O Tocantins tem demonstrado um crescimento bastante positivo nos últimos anos, sobretudo pelo fato de ter se tornado um “hub” logístico para diversas empresas. Entretanto, o que falta para, de fato, solidificar esse crescimento e colher os frutos da sua posição geográfica privilegiada? Entrevistamos diversos especialistas, em diversas áreas de atuação e sintetizamos um apanhado das principais ideias e projetos que podem ser úteis. Falamos sobre desenvolvimento sustentável, nova matriz econômica, turismo e cultura.

Agronegócio e Indústria

Sem dúvidas, um dos nossos maiores atrativos do Tocantins é o Agronegócio. A Agrotins tem se firmado como a maior feira agrotecnológica da região norte e o volume de negócios é surpreendente a cada ano. Em 2024, por exemplo, foram negociados R$4,2 bilhões. Para o engenheiro, professor e empresário, Alan Barbiero, que também é doutor em sociologia e foi o primeiro reitor da Universidade Federal do Tocantins, o caminho é reforçar o potencial que já temos:

“Para o desenvolvimento maior do estado Tocantins, é importante reforçar aquilo que nós temos de maior potencial. Primeiramente, aquilo que está a olhos vistos, que é o agronegócio ou mesmo agricultura familiar, o carro chefe da economia do Tocantins. Nós temos a produção de grãos em destaque, mas também a produção de carne. Vale ressaltar a produção de carne, mas nós precisamos fortalecer outras cadeias produtivas, como por exemplo, nós estamos produzindo soja, milho e agora nós começamos um processo de industrialização. Nós já temos duas indústrias que estão sendo implantadas no estado Tocantins para produzir etanol de milho, que tem um resíduo que é muito importante para a cadeia alimentar da carne, principalmente a pecuária, a agricultura, a suinocultura, que é pouco desenvolvida aqui no Tocantins. Nós temos também um grande potencial para a piscicultura. Acredito que é importante a gente organizar essas cadeias produtivas, com políticas públicas para desonerar a produção, incentivar, trazer tecnologia”, disse Barbiero.

Monumento à Ciência e Tecnologia, onde será instalado o Parque Tecnológico do Tocantins| Foto: Aldemar Ribeiro/Governo do Tocantins

“O ponto central é essa tecnologia. Nós precisamos ter o nosso parque tecnológico. Precisamos ter um sistema estadual de ciência, tecnologia e inovação robusto no estado do Tocantins. Fortalecendo a relação das universidades com as empresas, com o Sebrae, com o sistema como um todo. Essa organização é fundamental, porque o que a gente percebe é que talvez, por isso, algumas cadeias produtivas não caminharam tanto, porque há uma desarticulação entre os órgãos governamentais, não governamentais e empresariais. Talvez seja essa falta de diálogo que impossibilita uma maior alavancagem dessas cadeias. A gente percebe que a soja e o milho, por força do empresário, do agronegócio, estão crescendo. Já está crescendo de forma bem acelerada. Mas nós precisamos industrializar”, afirma Barbiero.

Já Francisco Viana Cruz, doutor em economia e professor do Instituto Federal do Tocantins, também reforça o aspecto da tecnologia nas cadeias produtivas do agronegócio: “Precisamos de mais investimentos na agricultura de precisão, com a adoção de tecnologias avançadas em equipamentos de maquinário, o uso de biotecnologia, com o investimento em pesquisa e desenvolvimento de sementes que resistam a pragas e doenças, aumentando desta forma a produtividade e a sustentabilidade da produção. Além, é claro, de políticas de incentivos fiscais, ou seja, subsídio para o setor agrícola que venha promover o investimento e a expansão da produção. O apoio de instituições de pesquisa, como a Embrapa, é outro quesito. As ações práticas adotadas no Tocantins para manter a posição no agronegócio são multifacetadas, envolvem investimentos em tecnologia, infraestrutura, sustentabilidade, capacitação, políticas públicas e pesquisa, esses esforços coletivos têm contribuído para um ambiente agrícola mais produtivo, competitivo e sustentável. O que se espera é fortalecer o agronegócio como uma matriz econômica importante do estado ou a mais importante do estado”, pontuou o professor.

Foto: Dornil Sobrinho/Secom Porto Nacional

Para o economista, considerando a dependência que o estado tem das commodities, o desenvolvimento da indústria no Tocantins será um passo importante para deixarmos de apenas exportar matéria-prima para outros estados.  “É importante que se diversifique a economia e reduza essa dependência das commodities, que é preponderante no estado. É fundamental adotar uma série de estratégias que envolvam o fomento da indústria. No comércio, trabalhamos com a melhoria da distribuição e escoamento dos produtos que já industrializamos. A gente já conta com um desenvolvimento de infraestrutura logística no estado, o que precisa é que isso seja ampliado. Precisamos estabelecer zonas industriais e parques tecnológicos. Com infraestrutura adequada, vamos atrair empresas, indústrias de diversos setores. Outro quesito é oferecer incentivos fiscais e subsídios para empresas que se instalem no estado. Promovendo a diversificação industrial, a diversificação econômica, que é importante. Nós não podemos nos prender às commodities. Caso as commodities venham entrar em crise, a gente vai assistir aqui um declínio da economia no estado. Então, para que o Tocantins se estruture e se fortaleça no setor de industrialização, é importante investir na infraestrutura logística, na criação de parques industriais, no fomento à agroindústria e outras indústrias de transformação”.

O ex-reitor da UFT, Alan Barbiero, também voltou a ressaltar a importância do desenvolvimento da logística no estado com a expansão industrial. Ele citou o exemplo de Pedro Afonso, que conta com uma planta da Bunge, que produz etanol a partir da cana e gera energia a partir da combustão dos resíduos. Ele falou sobre o setor logístico do estado.

“Uma outra área de grande potencial no Tocantins que pode ser desenvolvida é a área de logística. Nós temos uma posição estratégica muito importante no Brasil. Estamos bem no centro do Brasil e precisamos, além da ferrovia norte sul, nós temos da BR 153, mas precisamos de outras rodovias, como também nós precisamos de outras ferrovias fazendo leste-oeste, interligando o estado do Tocantins com o Mato Grosso, ligando ao Pará, ao litoral do nordeste. Essas são regiões produtoras e, no Tocantins, precisamos de ter o hub. Para isso é fundamental que o aeroporto de Palmas se torne realmente um aeroporto de cargas.

Foto: Ministério dos Transportes

Logo à frente, complementou: “De algumas atividades inerentes à própria potencialidade que tem no agronegócio como, por exemplo, comércio de máquinas agrícolas, de outros insumos que a gente tem e a produção em outros estados que poderiam vir para cá. Logicamente, se o custo da matéria prima chegar aqui a um bom preço, depende de uma logística bem trabalhada. A gente percebe vários galpões sendo construídos aqui em Palmas, em Gurupi, Araguaína, e Colinas, são empresas que estão fazendo as suas centrais de distribuição no estado do Tocantins. Isso precisa ser visto como política pública também, porque a logística é um importante instrumento de desenvolvimento de um estado”, enfatizou Barbiero.

Turismo

Outro ponto importante, destacado pelos nossos entrevistados foi o turismo. A exploração das belezas naturais do estado, sobretudo pontos turísticos naturais como o Jalapão, Serra do Carmo, Complexo das Serras Gerais, cachoeiras e praias precisam de um investimento mais robusto.

 Allan Barbiero destaque os pontos fortes e fracos do turismo no Tocantins: 

“Outra cadeia produtiva para o estado é o turismo. Temos o Jalapão, que hoje é internacionalmente conhecido, contudo, tem uma infraestrutura muito precária ainda. Um turista que vai no Jalapão, por vezes, não volta uma segunda vez por falta de uma infraestrutura. Você vai na cidade de Mateiros ou na cidade de São Félix, dá vergonha. Infelizmente não há um cuidado de fazer a manutenção da pavimentação asfáltica urbana, não há um embelezamento da cidade, no sentido de incentivar a população, de pintar suas casas, de fazer com que a cidade de fato tenha uma condição de acolher bem um turista. O turista hoje que viaja, é exigente, ele quer chegar num lugar e quer sentir um nível de organização, de capacitação de pessoas, de organização urbana, de respeito também ao mesmo tempo o respeito ao Meio Ambiente. Tudo isso soma na cadeia produtiva do turismo para trazer mais investidores ou mais turistas para além do Jalapão. Nós temos o Cantão que também é uma área muito pouco explorada e começa um turismo de peças de observação de pássaros, como também as Serras Gerais”.  

Cachoeira da Velha no Jalapão| Foto: Eduardo Hanazaki (Flickr)

“Há diversas outras regiões do estado Tocantins, que tem um potencial turístico. A própria cidade de Palmas, que conta com a Serra e com o Lago que a gente poderia pensar. Tem o  caminho de Palmas, que seria um caminho – como tem na Espanha, o Santiago de Compostela – que as pessoas vão para peregrinar aqui na crista da Serra do Carmo onde vão fazer o monumento do Cristo Redentor. Mas nós temos não somente o Morro do Chapéu, mas tem o Limpão, temos o Morro do Segredo, passando ali toda a região das cachoeiras de Taquaruçu, Buritirana. Portanto, temos uma região belíssima que poderia ser construído um caminho para as pessoas poderem vir do mundo inteiro para fazer as suas reflexões existencialistas, religiosos, espirituais. E isso desenvolve a região. Palmas tem um potencial muito grande. Além da Serra, o Lago, com um potencial turístico pesqueiro gigantesco. Ainda é muito pouco explorado. Claro que tudo isso precisa de ter uma concatenação de órgãos, de institutos de pesquisa, as universidades. Para que você possa alinhar a política”. 

Foto: Palmas Para Jesus Cristo

Já o economista Francisco Viana acredita que o turismo ainda é mal explorado no estado. Apesar das belezas naturais o desafio maior é na qualificação das pessoas, principalmente para receberem os turistas: “O estado possui belezas naturais, como o Jalapão, o Cantão e outros mais. O turismo, assim como os outros desafios que estão colocados, devem estar  na melhoria da educação e na qualificação da força de trabalho, que são assim fundamentais para sustentar o crescimento econômico, tudo isso é a longo prazo”.

Segurança Jurídica

Apesar da recente estabilidade no setor político, um dos entraves para o investimento no Tocantins são as disputas e trocas de comando no executivo. Nos últimos 15 anos houveram quatro cassações de mandatos de governadores no Estado. O advogado e especialista em gestão pública, Henrique Araújo, destaca que essas decisões de cassação de mandatos geram insegurança jurídica e podem afastar empresários de investirem no estado. “A segurança jurídica e política, bem como, o bom funcionamento das instituições públicas, são imprescindíveis para o desenvolvimento do estado do Tocantins e para a promoção do bem-estar da população. A lógica é bem simples: o investidor não vai aplicar seu capital num estado em que hoje o governador é determinada pessoa e amanhã já é outro. Nesse sentido, esse cenário duvidoso, de instabilidade, acaba afugentando os investidores que pretendem abrir seu negócio ou expandir seu negócio no nosso estado “, pontuou.

Montagem: Jornal Opção Tocantins

O causídico também disse que é importante melhorar a gestão pública e a sustentabilidade dos serviços públicos: “Acerca do bom funcionamento das instituições públicas, acredito que o estado do Tocantins ainda tem um caminho muito longo a percorrer, principalmente quando se fala de otimização da gestão pública e de sustentabilidade nos processos relativos aos serviços públicos que são prestados para a população. É necessário que práticas arcaicas como o coronelismo, o mandonismo e o clientelismo sejam extintos da administração pública. Tanto no âmbito estadual quanto municipal. Precisamos de mais respeito com a gestão e os serviços públicos. E isso só será possível com a capacitação adequada dos gestores públicos. Eles precisam compreender a relevância do cargo que ocupam e quais as atribuições dele” disse o advogado.

Finalizou na mesma linha de pensamento dizendo que, “a transformação do estado vem aliada à tecnologia e à pesquisa. Tem que ser uma conjunção entre gestão pública, academia e ciência política. Se inteirar do que está sendo discutido no Brasil, no cenário atual e ser capaz de implementar, avaliar e analisar as políticas públicas de forma acertada”.

Desenvolvimento Sustentável

Foto: Fernando Alves/Governo do Tocantins

Sobre o desenvolvimento sustentável é preciso observar as diversas ações realizadas no estado. Tivemos desde crédito de carbono até um acordo interfederativo de combate a queimadas. Sobre esse assunto, conversamos com o doutor em Ciências do Ambiente e professor da Universidade Estadual do Tocantins (UNITINS), Wolfgang Teske, que destacou alguns pontos importantes que precisam ser melhorados:

“As últimas estatísticas nacionais mostram que o desmatamento na Amazônia está diminuindo, mas no Cerrado está aumentando de forma agressiva. Isso é crucial de observarmos, pois muitos acham que desenvolvimento no Tocantins significa desmatar, criando leis que amenizem os impactos. Precisamos mudar essa mentalidade, especialmente ao observar o impacto negativo da expansão agrícola em regiões como o Rio Grande do Sul” disse o professor Teske.

“A falta de cuidado com o meio ambiente é uma realidade no Tocantins. Vendem a ideia de que precisamos investir na expansão agrícola, mas como isso será feito? Não podemos continuar agredindo o Cerrado dessa forma. Devemos investir em projetos de desenvolvimento sustentável voltados para a agricultura. Isso evitará que enfrentemos as consequências da agressão ao meio ambiente, como já aconteceu em tantos locais no mundo. Além disso, precisamos investir nos pequenos agricultores. Hoje, vemos muitos investimentos de grandes empresas e multinacionais para a expansão agrícola, mas onde está o apoio para os pequenos agricultores e a agricultura familiar? Esse apoio deve ser real, não apenas propaganda. Investir na agricultura familiar é crucial para a produção de alimentos no país. Isso inclui fruticultura, apicultura, piscicultura e outras áreas. Investir maciçamente nessas áreas será um grande potencial para o Tocantins”, sugeriu o professor universitário.

Outra área que deve ter um plano bem estruturado é o turismo. O Tocantins tem um enorme potencial turístico, e precisamos explorar isso de forma sustentável. O turismo gera muitos recursos para o estado, mas é necessário – paralelamente – cuidar do meio ambiente. É antagônico investir no turismo se o que vemos no Tocantins são desmatamento e queimadas.

O professor Teske alertou para o risco de queimadas ilegais. “A prevenção de queimadas é outra questão importante. Em algumas áreas, as pessoas acham que colocar fogo no Cerrado é bom, mas é extremamente prejudicial. Precisamos investir na prevenção das queimadas de forma maciça. Para elevar o Tocantins a um novo patamar, também precisamos levar a sério a questão da educação. Desde a educação infantil até o ensino fundamental e médio, precisamos desenvolver uma consciência crítica nas crianças. Isso inclui uma consciência política e ambiental para que cresçam com uma visão diferente. Assim, teremos cidadãos mais conscientes e propositivos, capazes de levar o Tocantins a um novo nível”, enfatizou.