O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) propôs a transferência de R$ 90 milhões inicialmente destinados à obra hidroviária do Pedral do Lourenço (Hidrovia Araguaia-Tocantins), no Pará, para a construção de um novo terminal portuário em Manaus, no Amazonas. A solicitação foi enviada há cerca de duas semanas ao Ministério de Portos e Aeroportos e está em análise pela pasta.

O Dnit apresentou dois principais motivos para o pedido. O primeiro é que, mesmo após mais de dez anos, o projeto hidroviário do Pará ainda não estava autorizado a começar, devido à ausência de licenciamento ambiental até recentemente. O segundo argumento é que o projeto portuário do Amazonas já possui licença ambiental que permite o início das obras, mas não dispõe de recursos suficientes para avançar.

No Orçamento da União aprovado para 2025, a obra do Pedral do Lourenço conta com R$ 570 milhões previstos. Já o porto Manaus Moderna tem dotação de R$ 8,5 milhões.

Nos últimos dias, o projeto do Pedral do Lourenço obteve a Licença de Instalação (LI) Nº 1518/2025 do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e encaminhou o documento ao Dnit. O documento foi assinado pelo presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, e permite o início da retirada das pedras do leito do rio Tocantins, no Pará. A obra tem como objetivo possibilitar a navegação de embarcações de carga de grande porte durante todo o ano. Avaliado em R$ 1,014 bilhão, o empreendimento será executado na região de Marabá, próxima às eclusas da hidrelétrica de Tucuruí — essas estruturas foram inauguradas há 15 anos, mas ainda operam com passagens mínimas devido aos trechos pedregosos do rio Tocantins.

Além do derrocamento, o projeto prevê dragagem em bancos de areia distribuídos por uma faixa de 177 km ao longo de um trecho total de 300 km. A obra tem prazo estimado de 36 meses e, ao ser concluída, deve permitir o transporte de até 40 milhões de toneladas por ano.

O governo do Amazonas, por sua vez, busca tirar do papel o porto Manaus Moderna. O novo terminal será construído às margens do rio Negro, no centro da capital, com investimento total de R$ 974,6 milhões. A área prevista é de aproximadamente 201 mil m², com três conjuntos de acostagem. A obra tem prazo estimado de 24 meses e inclui um terminal de passageiros com 1,7 mil m² e um pátio de cargas com 3 mil m².

O Ministério de Portos e Aeroportos informou que o tema está em análise, em conjunto com órgãos responsáveis pela gestão orçamentária. “Até o momento, não há decisão definitiva sobre o eventual remanejamento dos recursos”, declarou.

Segundo o ministério, a derrocagem do Pedral do Lourenço começará com a execução de um projeto-piloto, uma das exigências feitas pelo Ibama. “Eventuais ajustes ou readequações orçamentárias, caso venham a ser formalizados, não irão comprometer o cronograma do empreendimento. Ao contrário, visam alinhar a disponibilidade de recursos às necessidades do projeto para 2025, em conformidade com os requisitos técnicos e socioambientais”, informou.

O Dnit, por sua vez, declarou que, como a licença ambiental foi obtida apenas no meio do ano, “a totalidade desses recursos não será executada neste exercício”. O órgão acrescentou: “Diante disso, e considerando que o projeto da Manaus Moderna já se encontra apto para início, está sendo solicitado o remanejamento parcial dos recursos inicialmente destinados ao Pedral do Lourenço. Essa medida tem como objetivo otimizar a aplicação orçamentária, evitando a devolução de valores não utilizados e garantindo o avanço de outra obra estratégica para a região.”.


Manifestações contrárias

Após a licença ambiental concedida pelo Ibama, o projeto vem enfrentando críticas por meio de órgãos e movimentos contrários ao derrocamento. O Ministério Público Federal (MPF), por exemplo, classificou como ilegal a licença de instalação concedida para a obra de derrocamento da hidrovia Araguaia-Tocantins. Segundo o MPF, o processo de derrocamento em uma hidrovia consiste na retirada ou destruição de formações rochosas submersas no leito do rio, com o intuito de viabilizar e tornar segura a navegação, ajustando a profundidade e largura do canal para permitir a passagem de embarcações. No entanto, a concessão da licença de instalação desrespeita uma decisão judicial já vigente, especialmente no que diz respeito à exigência de apresentação dos estudos sobre o desembarque pesqueiro, afirma o MPF.

O MPF também aponta que a licença de instalação descumpre os termos da licença prévia, incluindo as condicionantes — medidas obrigatórias impostas pelo próprio Ibama para o avanço do projeto. Ainda conforme o MPF, a licença infringe o direito de consulta livre, prévia e informada aos povos e comunidades tradicionais, conforme previsto na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), norma com força de lei no Brasil e que não depende de regulamentação adicional para ser aplicada.

O  Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) também se manifestou contra a concessão da licença de instalação para o início das obras de derrocamento do Pedral do Lourenço, no Rio Tocantins.

Já o Movimento Estadual de Direitos Humanos do Tocantins (MedhTO) durante o seminário “Não à Hidrovia Araguaia-Tocantins por Justiça Climática”, realizado em Palmas, no mês de novembro de 2024, debateu sobre os efeitos socioambientais e climáticos do projeto na região.

Trajeto

A autorização concedida pelo Ibama permite o início das obras de derrocamento do Pedral do Lourenço, no rio Tocantins, etapa considerada essencial para a viabilização da hidrovia Tocantins-Araguaia, após anos de estudos ambientais e negociações.

A licença ambiental se refere ao trecho 2 da Via Navegável do Rio Tocantins, que abrange uma extensão de 35 quilômetros entre Santa Terezinha do Tauiri e a Ilha do Bogéa. A obra inclui a instalação de canteiros de apoio, áreas industriais e um paiol de explosivos. Com a liberação, estão autorizadas as atividades de derrocamento e dragagem, com o objetivo de assegurar a navegabilidade do rio ao longo de todo o ano.