jalapão começou a ser descoberto. Foi uma experiência maravilhosa.”
Aposentada desde 2019, ela diz que reencontrou na UMA um novo sentido de pertencimento. “Aqui a gente é muito bem acolhida. Logo que cheguei, os colegas me receberam com abraços e cantando. Faço parte do grupo de dança, do coral e também do grupo intergeracional com as crianças. Eu costumo brincar que não sou fermento, mas tô em todos os bolos.”
O curso, ela diz, ajudou a superar o luto e a viver com mais leveza. “Nós temos aula sobre o luto, mas não é pra ficar chorando. É pra entender o que sentimos e aprender a lidar. É tudo trabalhado de forma leve. A gente tem psicólogos, professores que nos ouvem. Isso ajuda muito.”
Sorrindo, ela resume o que aprendeu desde que entrou na UMA: “Melhorou tudo. Minha cabeça, meu humor, minha vontade de viver. Deus tá me dando saúde, e eu quero continuar fazendo o bem. A gente aprende com os jovens, e eles aprendem com a gente. O que eu digo é: vivam, mas vivam com amor e respeito. Tendo respeito, o amor vem junto.”
Aluna número 1

A pedagoga e artista plástica Gilda Gomes, de 86 anos, é natural de Aracaju (SE) e vive no norte de Goiás, hoje Tocantins, há 43 anos, desde antes da criação do estado. Mãe de sete filhos, avó de 19 netos, bisavó de 24 e tataravó de um, ela é uma das figuras mais queridas e simbólicas da Universidade da Maturidade (UMA).
Dona Gilda foi a primeira aluna e co-criadora do projeto, que nasceu em Palmas em 2006. “Vemos o crescimento da UMA com bastante alegria, porque além do Tocantins, nos expandimos para outros estados do Brasil e até para outros países”, conta com orgulho.
Para ela, a iniciativa transformou a vida de milhares de idosos: “É uma iniciativa maravilhosa, porque os idosos viviam na rede ou na cama, sem sair de casa para lugar nenhum. Agora participam com alegria, dançam, viajam, socializam. A UMA é isso também: integração e movimento.”
Viúva do saudoso José Gomes Sobrinho, Dona Gilda é mãe de Acácia, Luis, Hiram, José Roberto, André, Paulinho e Eduardo Gomes, este último, senador pelo Tocantins. Ela se orgulha do envolvimento da família no projeto: “Todos os meus filhos são apaixonados pela UMA, porque ela tirou os idosos de dentro de casa, do sedentarismo.”
Entusiasta da causa da maturidade, Dona Gilda é reconhecida como símbolo de luta por uma velhice ativa e com qualidade de vida. Mesmo aos 86 anos, mantém uma rotina intensa, que inclui musculação e exercícios de fortalecimento, sempre acompanhada por profissionais.
UMA enquanto família

Aos 92 anos, o baiano José Leão, natural de Riacho de Santana, vive há décadas no Tocantins e carrega uma história de trabalho e superação. Depois de trabalhar na roça na Bahia, ele se mudou para o interior de São Paulo, onde foi diarista e plantador de algodão. Mais tarde, voltou para o Norte de Minas, em Manga, e, em 1959, veio sozinho para o então norte goiano, atraído pelas oportunidades de trabalho.
“Meu cunhado dizia que aqui era bom pra trabalhar. Deixei minha esposa com o primeiro filho e vim só. Depois busquei ela, e ficamos por aqui”, lembra.
Nos anos seguintes, passou por Mutunópolis (GO) e Colinas do Tocantins, onde trabalhou no comércio e criou os filhos. Foi nesse período que conheceu José Siqueira Campos, ainda vereador, com quem manteve amizade.
Já em Palmas, José Leão veio morar com a filha caçula depois da morte da esposa, em 2017. “Ela descobriu a UMA e me matriculou. Eu vi, gostei. A UMA pra mim é outra família, graças a Deus.”
Pai de seis filhos, avô de 15 e bisavô de 18, ele está na Universidade da Maturidade (UMA) há três anos. Participa de aulas, caminhadas, atividades físicas e passeios. “No começo eu não estava achando muito bom, mas depois a gente se sentiu acolhido. É bom para levantar a autoestima. Aqui a gente participa de aulas, caminhadas, turismo. Eu faço atividade física lá fora também, na academia. E a UMA ajuda na alimentação, cuidar da saúde, interagir com as pessoas, respeito, amor com os colegas. A UMA é uma mãe nesse sentido.”
E completa com firmeza: “Não vou encerrar. Vou continuar na UMA enquanto vida tiver.”
Referência em educação

O Tocantins vive um processo acelerado de envelhecimento populacional, segundo projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) baseadas no Censo Demográfico de 2022. A taxa de fecundidade caiu de 2,8 filhos por mulher entre 2000 e 2015 para 2,0, com expectativa de atingir 1,5 filho por mulher em 2039. Paralelamente, a idade média da população deve subir de 33,3 anos para 47,5 anos no mesmo período, e, em 2070, 37,8% dos habitantes serão idosos.
Nesse contexto, a UMA surge como uma iniciativa estratégica para promover o envelhecimento ativo e inclusão social. Criada para oferecer educação não formalizada a pessoas acima de 50 anos, a UMA já formou mais de 7.500 alunos em seu curso que dura 18 meses, conferindo o título de educador político social em gerontologia. “A UMA é um curso oferecido gratuitamente, sem necessidade de saber ler ou escrever, e busca promover educação e qualidade de vida para pessoas idosas”, explica Luiz Sinésio Silva Neto, coordenador da instituição.
A Universidade nasceu da experiência de mais de 40 anos da professora Neila Barbosa Osório na área de gerontologia social. “Quando ela trouxe essa experiência para o Tocantins, enfrentamos muitas barreiras. Muitas pessoas não acreditavam que seria possível oferecer educação para idosos de forma pública e gratuita, e havia preconceitos sobre envelhecimento”, conta Luiz.
O projeto preenche lacunas importantes na sociedade, ao transformar a visão sobre envelhecimento e mostrar que a velhice pode ser vivida com dignidade, autonomia e protagonismo. “Sempre se pensou em políticas públicas para idosos focadas em saúde ou assistência social. A UMA traz a educação como ferramenta essencial para qualidade de vida, cidadania e oportunidades”, afirma o coordenador.
Hoje, a UMA tem reconhecimento internacional, com polos em Portugal e parcerias em países como França e República Tcheca. O modelo educacional se diferencia das universidades abertas da terceira idade: “Não oferecemos apenas cursos livres, mas um sistema curricular baseado em tecnologia social, desenvolvido com as pessoas e para atender às necessidades educacionais e sociais de cada comunidade”, explica Luiz.
O currículo prioriza o envelhecimento ativo e sustentável, abordando saúde, educação, inclusão digital e finanças pessoais. “Temos cursos sobre diabetes, hipertensão, uso seguro da internet, pagamentos digitais e golpes financeiros, sempre com linguagem acessível e prática para os alunos”, detalha Luiz.
Quanto à sustentabilidade financeira, a UMA depende principalmente de emendas parlamentares, destacando o apoio do senador Eduardo Gomes e dos deputados federais Ricardo Ayres e Carlos Gaguim. “Adaptamos nosso orçamento à realidade e buscamos parcerias para garantir a continuidade do projeto”, explica.
Para municípios interessados em implantar um polo, Luiz destaca que o processo começa com uma manifestação de interesse junto à instituição, seguida de levantamento das necessidades locais e assinatura de um termo de cooperação técnica, garantindo infraestrutura, recursos humanos e chamadas para idosos. A universidade entra com toda a parte pedagógica, capacitação e monitoramento.
Um dos principais impactos da UMA é o resgate do protagonismo das pessoas idosas. “A universidade ajuda os alunos a reescreverem seus projetos de vida, mantendo autonomia e participação ativa na sociedade. Como diz uma de nossas alunas, ‘saia da plateia, suba no palco, seja ator da sua própria vida’”, finaliza Luiz.
