Laurez Moreira (PSD) completa 90 dias no comando interino do Palácio Araguaia nesta quarta-feira, 3. O mandato encara três desafios simultâneos: ter governabilidade, responder à crise fiscal e política herdada e construir uma narrativa coerente com medidas concretas. Até aqui, a atuação combina acertos pontuais e contradições estruturais.

O governo abriu a gestão com um diagnóstico duro sobre a situação fiscal e administrativa do estado. O efeito apareceu de imediato: toda despesa subsequente virou alvo. A narrativa virou filtro universal de interpretação. Quando se anuncia colapso e, logo depois, se autorizam gastos, a credibilidade se desgasta. O problema não está no diagnóstico, e sim na ausência de critérios claros para decidir o que permanece e o que se corta.

A equipe atual apresentou um quadro de deterioração administrativa: gastos questionáveis, contratos caros, problemas na saúde e decisões do antecessor que, segundo o novo grupo, precisavam de revisão. O tom inicial elevou o nível de expectativa sobre coerência absoluta em cada passo. Assim, quando o estado fala em desequilíbrio fiscal e, em seguida, autoriza contratações, nomeações ou ajustes operacionais, o público reage. Não por existir erro, mas porque o discurso não acompanhou a complexidade da máquina. A gestão interina precisa recompor quadros, contratar serviços essenciais, manter operações aéreas e sustentar políticas mínimas, tarefas normais. O ruído nasce da formulação usada, não das decisões administrativas.

A comunicação entrou como gargalo. Não foi o grande fracasso, mas gerou ruído na forma de explicar medidas. O conteúdo não estava necessariamente equivocado; a narrativa escolhida não sustentou as nuances da prática. Austeridade não significa paralisia. O governo sabia disso. A população, não necessariamente. Essa distância criou uma sensação de contradição, algo evitável com explicações mais diretas, menos dramáticas e mais técnicas. Agora, com o período inicial superado, não há margem para repetição desse tropeço. A sociedade já entendeu o cenário e espera clareza sobre o próximo passo.

A interinidade cria mais de um paradoxo. Laurez entrega o que já estava pronto e conclui o que herdou. Isso não reduz nem amplia mérito; apenas coloca a gestão no ritmo natural de um governo temporário. Projetos novos, estruturantes, dificilmente sairão do papel até o fim dos 180 dias. A pergunta adequada não é “o que ele criou?”, e sim “como manteve e aprimorou o que já existia?”. O estado não pode parar, e não parou. Mas a ausência de uma assinatura própria já começa a pesar

O campo político concentra o limite mais concreto. O governo avançou ao trazer nomes com base municipalista e experiência de articulação, mas ainda enfrenta uma Assembleia rachada. A Casa de Leis não impede o governo de tocar a pauta administrativa, empréstimo passou, orçamento anda, nada ali está parado por birra institucional. O impasse é outro: a Casa continua dividida no tema que realmente importa para o futuro de Laurez, o processo de impeachment de Wanderlei Barbosa. Metade dos deputados mantém laços com o governador afastado ou prefere esperar o desfecho judicial antes de comprar briga. Há ainda o fator incômodo: alguns parlamentares também aparecem como alvos ou personagens laterais na mesma investigação que tirou Wanderlei do cargo. Isso pesa na hora de apertar o botão do “sim”.

Com 90 dias completados, o governo precisa de direção, não de justificativa. A troca de comando já foi absorvida. A equipe domina a máquina. As emergências mais urgentes foram controladas. O próximo período exige menos desculpa e mais definição.