Transporte escolar rural com frota irregular na gestão de Cinthia Ribeiro gerou prejuízo de R$ 5,7 milhões em Palmas, diz MPC

09 maio 2025 às 10h27

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O Ministério Público de Contas do Tocantins (MPC/TO) recomendou ao Tribunal de Contas do Estado (TCE/TO) o julgamento pela irregularidade das contas da Tomada de Contas Especial nº 001/2024, instaurada para apurar falhas graves na execução do Contrato nº 03/2023, firmado entre a Secretaria Municipal de Educação de Palmas e a empresa Expresso Vila Rica ATTM Ltda. para a prestação de transporte escolar rural em 2023, na gestão da ex-prefeita Cinthia Ribeiro (PSDB).
De acordo com a análise técnica, a empresa utilizou veículos bem mais antigos do que o previsto, o que reduziu os custos operacionais e gerou um sobrepreço indireto de R$ 5,77 milhões, já que o município pagou como se estivesse contratando uma frota mais nova e cara. Do total da frota analisada, 55% dos veículos tinham 12 anos de uso, 23% tinham entre 13 e 15 anos, e os demais entre 10 e 11 anos, todos fora do padrão estipulado.
O parecer, assinado na última terça-feira, 6, pelo procurador-geral do Ministério Público de Contas (MPC/TO), Oziel Pereira dos Santos, aponta dano ao erário decorrente da omissão de gestores públicos, com anuência à utilização de veículos fora dos padrões contratuais.
Segundo o relatório da Tomada de Contas Especial nº 001/2024, instaurada após auditoria do TCE/TO, houve diversas irregularidades graves na prestação do serviço de transporte escolar rural no município.
Entre os principais problemas apontados estão: uso de veículos com idade superior ao permitido no contrato (que exigia no máximo sete anos de fabricação), ausência de equipamentos obrigatórios como GPS, ar-condicionado e sistema de bilhetagem, e falhas na segurança dos veículos utilizados. Além disso, parte da frota não tinha os acessórios de segurança exigidos para transporte escolar, o que colocava em risco os estudantes da zona rural.
Além disso, o relatório identificou deficiência na fiscalização da execução contratual e medidas corretivas tardias. O município chegou a aplicar sanções administrativas à empresa apenas no último mês de vigência do contrato. Ainda assim, não houve glosa proporcional nos pagamentos pelos serviços prestados de forma irregular, o que contribuiu para o prejuízo apontado.
O Jornal Opção Tocantins questionou à gestão de Eduardo Siqueira Campos (Podemos) qual é a avaliação sobre o conteúdo do parecer do MPC/TO, se Prefeitura reconhece a existência de falhas na fiscalização e execução do contrato em questão, que medidas foram ou serão adotadas para evitar que situações semelhantes se repitam e se gestão pretende apurar a conduta dos servidores apontados como responsáveis no parecer. A reportagem aguarda retorno.
Responsabilização
De acordo com o documento, o procurador de contas recomenda a responsabilização de quatro ex-gestores: Fábio Barbosa Chaves, ex-secretário municipal de Educação; Maria de Fátima Sena, que também ocupou a chefia da pasta; Hélio Silvestre Xavier, ex-diretor de apoio à gestão; e Valdeis Xavier Rodrigues, ex-gerente de transporte escolar.
Segundo o MPC, os responsáveis deixaram de agir diante de irregularidades evidentes desde o início da execução contratual. A frota disponibilizada pela empresa apresentava falhas estruturais, ausência de equipamentos obrigatórios e veículos sem as condições mínimas previstas no contrato, como ar-condicionado e sistema de bilhetagem eletrônica.
Apesar dessas falhas, os serviços começaram a ser prestados e nenhum gestor tomou providências imediatas para impedir ou corrigir a situação.
Defesas
O procurador Oziel Pereira cita no parecer a análise das defesas dos envolvidos. De acordo com o documento, a defesa de Fábio Barbosa Chaves alegou “cerceamento do direito à ampla defesa” na fase interna da TCE nº 001/2024, além de erro material do cálculo utilizado, bem como ausência de individualização da conduta ante a insuficiência do conjunto probatório e inexistência de dolo ou má-fé.
A Procuradoria de Contas do TCE/TO considerou improcedente a alegação de cerceamento do contraditório feita por Fábio Barbosa. Segundo o parecer, a fase interna da Tomada de Contas Especial é apenas preparatória e não exige defesa prévia. O direito ao contraditório foi garantido a partir da citação formal, quando o responsável apresentou ampla defesa, com documentos e laudos. A procuradoria também destacou que esse entendimento está pacificado no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Tribunal de Contas da União (TCU). Quanto à acusação de ausência de individualização da conduta, o órgão também rejeitou a tese.
A defesa da empresa Expresso Vila Rica alegou a suposta ausência de prejuízo material à administração em razão do uso de veículos mais antigos, sustentando que os carros estariam em condições operacionais adequadas e que inexistiria impacto financeiro direto, posto que o valor pactuado teria sido previamente estimado de forma global.
Com relação a isso, o procurador de Contas rejeitou as justificativas da empresa contratada para o transporte escolar e apontou prejuízo de R$ 5,7 milhões aos cofres públicos. Segundo o órgão, a empresa operou com veículos de até 15 anos de uso, contrariando a cláusula contratual que exigia frota com até 7 anos de fabricação, item que serviu de base para calcular o valor pago por quilômetro rodado. Para a Procuradoria, houve infração material, quebra da boa-fé e execução irregular, com responsabilização solidária dos envolvidos.
Já Hélio Silvestre defendeu que teve seu direito à ampla defesa violado durante a fase interna da Tomada de Contas Especial, por não ter tido a chance de se manifestar antes do envio do processo ao TCE/TO. Sustenta ainda que sua conduta não foi individualizada, já que não participou da licitação nem da contratação emergencial e não acompanhou toda a execução do contrato. Por fim, argumenta que os serviços só teriam começado após inspeção dos veículos, em 23 de fevereiro de 2023, realizada por outro servidor, Valdeis Xavier Rodrigues.
Em sua defesa, Valdeis Xavier alegou que não tinha atribuições de gestão ou fiscalização do contrato de transporte escolar, atuando apenas em funções operacionais como chefe do setor. Segundo ele, a responsabilidade pela conformidade da frota e pela liberação de pagamentos cabia a superiores hierárquicos, como o ordenador de despesas e os fiscais formalmente designados. No entanto, o parecer cita documentos dos autos que revelam sua participação direta na inspeção realizada em 23/02/2023, que deu aval ao início da execução do contrato mesmo com veículos em desacordo com cláusulas contratuais, como idade acima do permitido e ausência de equipamentos obrigatórios.
Diante disso, o MPC considera que Xavier exerceu papel relevante na aceitação irregular da frota, mesmo sem nomeação formal como fiscal. O relatório fiscal aponta que ele e o então fiscal do contrato constataram a ausência de bilhetagem eletrônica e ar-condicionado, mas nada foi feito para barrar o início da prestação dos serviços. Para o órgão, a omissão na comunicação dessas falhas e a anuência com a situação contribuíram diretamente para o dano ao erário. Por isso, o MPC opinou pela rejeição das justificativas e responsabilização dele por sua conduta omissiva.
As alegações de Silvestre não foram acatadas pelo MPC. Segundo a manifestação, não há nulidade por cerceamento de defesa, pois a fase interna da Tomada de Contas Especial é apenas preparatória e não exige contraditório. A responsabilidade de agentes públicos, afirma o parecer, não depende de participação direta em todas as etapas do contrato, bastando o vínculo entre sua conduta e o prejuízo apurado. No caso, o então servidor atuou no acompanhamento das rotas e no recebimento dos serviços no início do contrato, período em que já se verificavam falhas graves, como uso de frota fora das especificações. Ainda que outro servidor tenha feito a inspeção dos veículos, isso não o isenta de responsabilidade. Assim, o Ministério concluiu que suas justificativas não afastam o nexo com o dano nem revelam qualquer vício que invalide o processo.
Ex-secretária
A ex-secretária de Educação de Palmas, no período de 26/01/2023 a 10/08/2023, Maria de Fátima Sena, afirmou em sua defesa dentro do processo que sua participação no contrato de transporte escolar se restringiu ao início da execução, negando envolvimento com a licitação, a formalização do contrato ou a condução dos serviços até o fim. Alegou ainda que os veículos só começaram a operar após inspeção realizada por outro servidor, em 23 de fevereiro de 2023, o que, segundo ela, comprovaria que não houve falha de sua parte no acompanhamento do início da prestação dos serviços.
Apesar das alegações, a resposta do procurador cita que os documentos do processo mostram que a responsabilidade da gestora não se restringe a atos formais. Segundo Oziel Pereira, ela tinha o dever de fiscalizar e garantir que os veículos utilizados estivessem dentro das exigências contratuais desde o início da execução. O procurador pontua que ficou comprovado que a frota já apresentava irregularidades no tempo de fabricação logo no começo do contrato, sem que nenhuma providência corretiva tenha sido tomada. Por isso, aponta o parecer, a omissão na fiscalização inicial é atribuída à ex-secretária, que responde pelos danos ao erário desde o início da vigência contratual.
Conclusão
Com as defesas apreciadas e os autos, o procurador-geral emitiu parecer para julgar irregulares as contas relacionadas à Tomada de Contas Especial em questão. Além disso, o parecer solicita a imputação de débito apurado aos responsáveis, na medida de suas condutas.
O procurador ressaltou que o valor do débito deverá ser atualizado monetariamente e acrescido dos juros de mora devidos até a data do seu efetivo recolhimento, calculados a partir da data da transferência dos recursos, na forma prevista na legislação em vigor, fixando o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da notificação, para comprovar perante o Tribunal o recolhimento do débito ao Tesouro Estadual, a ser devidamente corrigido.
Além disso, o parecer pede a aplicação de multa individualmente aos responsáveis e que o Ministério Público do Estado do Tocantins (MPTO) seja cientificado, para avaliar possíveis ações penais e civis cabíveis.