As “regras invisíveis” que servem como desculpa para um problema visível e ignorado
20 julho 2024 às 15h43
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Dentro do mundo desportivo, onde a habilidade, a paixão e a dedicação deveriam ser os únicos critérios de avaliação, o racismo continua presente como uma sombra nefasta. No futebol, por exemplo, atletas ainda sofrem discriminações diversas, desde comentários desdenhosos até ameaças de morte. Apesar dos avanços sociais vivenciados nas últimas décadas, o preconceito está presente entre os torcedores e até mesmo entre os praticantes.
Por exemplo, após o título da Copa América deste ano, jogadores da Argentina foram flagrados cantando uma música preconceituosa sobre os atletas negros da França. Em viagem de ônibus, o meia Enzo Fernández fazia uma live com os colegas de seleção. Entretanto, ele parou a gravação no momento que iniciaram as provocações aos franceses.
A situação escalou para o mundo inteiro, a Federação Francesa de Futebol (FFF) anunciou que iria acionar à Fifa a respeito. O atual governo argentino comprou briga para defender os jogadores. O Chelsea, equipe em que Fernández joga, anunciou que vai investigar o caso e os colegas de time franceses pararam de seguir o meia argentino após a polêmica.
Se já não bastasse essa situação, diversos atletas negros ainda passam discriminação enquanto jogam futebol. Outro exemplo tem sido o brasileiro Vinícius Júnior, atacante do Real Madrid constantemente alvo dos torcedores de outras equipes espanholas. Uma situação que infelizmente tem sido recorrente, mas que as entidades esportivas ignoram.
Levando em conta esse problema gravíssimo dentro do futebol, podemos chegar no ponto do texto: por que o racismo não é levado a sério no esporte como as conhecidas “regras invisíveis”?
Para quem não conhece, as tais “regras invisíveis” são normas não escritas ou expectativas culturais que influenciam o comportamento dos atletas em todos os esportes. Por exemplo, dentro do futebol, o excesso de drible ou as comemorações com danças podem não ser bem visto pelos jogadores, o que gera um “mal-estar” entre os praticantes.
Só que isso não faz o menor sentido, em sua maioria, essas regras foram baseadas em preconceitos arraigados e expectativas culturais ultrapassadas. Ao mesmo tempo, essas normas não escritas podem destruir o esporte, já que tentam minar a alegria que praticante possui com a atividade. E o pior, em nenhum momento essa cultura de regras prejudicial serve para coibir o preconceito no esporte, mas vira desculpa para praticar discriminações.
Voltando ao exemplo do Vinícius Júnior, jogadores e torcedores que perseguem o atleta do Real Madrid justificam o preconceito pela forma que ele joga. Enquanto isso, outros atletas investigados, acusados e condenados por crimes graves seguem tranquilos no esporte. Ou seja, as “regras invisíveis” só servem como desculpa para ataques covardes.
Fora do campo do racismo, temos ainda diversos exemplos que também ilustram a hipocrisia desse conjunto de regras ocultas. Por exemplo, no decorrer desta semana, o ciclista esloveno Tadej Pogačar foi criticado pelo ex-ciclista americano Lance Armstrong.
Segundo o aposentado, o comportamento esportivo do atleta esloveno é desrespeitoso com o ciclismo e pode lhe causar problemas. Só que há um detalhe importante de contexto nesta história, quem critica foi banido do esporte anos atrás após um escândalo de doping. Ou seja, o uso do doping para vencer os adversários de um forma ilegal (e imoral) não é problema para Armstrong, mas a vontade e dedicação de vencer de um ciclista precisa ser combatida.
No fim das contas, o esporte não precisa de nenhuma legislação oculta para se regular, mas de regras escritas que proíbam qualquer discriminação dentro da prática. Essas normas precisam ser seguidas e quem desrespeitar precisa ser punido conforme o estabelecido. Preconceito e suas discriminações não podem continuar apenas “invisíveis”.