Com a proximidade da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2025 (COP30), o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei 2.159/2021, que propõe mudanças no processo de licenciamento ambiental no país. A proposta, que agora será analisada pela Câmara dos Deputados, é apontada por especialistas como um dos maiores retrocessos das últimas décadas no campo ambiental, sendo apelidada de “PL da Devastação”. No Tocantins, a Coalizão Vozes do Tocantins por Justiça Climática manifesta preocupação com os possíveis impactos da medida, especialmente diante dos índices de desmatamento no estado.

De acordo com a Coalizão, o projeto propõe substituir grande parte do processo de licenciamento ambiental por um sistema digital autodeclaratório, denominado Licença por Adesão e Compromisso (LAC). O Ministério do Meio Ambiente e Mudanças do Clima (MMA) considera esse ponto um dos mais críticos do projeto. Com a nova regra, atividades com potencial de impacto poderão ser autorizadas sem estudos prévios ou avaliação técnica, inclusive em áreas como territórios indígenas, comunidades tradicionais e Unidades de Conservação. O texto também retira a obrigatoriedade de outorga para uso de recursos hídricos, o que, segundo a Coalizão, pode agravar situações como a do Rio Formoso, onde há relatos de escassez de água e conflitos relacionados ao uso do território.

Ainda conforme posicionamento do MMA, a proposta fere dispositivos da Constituição Federal que garantem o direito da população ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. O órgão destaca que a Carta Magna exige estudo prévio de impacto ambiental para obras ou atividades com potencial de dano e ressalta que o texto do PL viola o princípio da proibição do retrocesso ambiental, conceito que tem sido adotado pela jurisprudência brasileira.

Segundo dados do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), 90% das emissões de carbono no Tocantins estão associadas à agropecuária e à mudança no uso do solo, especialmente pelo avanço da produção de commodities agrícolas. A Coalizão alerta que a medida pode potencializar esse cenário, em um estado que enfrenta, além do desmatamento, o aumento do uso de agrotóxicos, conflitos fundiários e riscos à conservação de áreas protegidas, como as Unidades de Conservação, cujos planos de manejo ainda estão em discussão.

Apesar da redução do desmatamento na Amazônia, o Cerrado segue como o bioma mais afetado, pelo segundo ano consecutivo, conforme registros do MapBiomas. O Tocantins, que tem 87% de sua área no Cerrado, aparece entre os três estados com maior área desmatada no país. De acordo com a Coalizão, o PL 2.159/2021 pode agravar esse cenário ao permitir que atividades agropecuárias fiquem isentas de licenciamento ambiental quando registradas no Cadastro Ambiental Rural (CAR) ou no Programa de Regularização Ambiental (PRA), instrumentos que não avaliam impactos ambientais como contaminação do solo, uso intensivo de água e pressão sobre áreas de preservação.

A Coalizão Vozes do Tocantins por Justiça Climática argumenta que os benefícios do projeto atenderiam a interesses restritos, enquanto os impactos seriam sentidos amplamente pela sociedade. “Qualquer lucro será privado, mas os prejuízos – como falta de água, perda de biodiversidade e intensificação das mudanças climáticas – serão públicos e afetarão principalmente as comunidades mais vulneráveis”, declara a rede.

Diante do avanço da proposta, a articulação propõe que gestores estaduais e municipais reconheçam o contexto de crise climática e invistam em alternativas de desenvolvimento que não dependam da degradação dos ecossistemas. “É urgente pensar em soluções baseadas na natureza, que garantam qualidade de vida hoje sem comprometer o futuro das próximas gerações, temos um grande potencial turístico e de geração de renda a partir da diversidade do Cerrado”, concluem.

Mais informações sobre a proposta e as mobilizações contrárias podem ser acessadas em: pldadevastacao.org

Sobre a Coalizão Vozes do Tocantins por Justiça Climática
A rede atua desde 2022 no Tocantins em defesa da justiça climática. É formada por quinze organizações da sociedade civil com atuação em áreas como educação, sociobiodiversidade, direitos dos povos e comunidades tradicionais, além de movimentos sociais diversos.