“Fazer morrer e não deixar viver”, legado de Charlie Kirk é o da morte do discurso

21 setembro 2025 às 14h45

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Por: João Reynol
Os dias seguintes após o assassinato quase que televisionado do apresentador e ativista político de direita Charlie Kirk devem ser lembrados como o momento que marcou a morte do discurso nos Estados Unidos da América (EUA). Pela primeira vez na história moderna norte-americana, um assassinato político é usado por ambos lados do espectro como combustível para atiçar as chamas da opinião pública.
Este movimento, que se iniciou em tentativas de imputar a alienação política do lado opositor no atirador Tyler Robinson, de 22 anos, é um sintoma de uma sociedade ao extremo da polarização, que se preocupada em ganhar pontos em uma conversa, ao invés de chegar num consenso para o melhor para a sociedade. Neste cenário, nem mesmo um assassinato rompe a barreira do “nós” e “eles”.
Em um momento que deveria ser de conciliação e tranquilização, o presidente dos EUA Donald Trump preferiu atiçar ainda mais o fogo em declarar guerra contra a esquerda “radical e violenta”, sendo a primeira ordem executiva após o atentado de classificar o movimento Antifacista (Antifa), tipicamente da esquerda, como uma organização terrorista.
O presidente norte-americano alega que a esquerda “ceifou muitas vidas” e corresponde “a maioria dos casos de violência política”, contudo, a verdade é outra. Um estudo do Instituto Cato encontrou — com base em mais de 3000 casos nos últimos vinte anos — que as mortes ligadas por violência política nos EUA ocorrem seis vezes mais devido a grupos de direita do que por grupos de esquerda.
A Antifa, contudo, entrou na mira do republicano após relatos de que Robinson era supostamente parte da organização, mesmo não tendo vínculo comprovado além das inscrições dos cartuchos utilizados no rifle. Do outro lado, movimentos liberais apontam que o atirador era um republicano conservador que não concordava com as opiniões políticas do movimento Make America Great Again (Maga, Faça a América grande novamente em português) devido os pais serem republicanos, mesmo que a relação entre ambos não é direta.
Neste cenário, nem mesmo a verdade sobreviveu ao ser exorcizada do campo da dialética. Ao longo da história, movimentos sociais inflamatórios foram criados e usados por ditadores como meio de manipulação social através da semeação do ódio, como o antissemitismo de Hitler, e mais recentemente, o antiesquerdismo de Trump e Bolsonaro, criado pelo marqueteiro Steve Bannon.
Se para Michel Foucault, o poder de um Estado moderno está em “fazer viver e deixar morrer” (o Estado garante a vida, mas deixar morrer as minorias e grupos marginalizados), então o poder do Estado fascista está em “fazer morrer e não deixar viver”.
Enquanto ambos estão em uma luta interminável, a administração de Trump continua a prender imigrantes e norte-americanos sem justa-causa e veta, pela sexta vez seguida, pedido de cessar-fogo entre Israel e Palestina na cúpula da Organização das Nações Unidas (ONU).
A relevância deste cenário exterior no campo brasileiro se deve a conexão intrínseca entre os movimentos políticos e sociais, como o movimento MAGA e o Bolsonarismos. Além disso, o espalhamento da história moderna entre os dois países, sobretudo entre a presidência de Trump e Bolsonaro e a invasão do Capitólio e da Praça dos Poderes, também acende um alerta para como o bolsonarismo e a esquerda brasileira podem caminhar para um lugar perigoso em 2026, similar ao Tio Sam.