A Justiça de Goiás está suspendendo os benefícios de isenção de imposto de renda concedidos a 644 pessoas que alegaram falsamente terem sido contaminadas pelo césio-137. Entre os beneficiários estão militares do Tocantins e Goiás, que teriam forjado documentos médicos para obter as isenções. A Procuradoria Geral do Estado de Goiás (PGE) revelou que os militares, juntamente com advogados envolvidos, atuaram intencionalmente ao utilizar laudos falsificados para simular doenças graves decorrentes da contaminação radioativa. Essas doenças, que dariam direito à isenção de IR, foram apresentadas em processos judiciais baseados em documentos falsos, visando obter restituições retroativas.

A operação “Fraude Radioativa”, deflagrada pela Polícia Civil de Goiás no final de setembro de 2024, desmantelou o  esquema de fraudes que pode ter causado um prejuízo de mais de R$ 20 milhões aos cofres públicos. A operação investiga o envolvimento de advogados e militares que, utilizando laudos médicos falsificados, pleitearam e conseguiram decisões judiciais para a isenção de imposto de renda, alegando terem sido contaminados durante o acidente com o césio-137 em Goiânia, ocorrido em 1987.

O esquema funcionava com a captação de militares, principalmente coronéis aposentados, por intermediários como o subtenente Ronaldo Santana Cunha. Esses militares eram orientados a entrar com processos judiciais pedindo isenção de IR, com a justificativa de terem sido contaminados pelo césio-137 e, como consequência, sofrido graves enfermidades. As advogadas Ana Laura Pereira Marques e Gabriela Nunes Silva, que lideravam o esquema, eram responsáveis por montar os processos judiciais, utilizando laudos e exames médicos falsificados para comprovar as supostas doenças. Entre os exames apresentados estavam testes que, segundo os advogados, haviam sido realizados em laboratórios nos Estados Unidos, pois, em tese, não haveria laboratórios no Brasil capazes de detectar a contaminação pelo césio-137.

No entanto, as investigações mostraram que os exames não eram apenas falsos, como também os médicos supostamente envolvidos negaram qualquer participação na emissão dos laudos. A fraude foi amplamente documentada, e os beneficiários, incluindo os coronéis da reserva do Tocantins, como Admivair Silva Borges, ex-comandante-geral do Corpo de Bombeiros, e José Tavares de Oliveira, ex-comandante-geral da PM, José Anísio Pereira Braga, ex-corregedor-geral da PM, e Edivan Ribeiro de Souza, ex-comandante da 1ª Companhia Independente da PM e ex-corregedor-geral do Detran, são suspeitos de terem recebido valores indevidos pelo Instituto de Gestão Previdenciária do Estado do Tocantins (Igeprev)

A PGE declarou que os envolvidos agiram com dolo, ou seja, tinham plena consciência de que estavam participando de um esquema fraudulento para obter benefícios fiscais. Segundo o relatório da PGE, as ações foram ajuizadas a partir de 2024 e ainda não transitaram em julgado, o que significa que as decisões podem ser revertidas. A fraude foi facilitada pelo uso de liminares que garantiam a isenção enquanto os processos estavam em andamento. Em alguns casos, as decisões judiciais foram baseadas apenas em laudos falsificados apresentados pelos advogados envolvidos.

O impacto financeiro do esquema é significativo. De acordo com a PGE, o prejuízo causado ao estado de Goiás pode ultrapassar R$ 20 milhões, e os 644 beneficiários já identificados incluem tanto militares do Tocantins quanto de Goiás. As advogadas Ana Laura Pereira Marques, que está em prisão domiciliar, e Gabriela Nunes Silva, que foi liberada e responde em liberdade, são apontadas como as principais responsáveis pela coordenação da fraude. Além delas, outros advogados estão sob investigação, e a Polícia Civil continua buscando mais envolvidos no esquema.

Além dos processos em andamento, a investigação identificou que alguns militares já haviam sido beneficiados com isenções anteriores, aumentando o valor total desviado. Apesar das suspeitas, alguns dos militares investigados, como o procurador Carlos Alberto Fonseca, alegaram desconhecimento sobre a fraude, atribuindo a responsabilidade às advogadas. No entanto, a PGE refutou as alegações, apontando provas documentais que indicam a participação direta dos beneficiários.

A Polícia Civil de Goiás, junto com a PGE e o Ministério Público, seguem investigando o caso. A Polícia Militar do Tocantins afirmou no começo do mês que ainda não foi oficialmente notificada sobre o caso, mas acompanha o desdobramento das investigações. O Igeprev não se posicionou sobre o caso. 

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