A Polícia Federal deve investigar pelo menos 26 emendas Pix parlamentares destinadas ao Tocantins que permanecem sem plano de trabalho cadastrado no sistema Transferegov.br, do Ministério da Gestão e Inovação em Serviçõs Públicos, entre 2020 e 2024. O montante bloqueado é de aproximadamente R$ 4,86 milhões, segundo dados oficiais levantados pela reportagem do Jornal Opção Tocantins.

A apuração ocorre após decisão do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), em 24 de agosto, que determinou ao Tribunal de Contas da União (TCU) o detalhamento de 964 casos em todo o Brasil e o repasse das informações à PF. O valor nacional das pendências chega a R$ 694,7 milhões.

No Tocantins, os registros incluem repasses indicados por parlamentares como Eli Borges (PL), Carlos Gaguim (UB), Kátia Abreu e Ricardo Ayres (Republicanos). Também há um plano de 2021 de autoria do deputado mineiro Reginaldo Lopes (PT), destinado ao município de Riachinho. As quantias variam de R$ 50 mil a R$ 500 mil. O ano de 2022, período da corrida eleitoral, concentrou o maior valor de emendas sem plano de trabalho cadastrado, totalizando R$ 4,46 milhões, sendo a maior parte destinada pelo deputado federal Eli Borges: R$ 1,1 milhão em investimento e R$ 1,3 milhão em custeio.

O deputado federal Carlos Gaguim aparece em segundo lugar, com emendas Pix que não tiveram plano de trabalho cadastrado, num total de R$ 1,7 milhão. Todas essas transferências especiais estão na situação “impedido”, que ocorre quando o ente beneficiado não apresenta o plano de trabalho, etapa obrigatória para liberar os recursos.

A decisão do STF também estabeleceu que as emendas coletivas deverão ter conta bancária específica e que bancos federais restrinjam movimentações a contas de execução, eliminando contas de passagem ou saques diretos.

No ano passado, o STF estabeleceu que as emendas Pix devem obrigatoriamente contar com um plano de trabalho. Em abril, o ministro Flávio Dino determinou que estados e municípios prestassem contas ao governo federal, em até 90 dias, sobre 6.247 planos de trabalho ainda não cadastrados para utilização dos recursos previstos. Na ocasião, os dados foram fornecidos ao Supremo pelo TCU. Na decisão divulgada no último dia 24 de agosto, Dino mencionou um novo relatório do TCU, datado de 30 de julho, que aponta a existência de 964 planos de trabalho pendentes de cadastro, afirmando que “remanesce situação de parcial descumprimento de decisão judicial”.

Transferência Especial

Entre 2020 e 2024, parlamentares tocantinenses indicaram 1.119 emendas via Transferência Especial, conhecidas como “emendas pix”, totalizando R$ 551,6 milhões, dos quais R$ 546,8 milhões já foram empenhados e liberados. A maior parte dos recursos foi destinada a urbanismo (711 indicações), agricultura (78), educação (46) e desporto e lazer (44), seguidos por saúde (38), assistência social (31), cultura (30) e transporte (26), evidenciando o foco em infraestrutura e políticas públicas locais.

O ano de 2023 registrou o maior volume de emendas, com R$ 200 milhões, seguido por 2024 (R$ 179 milhões) e 2022 (R$ 90 milhões). Esses números reforçam o peso das transferências especiais no orçamento estadual e a relevância de acompanhar a execução dos planos de trabalho, etapa obrigatória para que os recursos cheguem efetivamente aos municípios e sejam devidamente fiscalizados.

Cidades e valores por parlamentar no Tocantins sem plano de trabalho cadastrado

Deputado Ricardo Ayres (2024)

São Bento do Tocantins – custeio de R$ 250.000,00 (situação: impedido, plano não cadastrado)

Deputado Carlos Henrique Gaguim (2022–2023)

Alvorada – R$ 100.000,00 (custeio)

Cariri – R$ 350.000,00 (investimento)

Itaporã do Tocantins – R$ 219.677,00 (investimento, valor aparece em registros em dois planos diferentes)

Aparecida do Rio Negro – R$ 100.000,00 (investimento, valor aparece em registros em dois planos diferentes)

Monte Santo do Tocantins – R$ 100.000,00 (investimento, valor aparece em registros em dois planos diferentes)

Jaú do Tocantins – R$ 150.000,00 (investimento, valor aparece em registros em dois planos diferentes)

Lajeado – R$ 100.000,00 (investimento, valor aparece em registros em dois planos diferentes)

Deputado Eli Borges (2022)

Dois Irmãos do Tocantins – R$ 200.000,00 (custeio)

Goiatins – R$ 200.000,00 (custeio) — aparecem registros em dois planos diferentes

Ponte Alta do Tocantins – R$ 200.000,00 (custeio, também consta em mais de uma entrada)

Rio Sono – R$ 120.000,00 (custeio e investimento)

Praia Norte – R$ 200.000,00 (custeio)

Sandolândia – R$ 150.000,00 (custeio)

Tocantínia – R$ 500.000,00 (investimento, também consta em mais de uma entrada)

Senadora Kátia Abreu (2022 & 2021)

Nova Olinda – R$ 150.000,00 (investimento)

Formoso do Araguaia – R$ 150.000,00 (investimento)

Deputado Reginaldo Lopes (2021)

Riachinho – R$ 50.000,00 (investimento

O que dizem os políticos

Procurados pela reportagem, Kátia Abreu, Eli Borges e Carlos Gaguim não se manifestaram. Já o deputado Ricardo Ayres explicou que as emendas parlamentares via transferência especial têm o objetivo de levar investimentos diretos aos municípios, mas a responsabilidade de cadastrar o plano de trabalho no sistema é exclusiva da prefeitura beneficiada.

“Nosso compromisso como parlamentar foi indicar os recursos de acordo com as necessidades locais, cumprindo todas as etapas que cabem ao mandato. Nesse processo, o mandato, através da assessoria de orçamento, mantém contato constante com os municípios, especialmente com os gestores de orçamento de cada cidade, para que os planos de trabalho sejam apresentados dentro do prazo legal; no entanto, por circunstâncias e questões distintas de cada município, alguns não conseguem cumprir na data correta”, disse por meio de nota.

O parlamentar afirma que foi o que ocorreu em São Bento do Tocantins. “Diante da ausência de apresentação do plano de trabalho, optamos pela substituição da emenda: remanejamos a transferência especial para outro município e, em contrapartida, destinamos o mesmo valor diretamente para a área da saúde, garantindo que os recursos fossem aplicados em benefício da população”, pontou.

Ayres ainda ressaltou que defende uma maior orientação técnica aos municípios por parte do Governo Federal, além de mais simplicidade no processo de cadastramento. Ele considera essencial que os órgãos de controle tenham acesso a todas as etapas, assegurando que os recursos sejam aplicados da forma como a legislação determina, com papel fundamental das câmaras de vereadores na fiscalização local e atuação efetiva dos tribunais de contas dos estados no acompanhamento e avaliação da correta destinação dos valores.

O deputado também enviou o anexo com o ofício que pedia a exclusão da emenda direcionada ao município. Documento aqui.

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