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Coalizão Vozes do Tocantins reúne histórico controverso e pede diálogo e investimento na proteção ao maior bioma do Estado

A novidade neste inicio de ano é a inclusão da coleta de vidros já disponível em 25 dos 39 ecopontos

Finalmente a Ilha do Bananal pode ser aberta à visitação. Ao menos para um tipo de público: o turista, especialmente aquele interessado em diversidade e disposto a pagar o preço da aventura. Pelo menos é o que tem sido propalado pelo governo do Tocantins, por meio da Secretaria de Turismo em parceira com a Secretaria dos Povos Originários e Tradicionais (Sepot), seguindo as diretrizes do governo federal, envolvendo os ministérios do Turismo e do Povos Indígenas e a Funai.
A Ilha do Bananal é um santuário da biodiversidade encravado no coração do Brasil, no Estado do Tocantins, divisa com Goiás e Mato Grosso. É conceituado como um Écotono triplo e fica na região de transição entre os biomas do Cerrado, da Amazônia e do Pantanal. O local tem um valor inestimável para o desenvolvimento sustentável do país. Um território de mais 20 mil quilômetros quadrados, dividido entre duas unidades, o Parque Nacional do Araguaia e a Terra Indígena Parque do Araguaia, que se mantém fechado, não necessariamente preservado, como se pressupõe.
Quando se fala em Ilha do Bananal, o imaginário coletivo remete ao paraíso ecológico, mas é preciso lembrar que a Ilha cada vez mais tem se tornando um território em permanente disputa, uma ilha dos conflitos, que abriga uma série de atividades predatórias, como criação de gado, pesca, biopirataria, e até exploração turística, todas ilegais. Para se ter uma ideia a Ilha soma mais 140 posseiros e pelo menos 100 mil cabeças de gado, em regime de refrigério. Segundo dados do Ministério Público Federal (MPF) que tem apertado o cerco para reduzir os impactos dessa atividade, sem contudo, conseguir grandes avanços.
Se dentro da Ilha, um território protegido por lei federal, vigiado permanentemente por órgãos de fiscalização, as atividades ilegais causam enormes estragos, imaginem no entorno da ilha, onde em nome da produção tudo é permitido. A região é explorada por grandes projetos de irrigação para a produção de arroz, soja, melancia, dentre outras, em larga escala. A exploração intensa e incessante dos recursos hídricos, com barragens dos rios, está transformando a grande planície alagada em deserto seco, ameando o próprio conceito de Ilha, já que os rios que a formam estão secando.
A abertura para visitação, uma promessa antiga que se perdeu no tempo por falta de urgência com as questões ambientais, é vista sob duas perspectivas bem distintas: pode expor a realidade da Ilha do Bananal com as velhas práticas de exploração predatória inaceitáveis, contribuindo para mudanças necessárias, ou pode ajudar a acelerar este processo de destruição de forma irreversível.
A Secretaria de Turismo tem direcionado para a Ilha, eventos, considerados turísticos, como forma de testar a sua atratividade e criar condições básicas para o desenvolvimento do turismo. A pasta já realizou campeonato de pesca esportiva e conseguiu incluir a região do roteiro do Rally dos Sertões, que tem o deserto do Jalapão como um dos trechos mais desafiadores e emocionantes do circuito. Segundo o secretário Hercy Filho, as respostas são bastante favoráveis. O que indica caminho aberto para prosseguir no intento de abrir a Ilha aos turistas.
O governo tem pressa e trabalha com a perspectiva de iniciar um projeto piloto na Aldeia Horotory-Hawa, do povo Javaé, com entendimentos bem adiantados no que diz respeito ao ordenamento da atividade, e a partir daí ampliar a oferta para outras aldeias. Os indígenas, inclusive, estão passando por cursos de capacitação para receber visitantes.
O etnoturismo, variação do ecoturismo, ganhou força com a criação da Sepot em 2023, que apoia a iniciativa e que tem a interlocução junto aos povos indígenas. Os indígenas não são os maiores entusiastas dessa ideia, mas ao menos estão sendo colocados como protagonistas de um negócio assentado na ideia de valorização da cultura indígena.
Essa não é a primeira vez que o governo do Tocantins tenta transformar a Ilha do Bananal em uma província turística. Este desejo vem sendo alimentado desde a década de 50, quando o estão presidente Juscelino Kubistchek criou o Parque Nacional e chegou a iniciar a construção de um grande hotel e uma pista de poso para receber convidados, sobretudo do exterior. O projeto ficou pelo meio do caminho, mas a ideia nunca morreu de todo.
Em 1989, no período de implantação do Tocantins, o então governador Siqueira Campos, no afã de aumentar o número de municípios do novo Estado que foi criado com apenas 62 municípios, lançou o projeto de criação do município da Ilha do Bananal, de vocação turística. Organizou um “belo” projeto e convocou as lideranças indígenas para mostrar o que considerava uma ótima possibilidade de alavancar o desenvolvimento daquele território.
De forma curta e direta os indígenas recusaram o “belo” projeto por avaliar que município não trazia benefícios para os povos indígenas e oferecia sérios riscos à autonomia do seu território. Inconformado com a posição dos indígenas, o governador ameaçou transformar a Ilha em unidade de pesquisa e entregar o território às universidades. Diplomaticamente os indígenas ensinaram ao governador que ele não tinha poder para definir a destinação da Ilha, um território dos povos originários, sob a responsabilidade do governo federal. Siqueira teve que engolir seco, o “pito” e desistiu no município da Ilha.
A Ilha do Bananal fechada à visitação como é hoje custa muito caro e não está protegida, como se pressupõe. Pelo contrário, está sendo explorada por uma série de eventos que concorrem para ampliar o nível de gradação. Os defensores da abertura da Ilha do Bananal à visitação entendem que os olhos dos visitantes podem ajudar a denunciar as agressões ambientais, tendo em vista que ninguém se sente bem em pagar para visitar um “paraíso ecológico”, para ver agressões à natureza.
Ademais, os recursos arrecadados com a atividades de visitação pode efetivamente financiar ações e preservação. Desse ponto de vista a etnoturismo será bem-vindo. Representa uma esperança, neste mar de ameaças e incertezas. Pode representar uma inflexão na trajetória dessa tragédia ambiental anunciada.

Em Palmas, mais do que nunca, necessitamos de um gestor que encare a capital diante da crise climática e que tenha uma preocupação genuína com a justiça ambiental. O conforto térmico dos menos favorecidos não pode mais ser ignorado; é uma necessidade óbvia. É clichê: o óbvio precisa ser dito e reforçado.
Ao longo dos meus dez anos aqui, nunca vi um gestor demonstrar real preocupação com os alagamentos frequentes nas principais avenidas da capital. Durante as eleições, surgem promessas vazias, e a falta de um escoamento eficiente persiste, resultando em tragédias evitáveis.
O projeto Muda Clima, lançado prela Prefeitura de Palmas em 2019, na gestão de Cinthia Ribeiro, era destinado a plantar mais de trinta mil árvores na capital. O programa parece ter entregue resultados abaixo do esperado. E ele não foi o primeiro do tipo. Em 2017, no governo de Carlos Amastha, também havia o projeto Pé de Sombra que também prometia a mesma coisa.
O plantio insuficiente de árvores, a ausência de áreas verdes em ruas e rotatórias, aliados à falta de preocupação com o ecossistema local em parte pela própria população, contribuem para a inexistência de conforto térmico.
A situação se agrava para os mais vulneráveis, que não têm acesso a carros ou residências climatizadas. O transporte público é deficiente, e a injustiça ambiental atinge, de maneira desproporcional, mulheres e homens negros, periféricos e moradores das regiões mais distantes do plano diretor.
É fundamental que o próximo gestor leve em consideração não apenas o conforto térmico, mas também a busca por soluções eficazes para a crise climática em Palmas e em todo o Tocantins, marcado pelo desmatamento e inúmeras queimadas. Os eleitores devem analisar com cuidado e votar naquele que demonstra comprometimento real com a preservação do meio ambiente.

*Silvana Bastos
No alto dos meus 50 anos, pergunto-me a quem interessa tamanho desmatamento do Cerrado? Nesse tempo ínfimo de vida, meus olhos assistiram à destruição de cerca de 900 mil km2 de Cerrado, metade da sua área original de vegetação nativa. Um piscar de olhos, mesmo diante da história mais recente do Cerrado, com cerca de 12 mil anos, em que as espécies do Cerrado levaram para se adaptarem à mudança para um clima mais seco com períodos alternados de estiagem e chuvas, característico do bioma, até chegar nesse ambiente tão generoso, que armazena e distribui águas para rios que alimentam a Amazônia, Pantanal, Caatinga e Mata Atlântica, ou seja, conecta e é chave para o funcionamento de vários sistemas hídricos do Brasil, para citar apenas um dos inúmeros bens e serviços ecossistêmicos do Cerrado. Sim, estou falando da Água, fundamental à Vida, mata a sede e também move a economia do país: energia, produção de alimentos, turismo, etc. tudo dependente da água, a mesma que só é “produzida” em quantidade e qualidade quando há ambientes naturais conservados, protegidos e bem manejados.
Então, parece óbvio que zerar o desmatamento e garantir a conservação dos 50% restantes de Cerrado no Brasil interessa à maioria esmagadora dos brasileiros. Correto? Errado! Há muitas evidências para essa resposta: em 2023 amargamos recordes nas taxas de desmatamento no Cerrado e ainda, a composição das assembleias legislativas estaduais e do Congresso Nacional conta com raríssimos parlamentares que atuam para uma legislação mais eficaz de proteção do Cerrado – só a PEC 504/10, Proposta de Emenda à Constituição que elevam o Cerrado e a Caatinga à mesma categoria da Mata Atlântica, Pantanal e Amazônia enquanto patrimônios nacionais, tramita há mais de 10 anos sem avanço.
Diante desse triste quadro nacional, aterrissamos no Tocantins e a minha pergunta continua: a quem interessa o desmatamento? O Tocantins é totalmente imerso na região geográfica da Amazônia Legal, mas é o bioma Cerrado que predomina em 87% do seu território. Por abrigar também a Amazônia e suas áreas de transição é um detentor de megabiodiversidade e boa parte das importantes bacias hidrográficas do Tocantins e Araguaia. Outra riqueza incomensurável é a diversidade de povos e comunidades tradicionais: são indígenas, quilombolas, pescadores artesanais, agroextrativistas e tantos outros que são atacados e precisam lutar cotidianamente pelo reconhecimento e valorização dos seus modos de vida sustentáveis e do direito fundamental, previsto na Constituição Federal, à regularização fundiária e proteção dos territórios tradicionalmente ocupados.
Os dados só confirmam o que os olhos veem ao rodarmos pelas estradas do estado - o Tocantins vem tratando muito mal seu território: está entre os primeiros na lista dos campeões de desmatamento do Cerrado em 2023. Somente no mês de maio, quando inicia o período da seca, o estado registrou 32,4 mil hectares desmatados, segundo o SAD Cerrado (Sistema de Alerta do Desmatamento), 52% a mais que em maio de 2022.
A destruição do Cerrado tem como principal finalidade, a conversão de áreas conservadas para o agronegócio, em especial para a produção de soja e milho no Tocantins. Mesmo focando nas áreas legais, ou seja, em que a propriedade é regularizada e que cumpre a legislação ambiental poderíamos refletir se essa estratégia econômica realmente atende aos interesses coletivos dos tocantinenses, já que estudos, a exemplo do relatório “Segure a Linha” do Greenpeace, demonstram que o agronegócio deixa no local um rastro de passivos ambientais e sociais incomensuráveis, ao mesmo tempo que promove a fuga da riqueza gerada para outros estados e países, visto que a maior parte da produção não alimenta a população do estado, é voltada à exportação, agrega pouco à indústria local, grande parte dos lucros vão para contas bancárias de pessoas que não moram no estado e de empresas que não movimentam a economia local.
Mas, quero finalizar essa reflexão, com apenas três exemplos, de dezenas que poderia elencar, sobre fatos que vem favorecendo o desmatamento no estado e que nos dão pistas sobre a pergunta: a quem interessa o desmatamento no estado? A lei estadual de licenciamento ambiental (Lei 3.804/2021) vinha respaldando processos de licenças e liberação de empreendimentos que degradam o meio ambiente, de forma flexível e em desacordo com a Constituição, mas somente em 2023, teve 22 artigos julgados como inconstitucionais pelo Tribunal de Justiça.
Outro agravante que potencializa e favorece o desmatamento ilegal, caça e outros crimes ambientais é a imobilização do Naturatins, órgão estadual responsável pela fiscalização, controle ambiental e pela gestão e proteção das unidades de conservação estaduais. É obvio que a ausência ou baixa presença do estado estimula a atuação dos criminosos. Ou exemplo que afetou diretamente a proteção do Cerrado ocorreu em 2022 quando o poder judiciário do Tocantins suspendeu os efeitos do ato que constituiu o Conselho Deliberativo da Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra do Lajeado, impedindo o colegiado de se reunir, acatando uma ação movida pela Associação do Produtores das Serras do Lajeado e Taquarussu, visando impedir que o colegiado aprovasse o novo Plano de Manejo da UC que propunha uma transição gradual da agricultura em grande escala para a agroecologia.
Um terceiro vetor de desmatamento, que também gera mortes, sofrimentos e conflitos, é a baixa execução dos governos estadual e federal em cumprir suas metas de gestão e obrigação legal em relação à regularização fundiária e destinação de terras públicas e finalidades prioritárias em nossa Constituição – reforma agrária e territórios tradicionalmente ocupados. Desse modo, a regularização caminha ao passo de tartaruga manca para os casos dos territórios tradicionais e assentamentos rurais, enquanto grandes invasores ilegais – os grileiros - desmatam e consolidam áreas voltadas à agropecuária de larga escala ou à especulação imobiliária, sem a fiscalização do Estado ou sem a transparência sobre a legalidade dessa destinação, a exemplo das dúvidas geradas pela convalidação de registros imobiliários, previstos na Lei 3.896 de 2022 do estado do Tocantins.
Diante desse panorama, continuo com a pergunta e a direciono a você, leitor. Mas, tenho certeza que o desmatamento não é de interesse da maioria dos tocantinenses e dos brasileiros, que prezam pela vida e esperam que seus filhos e netos tenham as condições ambientais para crescerem com saúde e possam desfrutar as águas lindas e puras ofertadas pelo Cerrado.
*Agrônoma, mestre em sustentabilidade de territórios tradicionais, assessora técnica do Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN e membro da Coalizão Vozes do Tocantins por Justiça Climática.

Número equivale a 5.159.811 hectares; levantamento é do projeto de Mapeamento Anual do Uso e Cobertura da Terra no Brasil, o MapBiomas