A interinidade de Carlos Eduardo Batista Velozo à frente da Prefeitura de Palmas mal completou três semanas e já provocou um terremoto político. O pastor, filiado ao quase inexpressivo Agir, partido que não elegeu um deputado federal sequer em 2022, nem senador, promoveu ao menos 20 trocas no primeiro escalão e reposicionou a máquina municipal em direção a um novo eixo de poder: o da fé evangélica e dos interesses do seu grupo familiar e partidário.

O movimento foi rápido: rompeu com a base de Eduardo Siqueira Campos (Podemos), demitiu figuras-chave do núcleo político anterior, como Carlos Júnior, Vicentinho Alves e Sérgio Vieira Marques (Soró), e começou a preencher os espaços com aliados diretos, nomes da Assembleia de Deus Madureira (comandada por seu tio e mentor, o pastor Amarildo) e do próprio Agir. O grupo religioso Monte Sião também cravou espaço com cargos estratégicos e articulação em Brasília via Dalide Corrêa, sócia do grupo e ex-candidata a suplente de senador por Goiás.

Se Eduardo não voltar, Carlos vai fundo nessa reconfiguração. A meta é clara: fortalecer seus aliados, não só agora, mas para 2026 também. A gestão já turbinou nomes como Débora Guedes (secretária de Educação e pré-candidata à ALETO) e Filipe Martins, deputado federal que busca a reeleição com respaldo direto da prefeitura e da igreja. Ambos foram ungidos publicamente em evento da Madureira, em Gurupi, com a presença de ninguém menos que Laurez Moreira (PDT), vice-governador e também pré-candidato ao governo do Estado.

Palmas atrai velhos nomes e novas apostas

A reconfiguração em curso atrai olhares de todos os lados, até mesmo de quem andava distante da gestão de Eduardo Siqueira. Cinthia Ribeiro (PSDB), ex-prefeita e desafeta política de Eduardo, viu dois nomes de sua antiga gestão voltarem a ocupar cargos estratégicos agora na administração Carlos Velozo, coisa que não aconteceu enquanto Eduardo estava no poder. O movimento pode sinalizar uma aproximação com a ex-gestora tucana, que ainda tem influência em segmentos da capital.

Com a bagagem de quem já esteve no comando da capital, a ex-gestora costumava dizer que “toda articulação política passa por Palmas; não existe construção de chapa sem passar pela capital”, uma frase dita quando Eduardo ainda engatinhava na gestão, mas já puxava a cidade para o centro das costuras de 2026. Agora, Carlos Velozo parece vestir a mesma farda e ocupar a mesma trincheira.

Outro que acompanha de perto a movimentação é Amélio Cayres (Republicanos), presidente da Assembleia e também pré-candidato ao Palácio Araguaia. Mas quem tem feito acenos mais diretos é Laurez Moreira, que esteve no mesmo palco que o pastor Amarildo, em Gurupi, antes mesmo do afastamento de Eduardo. O evento serviu como vitrine para o lançamento informal de Débora e Filipe à disputa de 2026, e pode ter sido o início de um elo entre Laurez e Carlos. Vale lembrar: Laurez apoiou Eduardo em 2024, mas viu o prefeito recém-eleito gravitar para Dorinha na disputa pelo governo estadual. Não que Eduardo lhe devesse fidelidade, mas o movimento deixou Laurez à margem.

Agora, com Eduardo afastado e Carlos no comando, o vice-governador parece enxergar ali uma brecha de reconexão, não com o velho grupo, mas com o novo núcleo de poder evangélico que hoje pilota a prefeitura.

Dorinha observa, mas não fecha portas

A senadora e pré-candidata ao governo Dorinha Seabra (União Brasil), que teve Eduardo Siqueira como potencial aliado até outro dia, ainda sustenta discurso de lealdade a ele, mas não ignora o novo cenário. Sabe que, se Carlos se firmar na cadeira, a força da Madureira e do maior colégio eleitoral do estado pode virar trunfo em 2026. Já teria, inclusive, se reunido com Dalide Corrêa em Brasília, e ninguém marca café à toa na capital federal.

Dorinha tem experiência demais para bater portas. Oficialmente, diz que Eduardo foi eleito legitimamente e deve retornar. Mas mantém as antenas ligadas na movimentação de Amarildo e cia.

Vicentinho: do favoritismo à incerteza

O racha com Vicentinho Júnior (PP) foi dos mais simbólicos. Leal até o osso a Eduardo Siqueira, a ponto de contrariar o próprio governador Wanderlei e apoiá-lo em 2024, Vicentinho optou por tirar seu grupo da gestão interina e ficou sem sua principal vitrine eleitoral: Palmas. Eduardo havia declarado apoio à sua pré-candidatura ao Senado em 2026, e isso dava ao deputado um diferencial importante. Mas, com o afastamento de Eduardo e o avanço do grupo religioso, Vicentinho perde fôlego.

A relação de Vicentinho Júnior com Eduardo Siqueira é tão consolidada, que nem a reaproximação entre prefeito e Eduardo Gomes, inimigos declarados durante a campanha 2024, teria estremecido essa relação. Teve ciúmes sim por parte do deputado do PP, mas nada além disso e nem que rompesse a relação dos dois. Agora, sem a máquina da capital e com o projeto orbitando a incerteza, Vicentinho aposta que Eduardo retorne, e o mais rápido possível.

O laboratório do Agir

Palmas virou um laboratório. Carlos Velozo, ainda que interino, tem a caneta, tem a igreja, tem o partido, e está organizando a casa para ter também projeto. O Agir, que parecia irrelevante no Tocantins, agora testa o poder da fé, da máquina pública e do alinhamento religioso para se tornar protagonista.

E do jeito que a política tocantinense é imprevisível, não dá para duvidar que isso dê certo.