Lula defende união global e ação científica contra desigualdades climáticas na abertura da COP30 em Belém
10 novembro 2025 às 16h25

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Com um apelo à união global no enfrentamento das desigualdades e à construção de uma agenda pautada na ciência para combater os efeitos da mudança do clima, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu oficialmente, nesta segunda-feira, 10, a 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP30), em Belém (PA).
“A emergência climática é uma crise de desigualdade. Ela aprofunda a lógica perversa que define quem é digno de viver e quem deve morrer”, afirmou Lula durante o discurso de abertura. “Mudar pela escolha nos dá a chance de um futuro que não é ditado pela tragédia. Devemos a nossos filhos e netos a oportunidade de viver em uma Terra onde seja possível sonhar”, afirmou Lula.
O presidente fez referência a desastres climáticos recentes, como o tornado que atingiu o município de Rio Bonito do Iguaçu, no Paraná, na última sexta-feira, 7, com ventos de até 330 km/h, para ilustrar que os impactos do aquecimento global já são perceptíveis.
“A mudança do clima já não é ameaça do futuro. É uma tragédia do presente. O furacão Melissa que fustigou o Caribe e o tornado que atingiu o Paraná deixaram vítimas fatais e um rastro de destruição. Das secas e incêndios na África e na Europa às enchentes na América do Sul e no Sudeste Asiático, o aumento da temperatura global espalha dor e devastação, especialmente entre as populações mais vulneráveis”, disse.
Lula afirmou que a COP30 será um marco de reafirmação dos compromissos firmados anteriormente e de fortalecimento das soluções baseadas na ciência. “A COP30 será a COP da verdade. Na era da desinformação, os obscurantistas rejeitam não só evidências da ciência, mas os progressos do multilateralismo. Eles controlam algoritmos, semeiam o ódio e espalham o medo. Atacam as instituições, a ciência e as universidades. É momento de impor uma nova derrota aos negacionistas.”
A cidade de Belém, que sedia o evento às margens do rio Guamá, recebe lideranças, negociadores, cientistas e representantes de povos de diversas partes do mundo para discutir o futuro do planeta.
Lula foi antecedido pelo ato de transmissão da presidência da COP ao embaixador André Corrêa do Lago, que recebeu o cargo de Mukhtar Babayev, do Azerbaijão, presidente da COP29. “Estamos reunidos aqui para tentar mudar as coisas. O ser humano é essencialmente bom, mas sabemos que é capaz de coisas terríveis, como a guerra, que, infelizmente, voltou a estar próxima de tantas pessoas”, afirmou Corrêa do Lago. “Mas, apesar dos retrocessos recentes, as condições de vida das populações em todo o mundo podem e devem continuar a melhorar. E a ciência, a educação, a cultura são o caminho que temos que seguir.”
Fortalecimento do multilateralismo
O diplomata destacou que o fortalecimento do multilateralismo é essencial para o avanço das políticas climáticas. “É definitivamente o caminho”, disse, lembrando o simbolismo da palavra “mutirão”, de origem indígena brasileira, como expressão da cooperação necessária entre as nações.
“No período de mobilização, durante o ano de preparação da COP, conseguimos que essa palavra de origem indígena brasileira, mutirão, se tornasse uma palavra de todos os dicionários. E é através do mutirão que nós vamos poder implementar as decisões desta COP e das anteriores”, afirmou Corrêa do Lago.
Lula ressaltou ainda que o Acordo de Paris, firmado em 2015, delineou a rota para o futuro climático do planeta, mas que é preciso acelerar a execução dos compromissos assumidos. “Sem o Acordo de Paris, o mundo estaria fadado a um aquecimento catastrófico de quase cinco graus até o fim do século. Estamos andando na direção certa, mas na velocidade errada. No ritmo atual, ainda avançamos rumo a um aumento superior a um grau e meio na temperatura global. Romper essa barreira é um risco que não podemos correr”, afirmou.
Os discursos de Lula e Corrêa do Lago foram seguidos pela fala de Simon Stiell, secretário-executivo da UNFCCC, que reforçou a importância das ações práticas. “Há 10 anos em Paris, estávamos desenhando um futuro que testemunharia a queda da curva de emissões. Bem-vindos a esse futuro. A queda de emissões sofreu esse declínio e isso se deve ao que foi acordado em salas como essa”, declarou. “Mas ainda há muito trabalho a ser feito. Precisamos agir mais rápido, tanto na redução das emissões quanto no fortalecimento da resiliência. Lamentar não é uma estratégia, precisamos de soluções.”
Nesse contexto, Lula destacou o Chamado de Belém pelo Clima, documento com propostas para restaurar a confiança internacional e fortalecer a cooperação global em três eixos principais. “Na primeira parte, um apelo para que os países cumpram seus compromissos”, afirmou. O texto aborda o cumprimento das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), o financiamento climático, a transferência de tecnologia, a capacitação e a adaptação aos efeitos da mudança do clima.
Criação de uma governança global
Nos pontos seguintes, Lula pediu a criação de uma governança global mais sólida e a implementação de medidas concretas, destacando a proposta de um Conselho do Clima vinculado à Assembleia Geral da ONU. Por fim, enfatizou a necessidade de que as pessoas sejam colocadas no centro das políticas ambientais. “Convoco a comunidade internacional a colocar as pessoas no centro da agenda climática. O aquecimento global pode empurrar milhões para a fome e a pobreza, fazendo retroceder décadas de avanços. O impacto desproporcional da mudança do clima sobre mulheres, afrodescendentes, migrantes e grupos marginalizados deve ser levado em conta nas políticas de adaptação”, declarou. “É fundamental reconhecer o papel dos territórios indígenas e de comunidades tradicionais nos esforços de mitigação.”
Lula também fez agradecimentos ao povo paraense e às equipes envolvidas na realização da conferência, destacando o papel da Amazônia e de seus habitantes. “Quem só vê a floresta de cima desconhece o que se passa à sua sombra. O bioma mais diverso da Terra é a casa de quase 50 milhões de pessoas, incluindo 400 povos indígenas, dispersa por nove países em desenvolvimento que ainda enfrentam imensos desafios sociais e econômicos”, afirmou.
O presidente convidou os participantes a conhecerem a cultura local. “Tirem proveito desta cidade, tirem proveito dessa alegria, da beleza, do charme, do carinho e do amor de homens e mulheres que vão receber vocês. Sobretudo, tirem proveito da culinária do Pará”, disse. “Aqui vocês vão comer comidas que vocês não comeram em nenhum lugar do mundo, talvez o melhor peixe. E não se esqueçam de comer a maniçoba.”
Ao encerrar, Lula destacou que a Amazônia é um espaço vivo e essencial para o equilíbrio climático global. “Desafios que o Brasil luta para superar com a mesma determinação com que contornou as adversidades logísticas inerentes à organização de uma conferência deste porte. Quando vocês deixarem Belém, o povo da cidade permanecerá com os investimentos em infraestrutura que foram feitos para recebê-los. E o mundo poderá, enfim, dizer que conhece a realidade da Amazônia. Espero que a serenidade da floresta inspire em todos nós a clareza de pensamento necessária para ver o que precisa ser feito”, concluiu.
A cerimônia de abertura também contou com manifestações de povos indígenas e apresentações culturais, entre elas a da cantora Fafá de Belém e da ministra da Cultura, Margareth Menezes, que interpretaram “Emoriô”, de Gilberto Gil e João Donato.
