O recente “tarifaço” imposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao Brasil, com sobretaxas que chegam a 50% sobre produtos brasileiros, pode acabar se revelando um verdadeiro “tiro no pé” para os bolsonaristas. Uma parcela significativa dos aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) celebrou a medida, chegando a interpretá-la como uma demonstração de “solidariedade” diante da atual situação política do país.

Por exemplo, o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) classificou a medida como um “remédio amargo” e a defendeu como uma estratégia para avançar pautas de interesse do bolsonarismo, como a anistia dos condenados pelos atos de 8 de janeiro de 2023. Contudo, sua posição gerou forte reação negativa tanto no meio político quanto nas redes sociais, recebendo duras críticas. Em entrevista ao Estadão nesta segunda-feira, 14, o Eduardo Bolsonaro afirmou que abrirá mão do mandato e não retornará enquanto Alexandre de Moraes for ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

Eduardo chegou a associar a anistia dos condenados como o primeiro passo para reverter o aumento das tarifas sobre produtos brasileiros. Ao mesmo tempo, em publicações nas redes sociais, ele relacionou o tarifaço ao ministro Alexandre de Moraes. Segundo o deputado, retirar as sobretaxas poderia resultar na manutenção da prisão do seu pai, Jair Bolsonaro, no aumento da censura nas redes sociais e na permanência da esquerda no poder após as eleições de 2026.

“Qualquer tentativa de acordo sem um primeiro passo do regime em direção a uma democracia será interpretada como mais um acordo caracu, pois isso já foi exaustivamente tentado no passado — e os americanos também já conhecem essas histórias. (…) O único fato em favor da liberdade nos últimos anos foi a ação forte de Donald Trump, antes disso foi só censura, prisões e regulamentação das redes sociais – e acordos caracu. Não mais. Lamento, mas não dá para pedir ao presidente Trump — e nenhuma autoridade internacional minimamente decente — para tratar uma ditadura como se fosse uma democracia. Ou há uma anistia ampla, geral e irrestrita para começar ou bem-vindos à ‘Brazuela’”, afirmou em publicação na rede social X.

No entanto, o posicionamento dos bolsonaristas pode atingir o ponto da soberania nacional, mas isso pode se tornar um “tiro no pé”. Essa postura contraria interesses fundamentais do Brasil, sobretudo do agronegócio e da indústria, setores cruciais para a economia e que historicamente compõem a própria base eleitoral. Esses segmentos sofrerão diretamente com a redução das exportações, perda de competitividade e aumento dos custos produtivos — e já manifestam seu descontentamento com a política tarifária adotada.

Assim, o “tarifaço” acaba funcionando como um elemento de cisão dentro da própria base bolsonarista. Enquanto os radicais aplaudem Trump e alimentam a narrativa anti-Lula, a parcela pragmática do bolsonarismo se distancia, preocupada com os prejuízos econômicos e o desgaste político.

No campo político, o movimento pode até fortalecer o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que aproveita a situação para consolidar uma narrativa de defesa da soberania nacional e retaliação proporcional, atraindo o apoio de setores moderados e da maioria da opinião pública.

Ao mesmo tempo, a pauta da anistia pode enfrentar novas resistências após ser vinculada como condição para o fim do “tarifaço”. O uso desse tema como “moeda de troca” não agradou ao Congresso Nacional, conforme apontou o analista político da CNN, Pedro Venceslau. Com isso, uma votação que poderia ocorrer antes do recesso parlamentar agora corre o risco de ser adiada.

Em resumo, o “tarifaço” de Trump pode ser um tiro no pé para o bolsonarismo, aprofundando seu isolamento político. O problema é que, no meio desse jogo político, resta saber como ficará a situação do Brasil, que sofre os efeitos diretos dessa política comercial adotada pelos Estados Unidos.