Giovanna Campos

Essa semana, um colega me contou uma história difícil de conflito interno na sua família. Perguntei: e o Natal como fica? “Não vai ter Natal”, ele disse. Assim como para muitos, também não haverá união e comemoração. No Brasil, a síndrome de fim de ano já ganhou até apelido: dezembrite, fusão da palavra “dezembro” com o sufixo “ite”, que significa inflamação aguda ou crônica. Uma pesquisa da ISMA-BR, associação internacional que estuda a prevenção e o tratamento do estresse, revela que 75% das pessoas se sentem estressadas e irritadas nesta época do ano. Entre outros sintomas, os entrevistados relataram tensão (80%), ansiedade (70%) e insônia (38%).

Para quem tem quadros de saúde mental, os sintomas dessas doenças pré-existentes podem ser agravados neste ciclo de fim de ano. As cobranças e questionamentos internos também vêm à tona. Apesar de ter prometido que em 2023 seria diferente, foi tudo igual. Assim como na família desse meu colega, muitos não vão poder se reunir com os seus. Às vezes por alguma doença, briga, distância física ou até mesmo falta de recursos. Seja qual for o motivo, é o suficiente para justificar o desânimo e te livrar da obrigação de ser feliz. O Natal também nos traz à tona as desigualdades e nos lembra daquele que sempre lutou contra ela: Jesus Cristo. 

Vivemos em guerra o tempo todo. No mundo, acontecem duas ao mesmo tempo: uma entre Israel e Palestina e outra entre Rússia e Ucrânia. Maduro ainda deseja invadir a Guiana. Nesta semana, alcançou-se a marca de mais de 20 mil mulheres e crianças mortas em Gaza. Nessa guerra interminável, já foram cerca de 200 mil ucranianos que tiveram suas vidas perdidas. No Brasil, são no mínimo cinco guerras históricas ainda em curso. Após 500 anos, o Brasil ainda lida com: genocídio indígena, racismo, violência armada, ameaça à democracia e tráfico de drogas, como bem retratou “Guerras do Brasil”, série documental que detalha como o país foi formado por séculos de conflito e violência.

Além disso, ainda temos que enfrentar a insuportável guerra cultural vigente no país. Por mais pacífico que você seja, uma hora ou outra algum conflito vai te alcançar também. E você deve estar preparado. Jesus Cristo, o príncipe da paz na tradição cristã, sempre foi pacífico, mas nunca foi passivo. Entre a morte e a omissão, Jesus optou pela primeira. Pregou sobre a liberdade humana em um modelo escravagista e autoritário. Ensinou sobre justiça e igualdade social em uma sociedade estratificada e de castas. Morreu crucificado por enfrentar a maior autoridade da época: o Império Romano. 

Pessoalmente, a guerra me alcançou muito cedo. Filha de mãe solteira, desde os dois anos de idade tenho que lidar com o conflito de ter um pai ausente compreendido e uma mãe solteira questionada. Sempre ouvi meu bairro e meus familiares julgarem minha mãe por ter três filhos, todos de homens diferentes. Enquanto isso, tanto o meu pai quanto o de meu irmão, ausentes e covardes, estes sempre tiveram suas atitudes justificadas pela família tradicional brasileira.

Um dia ouvi meu pai dizer que minha mãe era “vagabunda”. Me levantei da mesa na mesma hora e disse “vagabundo é você”. Eu nem sabia o que estava dizendo, tinha 10 anos. Nenhuma criança escolhe a guerra, mas ela chega mesmo assim. 

Uma pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas, mostra que o Brasil tem mais de 11 milhões de mães que criam os filhos sozinhas, sendo mais de 1,7 milhão de novas mães solo somente na última década. Como será o futuro daqueles que são o futuro do país?

A vida é uma dádiva, mas ao mesmo tempo é difícil, frágil e trágica. O Natal pode ser de alegria e amor, mas também pode ser de saudade e tristeza. O que não pode faltar é esperança e fé, seja em Deus, na vida ou nas pessoas.

À nós, cabe a difícil tarefa de amadurecer sem perder a ternura. Dedico este texto ao meu colega Pedro Moura, que com suas histórias me inspirou a escrever também