Os últimos dias expuseram de forma cristalina uma fragilidade do governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) que não aparecia nas pesquisas de popularidade: a dificuldade de manter coesa a base aliada. O vazamento de áudios da senadora Dorinha Seabra (União Brasil), em que ela acusa o governador de ter mentido ao negar apoio explícito ao presidente da Assembleia, Amélio Cayres, revelou uma verdade incômoda no Palácio: a sucessão está em curso, mas o jogo ainda é de desconfiança e ressentimento.

O episódio fragilizou Dorinha, que se viu exposta em desabafo a alguém de confiança, confiança que, ao que tudo indica, foi mal depositada. Mas também colocou em xeque o próprio governador, que sustenta um discurso de neutralidade mesmo quando os sinais apontam para outra direção. Nesse ambiente de incerteza, nomes circulam em mais de um cenário. É justamente aí que aparece Eduardo Gomes (PL). Embora lembrado pelo Palácio como peça de sua futura chapa em 2026, ele foi citado pela senadora como opção em sua própria costura política. Se Gomes estivesse de fato garantido no grupo governista, dificilmente apareceria como alternativa em campo adversário.

Wanderlei age como se a popularidade fosse um gênio da lâmpada capaz de atender todos os desejos. Com 80% de aprovação segundo a Paraná Pesquisas, o governador tenta transferir esse capital a Amélio, mas o movimento não tem sido imediato. A teoria de que votos acompanham automaticamente não se confirma na prática: o “Amélio do governador” ainda não conseguiu transformar o prestígio de Wanderlei em números próprios.

O governador parecia esticar a corda ao limite antes de tomar qualquer decisão sobre a sucessão, mas os áudios da senadora, líder até aqui em todas as pesquisas eleitorais, acabaram por rompê-la. Ainda assim, aliados consideram justificável o desabafo da senadora, uma vez que sua posição de destaque nas pesquisas não se refletiu na confiança ou na admiração de Wanderlei, que acabou por preteri-la. O que se desenha é que a candidatura de Amélio surge como alternativa mais confortável ao governador, seja pela expectativa de exercer maior influência em uma eventual gestão, seja pela relação de amizade que os aproxima.

No centro desse labirinto político está a indefinição do próprio futuro de Barbosa. Ao afirmar que não deixará o cargo em abril de 2026 para disputar o Senado, o governador contraria a lógica do Republicanos em nível nacional, que abre mão de uma vaga competitiva em Brasília. Mais do que isso: impede a ascensão do vice, Laurez Moreira (PDT), hoje adversário interno. A decisão tem efeito cascata. Sem espaço aberto pelo governador, outras figuras também ficam travadas, entre elas sua esposa, Karynne Sotero, que poderia tentar vaga na Câmara.

Paralelamente, a relação com a deputada Janad Valcari (PL), antes aliada, azedou de vez. Ao classificá-la como indesejada, o governador acabou fortalecendo justamente o campo que tachava de fraco. Se a senadora Dorinha encabeçar o campo adversário e arrastar Gomes, o governo fica sem nenhum senador, já que Irajá Abreu (PSD) já é oposição.

O resultado é um cenário em que a base governista se desgasta em disputas internas, enquanto a oposição, que até pouco tempo parecia dispersa, pode ganhar densidade. O Palácio aposta em Amélio como candidato “natural”, mas naturalidade política não se decreta nem se garante apenas pela amizade com o governador. Até abril, Wanderlei ainda terá de lidar com prefeitos e líderes que já se movimentam de forma autônoma, fechando compromissos que independem de seu comando.

Essa equação revela o paradoxo de Wanderlei: um líder que ostenta índices de aprovação invejáveis, mas que não consegue alinhar senadora, deputados e prefeitos em torno de um projeto único. Popularidade, como se percebe, não garante submissão automática, especialmente de lideranças que têm vida própria. A ironia é que, com 80% de aprovação, o governador parece cada vez mais distante de exercer a liderança política que os números indicam. Popularidade nas ruas, ao contrário do que se supõe, não é sinônimo de autoridade irrestrita.