A Justiça do Tocantins determinou que a Universidade Estadual do Tocantins (Unitins) publique, no prazo de três dias, um edital retificador do Vestibular Unificado 2026/1 com a inclusão de cotas para estudantes quilombolas, seguindo as diretrizes da Lei Estadual nº 4.344/2023 e da Lei Federal nº 12.711/2012, aplicada por analogia. A decisão também estabelece que o Estado do Tocantins é parte responsável no processo, ao lado da universidade.

A medida foi concedida pelo juiz Valdemir Braga de Aquino Mendonça, da 2ª Vara da Fazenda e Registros Públicos de Palmas, no último dia 10, ao acolher os argumentos apresentados em ação civil pública movida pela 15ª Promotoria de Justiça da Capital, do Ministério Público do Estado do Tocantins (MPTO).

Segundo a decisão, além da retificação, a Unitins deverá prorrogar as inscrições por 15 dias úteis a partir da publicação do novo edital, divulgar amplamente as mudanças nas comunidades quilombolas e suspender as etapas subsequentes do vestibular, naquilo que for incompatível com o cumprimento da ordem. O magistrado também determinou a intimação pessoal do reitor da Unitins e da Procuradoria-Geral do Estado, com previsão de multa diária em caso de descumprimento.

Critérios e fundamentação

O despacho determina que o edital retificador apresente critérios objetivos de elegibilidade e comprovação da condição quilombola, em consonância com a legislação estadual e federal. O juiz citou ainda o artigo 206, inciso I, da Constituição Federal, que assegura a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, e a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (art. 4º), que autoriza o uso da analogia em casos de omissão legal.

Para o magistrado, a ausência de reserva de vagas no edital do vestibular “configura afronta direta aos princípios constitucionais da igualdade material, do direito à educação e da legalidade administrativa”, uma vez que o Estado tem o dever de promover políticas públicas voltadas à inclusão de grupos vulneráveis, como as comunidades quilombolas.

A decisão também cita que a própria Unitins mantém política de ações afirmativas na pós-graduação, conforme a Resolução Consuni nº 034/2024, que já prevê reserva de vagas a quilombolas, negros e indígenas. O juiz destacou que excluir esse grupo da graduação é “discriminatório e contraditório”.

Ação civil pública

A atuação do MPTO teve início durante o período de inscrições do vestibular. Em 2 de outubro, a Promotoria expediu a Recomendação nº 2025.0015733, solicitando que a Unitins ajustasse o edital e prorrogasse o prazo para garantir a participação de candidatos quilombolas. O pedido não foi atendido, e as inscrições foram encerradas em 6 de outubro, o que levou o MP a ingressar com ação civil pública.

Na decisão, o juiz reconheceu a probabilidade do direito e o risco de dano irreparável, argumentando que manter o certame sem cotas “inviabiliza a participação igualitária de estudantes quilombolas, gerando dano irreversível ao direito fundamental à educação”.

O promotor de Justiça Paulo Alexandre Rodrigues de Siqueira, autor da ação, destacou que a medida “garante a efetividade de uma política pública essencial à inclusão e à reparação histórica”.

Posição da Unitins

Em resposta anterior ao Jornal Opção Tocantins, a Unitins afirmou não ser contrária à criação de cotas para quilombolas, mas destacou que o edital do Vestibular Unificado 2026/1 foi elaborado de acordo com a Lei Estadual nº 3.458/2019, que regulamenta o sistema de reserva de vagas nas instituições públicas de ensino superior do Tocantins.

A universidade ressaltou ainda que qualquer alteração na norma depende de aprovação do Poder Legislativo e informou que instituiu, em julho deste ano, uma comissão de trabalho para propor aperfeiçoamentos no modelo atual de cotas, reafirmando seu compromisso com as políticas de inclusão social.