8 anos de regime fechado por contar piadas é uma zombaria

04 junho 2025 às 16h38

COMPARTILHAR
O comediante Léo Lins foi condenado a oito anos e três meses de prisão em regime fechado, multa de R$ 1,4 milhão de reais e a pagar R$ 303 mil de indenização em danos morais coletivos por crimes de discriminação e discurso de ódio. Os crimes são suas piadas, contadas em 2022 e publicadas no YouTube, assistidas por 3 milhões de pessoas.
Antes de bater o martelo sobre questões tão surradas quanto o direito de expressão, o limite do humor e o respeito à pessoa humana, cabe dizer claramente: Léo Lins é um comediante sem graça, uma imitação de Anthony Jeselnik, Louis Ck ou Lenny Bruce que confunde o propósito das piadas de humor negro. Jeselnik e CK fazem o público rir chocado com sua própria reação ao absurdo; Lins parece achar que o choque é a graça.
Assim, defender Léo Lins é “gastar vela com defunto ruim”. Mas a linha que separa o bom defunto é tênue: Lenny Bruce, ícone cultural americano, foi preso em 1961 em San Francisco por violar leis contra discurso obsceno. Por sorte, o americano ficou na cadeia por pouco menos de quatro meses, e não oito anos. Sem Bruce, a revolução cultural dos Estados Unidos na década de 1960 teria sido muito mais pobre. Aplaudir o encarceramento de um é aplaudir a censura que empobrece a vida intelectual do outro.
Milhões de pessoas pagaram ou deram seu tempo para ver Léo Lins e, se não gostaram, ao menos toleraram. Quem se ofendeu com o conteúdo não foi o público, mas o Ministério Público, que o denunciou em nome de grupos supostamente ofendidos. Acontece que as pessoas não têm o direito a jamais se sentirem ofendidas — ser ofendido é condição sine qua non para a vida em sociedade.
O falante não pode ser responsável por como o ouvinte se sente a respeito do que ouviu. Este jornal e esta coluna, por serem opinativos, constantemente correm o risco de ofender a alguém, mesmo sem ter a intenção. Se as piadas do comediante não se convertem em prejuízo à vida do público que possa ser comprovado no tribunal, não deveria haver motivo para envolver a Justiça.
Por falar em tribunal, Léo Lins foi condenado com base em dois dispositivos (artigo 20, parágrafos 2º e 2º -A) que só foram complementados à Lei do Racismo em 2023 (Nº 7.716). Quando as piadas foram contadas, não havia tipificação. O princípio da irretroatividade diz que a lei não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.