PEC da Blindagem é pautada após liminar que suspende investigações contra Ricardo Ayres

16 setembro 2025 às 17h41

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A Câmara dos Deputados colocou na pauta desta terça-feira, 16, a análise da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que estabelece regras mais rígidas para a abertura de ações penais contra deputados e senadores. A iniciativa, conhecida como PEC da Blindagem (PEC 3 de 2021) ou PEC das Prerrogativas, foi protocolada em meio à liminar parcial concedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em favor do deputado federal Ricardo Ayres (Republicanos-TO), suspendendo temporariamente as investigações da Operação Fames-19 para o parlamentar.
A proposta determina que qualquer processo criminal contra parlamentares só poderá ser iniciado mediante autorização prévia, em votação secreta, da maioria absoluta da Casa respectiva. Além disso, o texto concede foro no Supremo Tribunal Federal (STF) para presidentes de partidos com assentos no Congresso Nacional.
A medida foi articulada pela maioria dos líderes da Câmara, com apoio da oposição liderada pelo Partido Liberal (PL). Até o momento, o governo federal não se manifestou oficialmente sobre a pauta.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou que o projeto “fortalece a atividade parlamentar e foi defendido pela maioria da representação do Colégio de Líderes”. Nesta segunda-feira, 15, o deputado Cláudio Cajado (PP-BA) foi nomeado relator da proposta.
Caso seja aprovada, ações judiciais contra parlamentares, incluindo por desvio de emendas parlamentares ou outros crimes, só poderão tramitar no STF com autorização da Câmara ou do Senado.
O deputado Cajado destacou que o texto não seria uma permissão para “maus feitos”, mas uma “proteção” para que os deputados exerçam suas funções sem temor de “perseguição política”.
“Isso aqui não é uma licença para abusos do exercício do mandato, é um escudo protetivo da defesa do parlamentar, da soberania do voto e, acima de tudo, do respeito à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal”, afirmou.
O relator explicou que, segundo o texto da PEC, “desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável, nem processados criminalmente, sem prévia licença de sua Casa”.
“Votação Secreta”
Outra regra determina que a decisão sobre o prosseguimento da ação deve ocorrer “por votação secreta da maioria absoluta de seus membros, em até noventa dias a contar do recebimento da ordem emanada pelo STF”. A maioria absoluta corresponde à metade mais um do total de parlamentares da Casa.
No caso de prisão por crime inafiançável, a Câmara ou o Senado deve se manifestar em até 24 horas, também por votação secreta. A prisão poderá ser suspensa mediante maioria simples, que leva em conta apenas os parlamentares presentes na sessão.
Sobre o voto secreto, Cajado afirmou que a modalidade “nunca deu problema”. “Qual o problema do voto secreto? [É] para que todos tenham a sua consciência voltada para o pleno exercício da atividade parlamentar”, disse.
O relator ainda justificou a inclusão dos presidentes de partidos com direito ao foro por prerrogativa de função, podendo ser processados apenas pelo STF. “Eles são ativistas na política. Eles complementam a atividade política. Então, qualquer processo sobre eles não tem que ter autorização, para ficar claro. Mas o foro fica sendo também igual aos dos deputados”, explicou.
PEC da Blindagem
A PEC da Blindagem ganhou força na Câmara após a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro e o motim da oposição que paralisou os trabalhos legislativos por uma semana.
Aliados do ex-presidente criticaram ações do STF contra deputados e senadores acusados de participar do movimento que questionou, sem provas, as eleições de 2022.
Segundo o líder do PL na Câmara, deputado Sostenes Cavalcante (PL-RJ), o objetivo é retomar a regra prevista na Constituição de 1988, segundo a qual a abertura de ação penal contra parlamentares exige autorização prévia da Casa Legislativa.
“Investigar pode. Para processar que será necessário autorização das Casas em até 90 dias”, afirmou Sostenes.
Historicamente, até 2001, a Constituição determinava que parlamentares não poderiam ser processados criminalmente sem licença prévia da sua Casa. Com a Emenda Constitucional 35/2001, essa regra foi alterada, permitindo que deputados e senadores fossem processados sem prévia autorização do plenário.
Atualmente, a Câmara ou o Senado podem suspender o andamento de ações já aceitas pelo Judiciário, desde que o crime tenha ocorrido após a diplomação e esteja relacionado às funções do parlamentar.
Operação Fames-19
A Operação Fames-19 investiga supostos desvios em contratos de aquisição de cestas básicas e frangos congelados durante a pandemia de Covid-19. Ricardo Ayres é citado na investigação por, à época dos fatos, exercer mandato de deputado estadual e ter destinado pouco mais de R$ 2,8 milhões em emendas ao programa alvo da apuração da Polícia Federal.
Nesta segunda-feira, 15, o ministro Flávio Dino, do STF, concedeu liminar parcial em favor de Ayres, suspendendo temporariamente diligências específicas autorizadas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no âmbito da Operação Fames-19, que apura suposto desvio de R$ 73 milhões destinados à compra de cestas básicas para população vulnerável durante a pandemia. A decisão monocrática será analisada futuramente pela 1ª Turma do STF, em sessão virtual marcada entre 26 de setembro e 3 de outubro.
A liminar atende à Reclamação Constitucional (RCL) 84.434, protocolada pela Câmara dos Deputados na semana passada, que questionava a busca e apreensão realizada no apartamento funcional de Ayres em 3 de setembro pelo STJ. A Casa argumentou que, por se tratar de parlamentar federal, qualquer medida cautelar que envolva o deputado deve ser apreciada pelo STF, garantindo a prerrogativa de foro e respeitando o Estatuto Constitucional dos Congressistas.
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