A COP30, que será realizada em novembro, em Belém, chega cercada por expectativas e contradições. O evento, que promete colocar a Amazônia no centro do debate climático global, pode ser lembrado tanto como um marco de engajamento da sociedade civil quanto como mais uma vitrine do que o cientista político Breno Bringel chama de “cúpula de negócios”.

Em entrevista ao Intercept Brasil, Bringel afirma que “as COPs estão se convertendo cada vez mais em cúpulas de negócios”. O pesquisador alerta para o avanço do que chama de colonialismo verde — a apropriação das pautas ambientais por corporações, governos e fundos de investimento que buscam transformar o colapso do planeta em oportunidade de lucro. “Nunca se fala em deixar o petróleo no subsolo”, observa. “Nunca se fala nas soluções reais propostas pelos povos e pelas comunidades.”

Segundo Bringel, a linguagem da descarbonização e da transição energética tem sido usada como uma nova forma de legitimar velhas práticas de exploração. O discurso do “crescimento verde” mascara desigualdades, transfere os custos ambientais ao Sul Global e transforma até o carbono em mercadoria. “Por trás de tudo isso estão as empresas energéticas, de tecnologia, os fundos de investimento e os bancos multilaterais”, afirma.

Essa crítica é urgente. O Brasil, anfitrião da COP30, corre o risco de ser palco de um espetáculo de compromissos simbólicos, enquanto o desmatamento, o garimpo e a violência ambiental seguem ameaçando comunidades inteiras. A Amazônia, mais uma vez, pode ser apresentada ao mundo como paisagem e não como sujeito político.

Mas há, também, outro caminho em disputa. Como lembra Joaquim Belo, líder extrativista e enviado especial da sociedade civil amazônica para a COP30, o evento tem mobilizado as bases e despertado debates inéditos dentro da própria região. “Os Estados estão debatendo, as universidades estão debatendo, as escolas estão debatendo”, diz. “Isso é um legado muito interessante, que faz com que a gente saia de uma COP30 para além dela.”

Belo representa a voz dos que vivem e protegem a floresta — povos indígenas, comunidades extrativistas e quilombolas —, que há décadas defendem o território e o clima com pouca visibilidade e quase nenhum apoio financeiro. Para ele, a COP30 será uma oportunidade de mostrar que “as populações extrativistas e os povos indígenas são parte da solução”.

Essas duas perspectivas — a denúncia de Breno Bringel e a esperança de Joaquim Belo — sintetizam o dilema central da COP30. O risco é que Belém se transforme num palco de anúncios vazios, onde o mercado dita as regras e o planeta vira ativo financeiro. A oportunidade é que a Amazônia, pela primeira vez, imponha sua própria agenda, mostrando ao mundo que justiça climática e justiça social são indissociáveis.

Se a COP30 quiser ser mais do que um evento de marketing, terá de ouvir quem há muito tempo faz a transição na prática: as comunidades que mantêm a floresta em pé. São elas que dão concretude ao que Breno Bringel chama de “diagnóstico social” da crise ecológica — aquele que não cabe em planilhas nem em métricas financeiras.

Belém pode ser, sim, o epicentro de uma nova consciência global. Mas isso só acontecerá se o Brasil e o mundo tiverem coragem de encarar a pergunta que as COPs evitam há décadas: quem lucra com o colapso climático e quem paga por ele?