A servidora comissionada da Assembleia Legislativa do Tocantins (Aleto), Jessika da Silva Sousa, foi exonerada do cargo de Coordenadora de Produção de Conteúdo, com efeito a partir de 1º de novembro de 2025, conforme publicação no Diário da Assembleia desta quarta-feira, 29. A decisão, assinada pelo presidente Amélio Cayres (Republicanos), ocorreu um dia após o Jornal Opção Tocantins questionar a Casa e o deputado Gipão (PL) sobre contratos entre o gabinete do parlamentar e uma empresa da qual a servidora é sócia.

Documentos oficiais mostram que a empresa J D Locações e Serviços e Variedades Ltda, inscrita no CNPJ 43.499.451/0001-28, recebeu R$ 18 mil mensais da Cota de Despesa de Atividade Parlamentar (CODAP) do deputado Gipão entre abril de 2024 e agosto de 2025. Os repasses somam R$ 306 mil ao longo de 17 meses, conforme os extratos públicos disponíveis no portal da transparência da Aleto.

Ligação entre servidora e empresa contratada

A J D Locações tem como sócias Jessika da Silva Sousa e Deuzelina Alves da Silva Sousa, esta última na função de administradora. Segundo a base da Receita Federal, a empresa foi fundada em 2021, tem sede em Wanderlândia (TO) e atua principalmente no comércio de equipamentos e suprimentos de informática.

Paralelamente, Jessika aparece na folha de pagamento da Aleto desde fevereiro de 2023, quando foi nomeada como Assessor Especial Parlamentar no gabinete do próprio deputado Gipão, conforme consta no Decreto Administrativo nº 161/2023. Poucos dias depois, foi exonerada desse cargo e, mais tarde, nomeada para a Coordenadoria de Produção de Conteúdo, fora da estrutura do gabinete.

Na função, tinha remuneração bruta mensal de R$ 10.397,42.

Contratos e ausência de transparência sobre os serviços

Os registros de gastos da CODAP apontam que a empresa de Jessika e Deuzelina recebeu mensalmente R$ 18 mil em pagamentos pelo gabinete de Gipão. Os extratos, no entanto, não detalham quais serviços foram prestados.

O Ato da Mesa Diretora nº 03/2019, que regulamenta o uso da cota parlamentar, determina que as despesas devem ser “exclusivamente vinculadas ao exercício da atividade parlamentar” e acompanhadas de nota fiscal e atesto do deputado, que assume a responsabilidade sobre a legitimidade dos gastos.

A norma veda reembolsos de serviços prestados por empresas de familiares do parlamentar até o terceiro grau, mas não menciona expressamente situações em que servidores da Casa sejam sócios das empresas contratadas. O valor da Codap de cada deputado é de R$ 45.297,41.

Captura de tela 2025-10-29 124856
Último extrato disponível da Codap dos deputados estaduais é de agosto | Foto: Reprodução

O que dizem a Assembleia e o deputado

Procurada, a Assembleia Legislativa informou, em nota, que “não há vedação legal, desde que o servidor não exerça função de gerência ou administração em empresa privada”, citando a Lei nº 1.818/2007 (Estatuto dos Servidores) e a Lei nº 4.209/2023, que trata da estrutura administrativa da Casa.

“Não há vedação legal, desde que não exerça função de gerência ou administração em empresa privada, conforme estabelece a Lei nº 1.818/2007, que dispõe sobre o Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado do Tocantins. No mesmo sentido, a Lei nº 4.209/2023 – que trata da Estrutura Administrativa, atribuições e remuneração dos cargos em comissão da Assembleia – determina, em seu Art. 143, §2º, inciso IV, que é vedado ao servidor comissionado participar da gerência ou administração de sociedade privada, bem como ser proprietário(a) de firma individual”, afirma a nota, que destaca ainda que a verificação e o controle dessas condições são realizados no ato da posse, pela Diretoria de Pessoal da Casa de Leis.

A própria norma, no entanto, veda ao servidor comissionado participar da gerência ou administração de sociedade privada, bem como ser proprietário de firma individual. Embora não mencione explicitamente a figura do sócio, o fato de uma servidora ativa figurar como sócia de empresa contratada por gabinete parlamentar dentro da mesma instituição “cria um claro conflito de interesse”, afirma um professores de Direito Administrativo, ouvido pela reportagem em reservado.

O deputado Gipão (PL) foi procurado para esclarecer qual serviço a empresa prestou, se tinha conhecimento da vinculação de uma das sócias à folha da Casa e se havia algum vínculo pessoal ou profissional com as empresárias. O parlamentar não respondeu até o fechamento desta reportagem.

Nomeações e exoneração

De acordo com registros administrativos, Jessika foi nomeada no gabinete de Gipão no dia 3 de fevereiro de 2023, e exonerada seis dias depois, em 9 de fevereiro. Ainda em fevereiro daquele ano, assumiu o cargo de Coordenadora de Produção de Conteúdo, vinculado à estrutura administrativa da Casa.

A exoneração mais recente, publicada no Diário da Assembleia nº 4138, foi assinada em 28 de outubro de 2025, um dia antes da divulgação da reportagem e do questionamento formal encaminhado à assessoria da Aleto.