O Brasil superou a marca de 30 mil transplantes de órgãos e tecidos em 2024, conforme dados do Ministério da Saúde. Ao todo, foram registrados 30,3 mil procedimentos no ano passado, sendo cerca de 85% realizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), que destinou R$ 1,47 bilhão à área, montante 28% maior que o investido em 2022. No Tocantins, atualmente, o único tipo de transplante feito é o de córnea, iniciado em 2016. De 2019 até junho de 2025, foram realizados 330 procedimentos, segundo a Secretaria de Estado da Saúde (SES-TO).

No Estado, no entanto, ainda não são realizados outros tipos de transplantes de órgãos. Quando surge doador, todo o processo de captação depende de equipes especializadas de outros estados, que se deslocam até o território tocantinense sempre que há identificação de um potencial doador. A logística é coordenada pela Central Nacional de Transplantes (CNT), com apoio da Força Aérea Brasileira (FAB) para o transporte.

Entre os principais entraves para o avanço da política estadual de transplantes está a alta taxa de recusa familiar à doação de órgãos, que chega a 70%. De acordo com a SES, os principais motivos vão desde o desejo de preservar o corpo do ente querido até a falta de manifestação prévia sobre ser doador.

Outro desafio enfrentado é a ausência de laboratório habilitado no estado para realizar o exame de histocompatibilidade (HLA), essencial para identificar receptores compatíveis. Atualmente, as amostras precisam ser enviadas a um laboratório em Aparecida de Goiânia (GO), o que aumenta o tempo e os custos do processo. A liberação do corpo do doador após a captação também pode levar até 48 horas, o que leva muitas famílias a autorizarem apenas a doação de córneas, que tem tramitação mais ágil.

Apesar das limitações, o Tocantins mantém campanhas permanentes de conscientização sobre a importância da doação de órgãos. As ações são intensificadas em setembro, durante o “Setembro Verde”, com palestras, blitz educativas, eventos públicos e fóruns voltados a profissionais da saúde. Iniciativas também são realizadas em municípios do interior, como o Fórum de Doação e Transplante.

Caso 

Um dos casos recentes de doação de órgãos registrados no Tocantins envolveu a professora Delvânia Campelo da Silva, de 50 anos, vítima de feminicídio após ser brutalmente agredida em uma chácara no município de Caseara, em março de 2025. O crime foi cometido namorado dela, ex-vice-prefeito de Caseara, Gilman Rodrigues da Silva, de 47 anos, que está preso na Unidade Penal de Paraíso do Tocantins, indiciado por feminicídio.

Vítima passou 21 dias internada em estado grave | Foto: Divulgação

Ela ficou internada por mais de 20 dias no Hospital Geral de Palmas (HGP), onde teve a morte confirmada. A comoção gerada pelo crime se estendeu até o momento da captação dos órgãos, rins e fígado, que foram destinados a pacientes da lista do Sistema Nacional de Transplantes. Na época, familiares e amigos prestaram homenagens no hospital, formando um corredor com balões durante a despedida.

Familiares e amigos prestaram uma última homenagem a Delvânia na entrada do centro cirúrgico – Foto: Aldenes Lima/Governo do Tocantins

Transplantes no Brasil

Entre as novidades na área de transplantes no país, está a inclusão do transplante de membrana amniótica no SUS, para tratamento de queimaduras, e a autorização de transplantes de intestino delgado e multivisceral, voltados a pacientes com falência intestinal irreversível.

Segundo o balanço, os órgãos mais transplantados no ano passado foram: rins (6.320 transplantes), fígado (2.454), córnea (17.107) e medula óssea (3.743). Apesar do crescimento, a fila de espera ainda soma 78 mil pessoas. Só para rim são mais de 42 mil. Outro desafio apontado pelo Ministério da Saúde é a recusa familiar: apenas 55% das famílias entrevistadas autorizaram a doação dos órgãos. Para enfrentar o problema, será lançado o Programa de Qualidade em Doação para Transplante (Prodot), que vai qualificar e monitorar as equipes responsáveis pelas entrevistas com familiares. A formação será feita em parceria com a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib).

Para acelerar a compatibilização entre doadores e receptores, o ministério vai expandir o uso da prova cruzada virtual, tecnologia que permite, à distância, avaliar a probabilidade de rejeição ao órgão doado. Hoje, o exame é feito apenas em quatro estados (SP, RS, PI e PE), mas a meta é ampliar para todo o país. O governo também anunciou a reconfiguração das macrorregiões de transplantes, com prioridade na distribuição dos órgãos entre estados da mesma região geográfica. A medida busca aumentar o número de transplantes nas regiões Norte e Nordeste.

Outro avanço citado foi o início de um projeto de pesquisa voltado ao xenotransplante, produção de órgãos de suínos geneticamente modificados para uso em humanos. A iniciativa, segundo o ministério, ainda está em fase inicial.

O pacote de medidas também prevê reajustes nos valores pagos pelo SUS em diversas etapas do processo de transplante. Os líquidos de preservação de órgãos, por exemplo, terão aumento de pelo menos 81%. O valor de exames como ecocardiograma (usado para verificar viabilidade de doação de coração) e o HLA (compatibilidade imunológica entre doador e receptor) também será atualizado.