Marcello Lelis é natural de Inhumas (GO) e atualmente exerce o cargo de Secretário Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Tocantins. É casado com a deputada estadual Claudia Lelis e pai de quatro filhos. Pioneiro em Palmas, foi superintendente de Parques e Jardins da Prefeitura da capital entre 1992 e 1993.

Foi eleito vereador de Palmas em 2004. Em 2006, elegeu-se deputado estadual, sendo reeleito posteriormente em 2010. Já disputou a Prefeitura de Palmas em 2008 e 2012, contudo, não obteve êxito. Também foi presidente do Diretório Municipal de Palmas do Partido Verde (PV) e conduzido à presidência do Diretório Regional do PV de 2005 a 2017. Hoje é membro da Executiva Nacional do Partido Verde. Paralelamente ao cargo de Secretário, atua como empresário na capital no segmento de hotelaria e turismo.

Nesta entrevista exclusiva ao Jornal Opção Tocantins ele avalia o cenário do desenvolvimento sustentável, expõe suas impressões sobre a venda de crédito de carbono, as ações de combate às queimadas ilegais, bem como, revela suas ações e projetos à frente da Secretaria Estadual do Meio Ambiente.

Em relação aos aterros sanitários das cidades tocantinenses e a possibilidade deles fazerem consórcios para atenderem dois ou três municípios circunvizinhos, qual é seu posicionamento enquanto gestor da Pasta estadual do Meio Ambiente?

Esse é um é um problema grave do nosso estado, que deve ser atacado. Os maiores municípios do Tocantins já contam com aterro, mas são apenas quatro aterros em funcionamento no estado dos 139 municípios. Então, a maioria dos municípios são atendidos por lixões.

Posso garantir que a erradicação desses lixões é um grande desafio e estamos trabalhando junto ao Ministério Público e o Tribunal de Contas para seguir o exemplo de estados como Pernambuco, por exemplo.

Trata-se de um grande “case” de sucesso no Brasil. O Ministério Público e o Tribunal de Contas cumpriram um papel fiscalizador e o Estado entrou como um facilitador na busca das soluções que podem, inclusive, ser soluções individuais. Visitaremos, nos próximos dias, um município tocantinense, Couto Magalhães, que conseguiu executar um aterro. É um pequeno aterro que atende a apenas o município, porém, com eficiência. Contudo, a verdade é que a maioria dos bons exemplos do país passam por esses consórcios, essa regionalização dos resíduos sólidos.

Cidades próximas não poderiam idealizar aterros nos limites dos municípios, atendendo as duas, por exemplo?

Sim, quando se tem municípios que são próximos, em um deles é viável a construção de um aterro, geralmente operado pela iniciativa privada, por uma empresa, porque aquilo é um negócio.  Aquele ambiente recebe os resíduos sólidos e ambos pagam por quantidade de toneladas de aterro depositado.

Como é que a Secretaria de Meio Ambiente pode influenciar nisso?

A Secretaria é articuladora desse processo. Fizemos, construímos o plano estadual de resíduos sólidos, que define quais são as regiões do estado que tem essa convergência e identifica quais são os municípios que que têm mais condições de se associarem em busca da solução desse problema. O plano está pronto. Agora, em parceria com o Ministério Público e o Tribunal de Contas, vamos começar a desenhar esse trabalho que passa pelo cumprimento da lei por parte dos municípios. Enfim, o Estado está facilitando a busca da solução. Vamos dar apoio e suporte técnico para que essa decisão aconteça da melhor maneira possível. Então, neste cenário, o Estado é um facilitador.

Na semana que passou, ocorreu a oitiva do CEO da BRK – perante a Câmara Municipal de Palmas – durante as tratativas da CPI que investiga a concessionária, no que concerne ao tratamento da água e esgoto. Investiga-se, paralelamente, a poluição do Lago de Palmas, através do lançamento dos dejetos sem tratamento. Qual é o seu posicionamento acerca dessa discussão?

A Secretaria Estadual de Meio Ambiente está muito atenta ao desdobramento desta investigação, em âmbito municipal. A Pasta tem essa política estadual, a qual é executada pelo Naturatins. Quem está na ponta, executando essa política, fiscalizando e autuando, é o Naturatins. Ocorre que nós somos um só corpo, porque pensamos a política e planejamos, mas quem executa é o órgão fiscalizador. Por isso, não existe êxito na nossa parte, se nós não estivermos completamente integrados com eles.

Especificamente em relação a BRK Ambiental, estamos numa força-tarefa, junto com o Naturatins nessa batalha, fiscalizando a BRK. Quanto a estação da BRK Ambiental aqui em Palmas, no setor Bertaville, temos um documento já protocolado, na verdade, uma notificação, uma autuação a BRK visando fazer com que ela instale uma estação de monitoramento.

Exatamente ali onde a água da estação desemboca no lago, para que nós tenhamos, em tempo real, os dados sobre essa água. Como ela está chegando no lago de Palmas? Quando visitamos a estação de monitoramento naquele setor, a BRK afirma categoricamente que aquela água está voltando limpa para o nosso lago. Mas nós queremos saber dados concretos, através dessa estação – que será financiada pela própria BRK – e que mandará dados online, tanto para o Naturatins, quanto pra Semarh para que possamos comprovar qual é o estado que essa água que está, efetivamente, voltando para o lago que banha a capital.

Foto: Esequias Araújo/Governo do Tocantins

E quanto a parceria relacionada a venda dos créditos de carbono do Tocantins para a multinacional Mercuria Energy Trading S/A? Os resultados do seu árduo trabalho começaram a acontecer?

Sim, claro! Fomos o primeiro Estado nessa modalidade, um projeto de redução de emissões dos gases do efeito de estufa, em razão da redução do desmatamento e degradação. Um programa de REED+ (Redução de Emissão provenientes de Desmatamento e Degradação florestal) nesse modelo jurisdicional, ou seja, um projeto que engloba toda a área do Estado e transacionado no mercado voluntário. Nessa modalidade, o Tocantins é o primeiro Estado do planeta a assinar um acordo dessa natureza.

Trata-se, realmente, de um projeto inovador que vai revolucionar toda a política ambiental do Estado. Em que pé que estamos? Assinamos o contrato, vendemos os créditos – até mesmo os passados – entre 2016 e 2020. Tudo que o Tocantins conseguiu reduzir de desmatamento neste período foi transacionado nessa assinatura, como também, tudo o que a gente conseguirá reduzir daqui para 2030, também já foi transacionado. Ocorre que ainda precisamos validar, certificar esses créditos para entregar para Mercuria. É importante dizer que antes da validação e da certificação, existem vários estudos que precisam ser feitos e eles são onerosos.

Em suma: a Mercúria se interessou pelos créditos e topou fazer o pré-investimento para que possamos terminar todo o nosso trabalho, validar, certificar os créditos e entregar para eles. Neste caso, já começamos a receber os recursos para investimentos nessas validações. Já entraram sete milhões e, em breve, mais oito ou dez milhões, até totalizar essa fase de pré-investimento. Após essa validação e certificação, entrarão grande volume de recursos.

As chuvas estão acabando, tradicionalmente as queimadas se iniciam. Essa dinâmica para implantar a educação ambiental não é tarefa fácil. A Secretaria do Meio Ambiente tem feito campanhas publicitárias, panfletos, entre outros. O que mais poderia ser feito para evitar as queimadas ilegais?

Creio que seja um processo de conscientização, que deve ser contínuo.  O projeto “Foco no Fogo”, que é o maior projeto de educação ambiental do estado, está no seu quinto ano e, cada ano que passa, se aperfeiçoa, melhora e avança.

Os números do ano passado são extraordinários, reduzimos 40% na contagem geral e entre os nove estados da Amazônia legal, estávamos em segundo no ano retrasado. Já no ano passado nos passamos para sétimo entre os nove.

Nesse ano a gente está fazendo tudo, da forma certa e no tempo certo. As chuvas ainda não acabaram, mas no dia 9 de abril já iniciamos o processo, com uma blitz que reuniu todas as 32 entidades parceiras do Comitê do fogo. Fizemos uma carreata por Palmas.

Em contrapartida, o trabalho de educação ambiental nas escolas está a todo vapor. Já atendemos mais de 15 cidades. No ano passado, foram 67 cidades visitadas, mais de 2.700 propriedades rurais visitadas diretamente, mais de vinte mil pessoas impactadas, entre capacitações, blitz, visitas, etc. Vamos repetir e avançar nesses números esse ano. Existe, entretanto, uma outra parte do trabalho, que é o campo. Aí entra o Naturatins, com seus brigadistas, a Defesa Civil com os seus. A Semarh repassa todo ano os recursos para o Corpo de Bombeiros e para a Defesa Civil contratar esses brigadistas. O Ibama, por sua vez, tem os seus brigadistas, somando mais de 500 pessoas que estarão em campo no combate ao fogo.

Conseguimos, junto a uma entidade Internacional, uma doação de equipamentos para o Naturatins, para a Defesa Civil, para o Corpo de Bombeiros que já estão chegando. Está tudo pronto para gente enfrentar essa temporada do fogo, mas é preciso que a gente é entenda que é um processo constante conscientização.

Estamos nos aproximando da Agrotins, a maior feira agrotecnológica do norte do país. Seria interessante que o Sr. explicasse como é a confluência da produção agrícola em massa com a preservação de meio ambiente…

Na minha interpretação, essa visão de que é impossível a conciliação é um conceito realmente ultrapassado. Porque o que o governador Wanderlei Barbosa, vem dizendo desde o meu primeiro dia a frente da Secretaria que, no governo dele, a Secretaria do Meio Ambiente e da Agricultura deveriam caminhar juntas. Ele propõe, como política do governo, o desenvolvimento sustentável, ou seja, que ele aconteça considerando a nossa maior vocação e a nossa maior fonte de desenvolvimento: o agro. Então, todos nós tocantinenses devemos reconhecer que a nossa vocação e riqueza hoje é o agronegócio, o turismo, o ecoturismo, enfim. A mineração sustentável vem se apresentando, além da condição do Estado que tem uma posição geográfica muito privilegiada, a logística favorável e outras vocações, mas o agro é o carro chefe. Reconhecemos isso e, ao mesmo tempo, deixamos claro que isso precisa acontecer de maneira sustentável, respeitando as regras ambientais. É uma coisa bastante simples de se compreender.

Olhando pelo lado do meio ambiente, vamos entender que a maior parte das áreas que queremos preservar estão em propriedades rurais. Uma parte delas estão nas terras indígenas, quilombolas e outra parte nos parques. Se nós queremos preservar essa maior parte que está no agro, é preciso chamar o agro para a mesa e debater o tema.  

Quais são as maneiras de se desenvolver de forma sustentável? É natural que as pessoas bem-informadas e são a maioria absoluta dos produtores, ou a grande maioria, estão antenados e sabem que essa sustentabilidade vai garantir que os filhos e netos deles continuem podendo produzir. Além dessa consciência e dessa questão da sustentabilidade ao longo das gerações, há outro ponto que é o mercado. O mercado já decidiu há muitos anos e existe um processo em andamento que acelera a cada dia: o boicote total à aos produtos que não são produzidos de forma sustentável.

E isso vai ser explorado durante a Agrotins…

Sempre. O ano passado já foi com o tema compliance. E esse ano, com bioeconomia. Essa sustentabilidade vai sendo colocada de maneira clara. A Semarh vai ter um stand, a Seagro concedeu – de forma definitiva – uma área um bosque lindo que vai ter todo um ambiente. Haverá vários artigos sustentáveis, piscina ecológica, uma espécie de lago ornamental que não usa cloro, não usa nada químico. Haverão stands de bioeconomia, com vários produtos que já estão sendo produzidos no Estado, sendo expostos e com isso a gente quer ajudar a fortalecer esse tema.

O Sr. é um defensor da causa, chegou a fundar o PV no Tocantins. Ante a todo esse cuidado com o turismo, com o meio ambiente, na condição de Secretário do meio ambiente, seria interessante que expusesse sobre o ecoturismo no Tocantins. De que forma que esse turismo pode ser explorado de forma sustentável?

Essa é uma vocação econômica, que que vai ser um dos tripés de desenvolvimento muito sustentável no nosso estado, porque as riquezas naturais são extraordinárias. São abundantes e únicas. A exemplo do Jalapão, das Serra Gerais, como também a região que une o Tocantins a Chapada dos Veadeiros, saindo de Cavalcante e chegando no distrito de Campo Alegre, em Paranã. É uma região que eu considero uma das mais bonitas do estado, mas ainda pouco conhecida pelos tocantinenses. Esse potencial é imenso.

Se olharmos para os números do Jalapão, que que já é um destino conhecido nacionalmente e internacionalmente, e compararmos com os números de Bonito-MS, esse turismo por lá supera dez vezes o número de visitantes do Jalapão. Então, nós temos uma avenida, praticamente uma Highway.

O governador tem um olhar muito especial para isso. Ele é um amante disso tudo e, empresarialmente, ele também investe nessa área. Nosso gestor está muito dentro dessa pauta.

Foto: Mariana Pereira

O Sr. falou em mineração anteriormente. O processo de confluência passa pela mesma retórica?

Todas as ferramentas de desenvolvimento podem e devem acontecer de maneira sustentável. Tudo pode ser feito dessa maneira, inclusive a mineração. Ela vai trazer impacto, mas vai ser mínimo, vai ser minimizado, e mitigado. Explora a jazida, faz aquele ambiente de extração, quando aquilo não for mais útil, será recuperado de forma adequada. Essa discussão é que nós precisamos fazer, ao invés de discursos “ecochatos”. É possível sim, explorar essas atividades promovendo, ao mesmo tempo, o desenvolvimento sustentável.

Muito obrigado pela entrevista…

Sempre às ordens, é um prazer falar das potencialidades do nosso Tocantins.